Carnaval de BH: o risco da ‘baianização’

Trio elétrico utilizado pelo Baianas Ozadas na Afonso Pena (Yuran Khan/Bhaz)

Por Marcelo Freitas*

Ao final de mais uma maratona do Carnaval de BH, restam algumas certezas e também algumas dúvidas. A certeza – e sobre essa não há dúvidas – é que o Carnaval de Belo Horizonte, longe de ser uma brincadeira de amigos, como nos primeiros anos da retomada, transformou-se em um evento de grande porte, colocando-se hoje, segundo estatísticas divulgadas pouco antes do início da folia, como o terceiro do país.

O Carnaval de Belo Horizonte prima pela diversidade. Há microblocos, blocos, blocões e megablocos. Na terça de manhã, na avenida Getúlio Vargas, região central da cidade, passou por mim um animado microbloco. Era uma charanga que tocava marchinhas dos carnavais passados acompanha por não muitos seguidores. Poucos minutos depois, estava eu na Floresta, acompanhando a saída do “Juventude Bronzeada”. Era o que, na minha cabeça, podia ser definido como um bloco. Igual ao “Juventude Bronzeada”, em termos de tamanho, era o “Me beija que eu sou pagodeiro”, que saiu no Gutierrez no sábado anterior ao do início formal do Carnaval. Isso sem contar um tanto de outros, dezenas deles, que se distribuíram pela cidade afora, na área central e também nos bairros.

Os blocões, como a própria palavra já diz, são maiores. Desfilaram na área central de Belo Horizonte, arrastando multidões. Os blocões é que dão sentido às imagens aéreas que registram as multidões que os seguem, como ocorreu com o “Então, brilha!” e o “Quando come se lambuza”. O “Brilha”, como é mais conhecido, levou cerca de 150 mil pessoas à Praça da Estação no sábado pela manhã; no mesmo dia, à tarde, o “Quando come se lambuza” ocupou as duas pistas da avenida Afonso Pena, da Praça Tiradentes, de onde saiu, até a Praça Sete.

Porém, além dos blocões, Belo Horizonte já tem um megabloco, o “Baianas Ozadas”, que desfilou na segunda pela manhã, atraindo para a região central de Belo Horizonte uma multidão estimada pela imprensa em cerca de 500 mil pessoas. Apenas para ilustrar o tamanho do “Baianas Ozadas”, apenas quatro municípios mineiros têm população superior a 500 mil habitantes: Belo Horizonte, Uberlândia, Contagem e Juiz de Fora. Percebi pelo noticiário, tanto da TV quanto dos jornais impressos, um certo ufanismo em relação ao tamanho do bloco. Na mídia, o destaque foi para as imagens aéreas e para o número de foliões.

Mas o “Baianas Ozadas” cometeu um pecado. O som do trio elétrico, excessivamente alto, tornava praticamente inaudível a belíssima percussão do bloco, que vinha logo atrás do caminhão. Seu som era ouvido quase que apenas pelos próprios instrumentistas ou por quem estava só a poucos metros da percussão. Não quero desmerecer os instrumentistas do conjunto que tocava em cima do caminhão, mas o som que deles é o mesmo das músicas que se ouve nas emissoras de rádio ou se baixa na internet a qualquer instante. O da percussão, que ficou no asfalto, não. Sua sonoridade é única, concebida que é para ser executada naquelas poucas horas de um único dia de Carnaval. Normalmente, é o resultado de muitas e muitas horas de ensaio nos meses que antecedem o desfile. Por isso, o trabalho destes instrumentistas deveria ser muito mais valorizado.

É compreensível que os megablocos precisem de um equipamento de som potente. Mas, não seria o caso de se amplificar apenas o som da percussão, inserindo-se sobre ele a voz do vocalista? Pode-se criticar o Carnaval das escolas de samba do Rio de Janeiro por uma série de questões, como a falta de criatividade dos sambas de enredo ou a escolha do tema do desfile em função do patrocinador. Mas, em um ponto, ninguém pode questioná-las. Nelas, a bateria, com toda sua pujança, continua sendo o coração da escola. O caminhão de som é só um coadjuvante, necessário para que apenas a voz do vocalista seja ouvida e o samba não atravesse na avenida.

O problema é que o Carnaval de BH explodiu em um prazo muito curto. De um ano para outro, blocos de bairro – como o “Quem come se lambuza” – transformaram-se em blocões. E o que já era um blocão ano passado – o “Baianas Ozadas” – esse ano, passou a ser um megabloco. Tudo indica que ano que vem essa sequência se repetirá com outro blocos.

Meu receio é que o resultado desse final desse processo seja a “baianização” do Carnaval de Belo Horizonte, que, com isso, perderia aquilo que lhe era mais peculiar: a espontaneidade de centenas de pequenos blocos e suas esfuziantes baterias. Espero que isso não aconteça.


* Marcelo Freitas é jornalista e mestre em Ciências Sociais pela PUC Minas

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