Regras de convivência política estão quebradas no Brasil, diz cientista político

Conflito no Senado: regras de convivência quebradas/Alessandro Dantas – Fotos Públicas

O cientista político Leonardo Avritzer, professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), defende a renúncia do presidente Michel Temer como a saída menos traumática para a crise política. As outras das soluções – cassação  da chapa pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e impeachment aprovado pelo Congresso – seriam extremamente demoradas e danosas ao país. Avritzer defende que seja qual for o caminho, ele deve se embasado por um acordo que resulte na implementação de algumas medidas que ele considera básicas, como a redução do número de partidos e definição de regras para a atuação do poder judiciário e da  mídia. “No Brasil, as regras estão completamente quebradas com relação à organização política, ao estado de direito e à relação entre as instituições”, afirma Leonardo Avritzer, que é também é autor do livro “Impasses da Democracia no Brasil”, lançado em 2016.

Quais são os possíveis cenários que o senhor enxerga como solução para a atual crise?

O momento é um dos mais graves na história do país, seja pelo fato de que o presidente atual já está substituindo um outro que foi afastado, mas é grave também pela gravidade dos crimes  que ele, e outros também, cometeram e nos quais acabaram envolvendo-se. Os cenários, nesse sentido, são trágicos para o país. Das alternativas que se coloca, a primeira, a da renúncia, é a menos provável, como o próprio presidente já disse, embora esse cenário possa mudar rapidamente por um ato pessoal do presidente. A segunda alternativa é a do impeachment. Nesse caso, teremos um processo relativamente longo e penoso para o país. O terceiro cenário seria o da cassação da chapa, que pode ser aprovada na reunião do Tribunal Superior Eleitoral prevista para o próximo dia 6 de junho. Porém, nenhum desses cenários é expresso. No Tribunal Superior Eleitoral, cabe recurso ao Supremo Tribunal Federal e o Temer, se for cassado, provavelmente irá solicitar diligências. Portanto, dos três cenários, o menos complicado para o país é o da renúncia, que é um ato pessoal do presidente.

A eleição indireta seria uma alternativa ruim para o país? Ou é possível pensar nela em um cenário de busca de consenso?

Pessoalmente, acho que a eleição indireta não é uma boa alternativa. Acho que a Constituição é um referencial que temos a seguir. Para isso, é preciso observar o que diz a Constituição. Ela diz que se o cargo de presidente ficar vago na segunda metade do mandato, o presidente da Câmara assume e convoca eleições indiretas. Assim, em uma eventual saída de Temer, assume o presidente da Câmara, a quem caberia convocar eleições indiretas. Acho as eleições diretas uma solução melhor, mas, para isso, ela teria que ser precedida de um amplo acordo nacional. Nesse sentido, o que há é uma emenda do deputado Miro Teixeira aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça e que, para ser submetida duas vezes ao plenário da Câmara e duas vezes ao plenário do Senado, é preciso muita pressão e muito acordo. Ainda que o processo não seja tranquilo, ainda que nosso sistema político esteja destroçado, é a melhor saída.

Quais seriam as bases de um acordo para que a eleição de um novo presidente pelo pleito direto não resulte em uma nova crise.

A primeira condição é um acordo para o financiamento público da campanha. Outro coisa é que não podemos entrar em uma eleição direta com 36 partidos disputando os votos. É uma insanidade absoluta. Precisamos, também, definir alguns limites para a atuação do Judiciário. Michel Temer e alguns órgãos de imprensa de São Paulo falam que houve uma armadilha contra ele. Houve sim, mas houve também alguns crimes que foram cometidos por ele. Mas, evidentemente, o fato é que a ideia do procurador armar uma armadilha para o presidente não pode deixar o país confortável. Por isso, é preciso pensar em limites para o judiciário.  Mesmo que a eleição fique para o ano que vem, vamos precisar de um acordo. A questão é saber como vai estar a situação do país  de agora até o ano que vem.

Vivemos hoje no Brasil um cenário de extrema polarização entre direta e esquerda. Em cenários extremamente polarizados, como o do Brasil de hoje, em uma eleição direta não corremos o risco de apenas postergarmos a crise?

Por si só, uma disputa entre esquerda e direita não seria preocupante se as coisas não estivessem ocorrendo da forma como estão. Cito o exemplo da recente eleição presidencial francesa, que se deu em um ambiente de extrema polarização, mas em torno de regras de disputa muito claras. Dois dias antes, nós tivemos um vazamento de informações que envolveu o candidato Emmanuel Macron, mas nenhum jornal publicou as informações. Isso mostra que, se existem regras claras, como sobre direito de defesa, sobre o que a mídia publica, a polarização deixa de ser um problema. No Brasil, acho que precisamos restaurar algumas regras de convivência política que ficaram meio esquecidas, para que possamos entrar em um processo eleitoral de forma menos traumática.

Nas eleições de 2014 essas regras foram quebradas?

Claro. O que o Temer reclama foi feito com a Dilma, que também caiu em armadilhas, da mesma forma que o senador Delcídio do Amaral. No Brasil, as regras estão completamente quebradas com relação à organização política, ao estado de direito e à relação entre as instituições.

 

Marcelo

Marcelo Freitas é redador-chefe do Bhaz

SIGA O BHAZ NO INSTAGRAM!

O BHAZ está com uma conta nova no Instagram.

Vem seguir a gente e saber tudo o que rola em BH!