Propostas para mulheres só são detalhadas em um dos oito programas que disputam o governo de Minas

Dirlene Marques (Marcela Káritas/Campanha Libertas)

Por Lara Alves

Os últimos anos têm sido marcados pela luta das mulheres para a garantia de direitos e da própria sobrevivência. Em 2017, segundo a Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp) de Minas Gerais, 433 mulheres foram vítimas de feminicídio e mais de 145 mil ocorrências de violência doméstica foram registradas. No campo trabalhista, as mineiras receberam quase R$ 500 a menos que os homens, de acordo com levantamento feito pelo IBGE. Em âmbito nacional, uma pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV) revelou que 48% das mães deixam seus empregos nos primeiros 12 meses após ter filhos, motivadas pela falta de auxílio, carência de creches e ausência de espaços para amamentação. São perceptíveis as inúmeras dificuldades e falta de apoio governamental que as mulheres precisam enfrentar para se firmar na sociedade e transpor as barreiras do machismo estrutural.

Neste ano eleitoral, muitos candidatos têm voltado suas estratégias de campanha para a população feminina, uma vez que as mulheres representam mais da metade dos eleitores e grande parte dos ainda indecisos sobre o voto. No entanto, apesar dos discursos pelas mulheres, nem todos os postulantes ao governo de Minas de fato dão espaço a elas em seus projetos de governo. A Campanha Libertas analisou os planos e propostas governamentais de oito dos nove candidatos ao cargo, já que Alexandre Flach (PCO) não disponibilizou o documento ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MG) – ele teve a candidatura indeferida pela Justiça.

Veja o resultado:

1 candidata traz propostas específicas para as mulheres: Dirlene Marques (PSOL).

4 candidatos destacam a importância de pensar propostas para as mulheres, mas não especificam quais as maiores urgências ou como colocá-las em prática: Adalclever Lopes (MDB), Antonio Anastasia (PSDB), Fernando Pimentel (PT) e Jordano Metalúrgico (PSTU).

3 candidatos não apresentam nenhuma proposta para quaisquer questões relacionadas às mulheres: Claudiney Dulim (Avante); João Batista Mares Guia (Rede) e Romeu Zema (Novo).

Confira a análise de cada plano:

Adalclever Lopes (MDB) (Veja aqui o programa)
O substituto do ex-prefeito de Belo Horizonte Marcio Lacerda na corrida pela cadeira refere-se às pautas das mulheres em apenas um trecho de seu programa. No eixo “Assistência e Inclusão Social”, o candidato promete que, se eleito for, irá promover “programas e ações para combater a violência doméstica, com a implementação de programas para proteção e apoio às vítimas”.

Antonio Anastasia (PSDB) (Veja aqui o programa)
Em seu “Plano Minas Gerais/ Resgatar a dignidade dos mineiros”, o candidato do PSDB não se aprofunda em discussões referentes à mulher. Anastasia destaca que é preciso desenvolver ações dentro da estrutura do governo que priorizem a integridade física das mulheres, seu acesso ao mercado de trabalho, assistência pré e pós-natal e, conforme o documento, “assistência ao seu papel dentro da família”. Ainda que ressalte tais questões, o candidato não mostra caminhos para colocar as propostas em prática.

Claudiney Dulim (Avante) (Veja aqui o programa)
O candidato do Avante, partido estreante na disputa, não apresenta nenhuma medida específica que possa auxiliar as mulheres em qualquer instância em seu projeto de governo.

Dirlene Marques (PSOL) (Veja aqui o programa)
Única mulher na disputa, Dirlene Marques dedica boa parte de seu plano de governo para questões referentes a maiores segurança e qualidade de vida para a população feminina. Leia abaixo mais detalhes das propostas de Dirlene.

Fernando Pimentel (PT) (Veja aqui o programa)
Candidato à reeleição, o atual governador Fernando Pimentel lista a garantia de direitos e o compromisso com a equidade como princípios norteadores de sua administração. Apesar de falar sobre a importância do combate à violência contra as mulheres, Pimentel não aponta formas de solucionar o problema.

João Batista Mares Guia (Rede) (Veja aqui o programa)
Candidato do partido da presidenciável Marina Silva, que tem traçado discursos voltados para as mulheres, Mares Guia não menciona políticas públicas para este grupo em seu plano de governo.

Jordano Metalúrgico (PSTU) (Veja aqui o programa)
As principais diretrizes indicadas pelo PSTU no plano do candidato dizem respeito à necessidade de instaurar uma revolução socialista. Apenas um dos trechos do documento é dedicado às mulheres. Há a exibição dos dados de violência contra a mulher em Minas Gerais, mas não são elencadas estratégias de combate.

Romeu Zema (Novo) (Veja aqui o programa)
Representante do Partido Novo na corrida pelo governo do Estado, Romeu Zema não direciona promessas para populações femininas.

Única candidata é quem dedica atenção extensa às mulheres

Em uma chapa composta apenas por mulheres não seria surpresa que a população feminina fosse contemplada com mais ênfase no plano de governo. Na primeira vez em que disputa o cargo de governadora de Minas, a candidata do PSOL, Dirlene Marques, tem a seu lado a candidata a co-governadora (termo usado pelo partido para substituir “vice-governadora”) Sara Azevedo, da mesma legenda. O projeto registrado pelas duas no TRE-MG expõe importantes discussões sobre os movimentos LGBT, indígena, negro e feminista, e promete tratá-los com prioridade em um possível governo.

Sobre as mulheres, as candidatas defendem desde o enfrentamento às desigualdades de gênero até a despatologização da identidade de mulheres trans – movimento que denuncia a psiquiatrização e a violência dos procedimentos médicos em relação a essa parcela da população. No texto, as palavras “mulher” e “mulheres” aparecem 74 vezes, e há definições claras de como o Estado deve agir para apoiar a população feminina.

Dirlene Marques em entrevista à Campanha Libertas (Lara Alves/Campanha Libertas)

Entre as propostas da chapa estão:

  • Promoção da justiça de gênero por meio de práticas de participação e cidadania ativa mensuradas por indicadores produzidos pelos núcleos de estudos de gênero existentes nas universidades públicas do Estado;
  • Combate às várias formas de opressão das mulheres, sobretudo a violência de gênero e o feminicídio, por meio da aplicação de leis e de mecanismos que reprimam qualquer tipo de violência e que favoreçam a libertação das mulheres – e de seus familiares – das situações que as oprimem;
  • Promoção do direito ao trabalho via concursos públicos com cotas para as mulheres e inclusão do quesito igualdade de gênero para pontuação nos editais para os contratos públicos, consultorias e outras formas de convênio do Estado;
  • Capacitar profissionais para a prevenção e o atendimento às situações de violência doméstica e sexual com enfoque em direitos humanos e relações de gênero, raça/etnia, orientação sexual e deficiência e relações de classe;
  • Adoção de política de saúde para mulheres trans, lésbicas e bissexuais.

Em outras chapas que disputam o governo mineiro, a presença de mulheres como candidatas a vice-governadora não garantiu que as propostas ao público feminino tivessem mais espaço. Os candidatos Adalclever Lopes, Fernando Pimentel e Jordano Metalúrgico têm mulheres na retaguarda da corrida eleitoral, mas seus planos pouco se debruçam sobre as urgências dessa população.

O outro lado

A reportagem enviou e-mails para as assessorias de cada partido que tem candidatos na disputa pelo governo, garantindo o direito de resposta, há cerca de duas semanas. Ainda não obtivemos todos os retornos, mas, conforme os candidatos forem apresentando seus posicionamentos, suas respostas serão acrescentadas a esta matéria.

Durante uma sabatina com o candidato João Batista Mares Guia (Rede) realizada pelo portal Bhaz no último dia 5, que contou com a participação da Campanha Libertas, o postulante respondeu que a contenção do aumento de casos de feminicídio se dá pelo viés educacional desde a pré-escola. Ele foi questionado também sobre a dificuldade de mulheres que se tornaram mães recentemente se reinserirem no mercado de trabalho. Mares Guia explicou que uma de suas propostas é auxiliar mães jovens, que poderão trabalhar nas escolas em que estudam e terão vagas garantidas em creches para seus filhos, para evitar a evasão escolar.

A assessoria de Romeu Zema (Novo) respondeu à Campanha Libertas destacando que o candidato trabalhará com dois principais eixos para apoiar as mulheres em um possível governo: redução do alto índice de feminicídios e criação de creches para facilitar a reinserção da mulher no mercado de trabalho. Apesar disso, o candidato, que não cita quaisquer políticas para as mulheres em seu plano de governo, não detalhou propostas práticas para a resolução dos problemas. “O Estado pode ser um agente para fomentar parcerias público-privadas com creches, acompanhando o desempenho da criança e o tratamento oferecido. Com a queda da natalidade, vejo que existe um espaço a ser preenchido. Muitas escolas estão sendo subutilizadas, com espaços que poderiam estar sendo adaptados e transformados para outros fins”, diz trecho da nota enviada à reportagem.

Atualização:

Após a publicação dessa reportagem, a assessoria do candidato Fernando Pimentel afirmou, em documento enviado à Campanha Libertas, que o combate à violência contra a mulher continuará como uma prioridade no caso de uma possível reeleição. “O enfrentamento à violência contra a mulher tem sido uma diretriz do meu governo”, apontou o candidato em nota. Segundo sua assessoria, Pimentel pretende dar continuidade ao Programa Mediação de Conflitos e à reorganização do SUAS (Sistema Único de Assistência Social). Além disso, projetos como o Alerta MG – em que as vítimas podem acionar uma rede de contatos online em caso de risco – e a 1ª Companhia de Polícia Militar Independente de Prevenção à Violência Doméstica Contra as Mulheres (PVD) devem ganhar destaque em um novo governo.

Já a assessoria do candidato Antonio Anastasia informou, em resposta enviada por e-mail, que os caminhos apontados no documento enviado ao TRE-MG são apenas “diretrizes”. O candidato alega que o plano de governo está sendo produzido “em diálogo com diversos movimentos sociais” e “contemplará ações específicas de políticas públicas para mulheres”.

Para a construção dessa reportagem, a Campanha Libertas fez a análise dos planos de governo cadastrados pelos candidatos no TRE-MG. Inicialmente, havíamos classificado Adalclever Lopes e Antonio Anastasia como candidatos que apresentam propostas para as mulheres, mas em uma reanálise dos planos ficou claro que ambos mencionam, porém não detalham suas propostas para o público feminino. Neste sentido, Dirlene Marques é, de fato, a única a apresentar projetos e propostas específicas e detalhadas para as mulheres em seu plano de governo. A reportagem foi atualizada com a nova classificação no dia 18 de setembro.

Campanha Libertas[email protected]

Somos um coletivo de mulheres jornalistas de Minas que já trabalharam em redações de grandes jornais de BH e em assessorias de imprensa. A Campanha Libertas – Por mais mulheres na política surgiu para fazer uma cobertura jornalística independente sobre as eleições de 2018 com foco nas mulheres.

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