Ocupação é incendiada no bairro Olhos D’Água, região Oeste de BH, após ameaça de empresário

Reprodução/WhatsApp

Por Vítor Fórneas e Cristiana Andrade

Um incêndio destruiu barracões da ocupação Vila Nova, no bairro Olhos d’Água, na região do Barreiro, em Belo Horizonte, na madrugada desta terça-feira (16). De acordo com o Corpo de Bombeiros, duas vítimas, de 22 e 43 anos, relataram que os barracos onde moravam ficaram completamente destruídos.

Aos agentes, eles disseram que aproximadamente 20 homens armados chegaram na ocupação, por volta de 1h30, e incendiaram os barracões de madeirite.

Assista ao vídeo do momento do incêndio:

Ao Bhaz, uma das vítimas, que preferiu não se identificar com receio de sofrer retaliações, disse que, na última sexta-feira (12), Elias Tergilene, empresário proprietário do Shopping Uai, foi ao local e os ameaçou dizendo que eles deveriam sair do local até a segunda-feira (15).

O empresário fez um vídeo enquanto conversava com os moradores, que também registraram a ação de Tergilene. Pelas imagens, é possível ver a fundação em construção de uma das residências, com material de construção ao lado. Tergilene diz que está no local fazendo a vistoria oficial, e afirma que há invasão do terreno junto à divisa com um dos motéis da região.

“Tô filmando aqui, ó. Ele está insistindo e fazendo, tem bloco de construção. Tem cerca aqui… Tô fazendo a vistoria oficial. Todos que estão aqui já foram avisados que não é para construir, o rapaz até está aqui documentando também. Porque segunda-feira vai estar retirando (sic), fazendo a reintegração de posse para a Rede Ferroviária Federal”, diz o empresário.

Só para lembrar, a Rede Ferroviária Federal S/A foi incluída no Programa Nacional de Desestatização, em 1992, passando parte de sua malha para a iniciativa privada. A empresa estatal foi extinta em de 22 de janeiro de 2007, pela medida provisória 353 do governo federal.

Um homem – que possivelmente mora no local, está filmando Tergilene, mas não aparece no vídeo – emenda a conversa: “E vai trazer o mandado, o documento e tudo, né?”. O empresário responde que vai trazer o que a lei permite e questiona: “Você tem mandado para estar aqui? Para você entrar aqui dentro do terreno que não é seu, quem te deu ordem?”.

Veja o vídeo do empresário, falando aos moradores e gravado por um deles:

A vítima que falou ao Bhaz informou ainda que caso não saíssem, seriam retirados à força do local. “Ele disse que ia desocupar todo mundo com trator. Durante o dia ficamos esperando, mas à noite vieram os comparsas dele apontando armas para nós, inclusive contra o meu irmão, que estava com a filha dele de 1 ano e 6 meses no colo”, disse.

No boletim de ocorrência da Polícia Militar, que foi chamada pelos moradores da ocupação, as vítimas confirmaram as ameaças sofridas e o caso foi encaminhado à 4ª Delegacia de Plantão do Barreiro.

Na manhã desta terça-feira, um dos moradores gravou o que restou de seu barraco:

Empresário se posiciona

Procurado nesta terça-feira (16) pela reportagem do Bhaz, Elias Tergilene disse que na linha férrea desativada, local onde a ocupação está, há um projeto para que seja instalado o polo gastro-cervejeiro de Belo Horizonte. “Aquele espaço [linha férrea] é da União e está sendo transferido para o município. Fui até o local em que essas pessoas estão ocupando para alertá-las de que não poderiam invadir”, disse.

O empresário ainda relatou que os motéis localizados naquela região começaram a ser vendidos para fomentar o turismo. Dentro do projeto, Tergilene diz que há a intenção de reativar a Maria Fumaça na linha férrea da região. “Tem gente que está vendendo lote na ocupação por R$ 40 mil, aquilo virou o Minha Casa, Minha Favela. É o cidadão disputando com o invasor”, destacou.

De acordo com o empresário, atos de vandalismo e roubos estão sendo cometidos no entorno dos motéis e, segundo ele, “muitos dos moradores da invasão são criminosos”. “Uma busca é necessária ser feita por lá para prender aquele pessoal. Tem gente com tornozeleira eletrônica e mandado de prisão em aberto. Já retiraram janelas dos motéis para comprarem crack”, contou.

Sobre o incêndio desta madrugada ele foi categórico: “Isso é história deles. Não tem nada disso, é mentira. Se você conversar com qualquer favelado, ele vai se colocar como vítima”, concluiu.

A Polícia Civil informou que instaurou inquérito civil para apurar o caso do incêndio e que os envolvidos serão intimados a depor. A perícia foi acionada nesta terça-feira (16) para acompanhar as investigações no local do incêndio.

O que diz a Prefeitura de Belo Horizonte

A Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (Urbel) afirmou não ter mapeada a ocupação Vila Nova entre vilas e favelas da capital no bairro Olhos D’Água. Ou seja, desconhece a ocupação. Em agosto, a Urbel informou ao Bhaz que há uma centena de novas ocupações na cidade, consideradas clandestinas pela administração municipal, que estavam sendo mapeadas pelo município. Este trabalho está em andamento.

Procurada pelo Bhaz para falar sobre possível parceria entre iniciativa privada e o município de Belo Horizonte, para a instalação do polo cervejeiro e a linha turística da Maria Fumaça, a Belotur não respondeu aos questionamentos, informando que as respostas seriam dadas pela Secretaria Municipal de Política Urbana (SMPU), que se limitou a dizer:

“O bairro Olhos d’Água é sede de diversas cervejarias, o que pode motivar a ideia de que o local tem potencial para a criação de projetos relacionados ao tema. No entanto, na subsecretaria de Regulação Urbana, até o momento, não consta formalmente nenhum projeto referente à criação de um polo cervejeiro no bairro”, informou a nota da SMPU.

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