Mais responsabilidade x mais imposto: PBH esconde estudo e Plano Diretor chega à reta final em ebulição

Projeto pode dar outros rumos à capital mineira (Henrique Coelho/BHAZ)

Na semana em que, enfim, terá uma definição, conforme a previsão dos vereadores da capital, o Plano Diretor de Belo Horizonte segue cercado de dúvidas e polêmicas. A proposta que influencia diretamente no futuro da capital deve ir ao plenário da Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH) na próxima quarta-feira (5) ainda com questões que não foram respondidas.

Segundo o vereador Léo Burguês (PSL), líder de governo na CMBH, a expectativa é de que o projeto seja aprovado por unanimidade na próxima quarta. “Temos votos suficientes para aprovar o plano sem dor de cabeça porque a proposta é boa”, disse.

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Caso seja aprovado em segundo turno na CMBH, o novo Plano Diretor da capital vai trazer mudanças no direcionamento e desenvolvimento da cidade nos próximos anos. O projeto traz novas diretrizes sobre habitação, transporte, meio ambiente, construções, moradias etc. Com isso, as alterações podem significar novas avenidas, expansões verticais nos bairros, parques e espaços ecológicos e corredores verdes para solucionar problemas como enchentes.

Impacto do Plano

A última polêmica é sobre o impacto econômico do novo plano na cidade. De um lado, os órgãos que representam os empresários da construção alegam que morar em BH vai ficar mais caro devido a aplicação da Outorga Onerosa (saiba mais abaixo). Por outro lado, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) se defende alegando que a proposta dará fim à especulação imobiliária e, com isso, trará imóveis mais baratos para a população da capital.

Em entrevista coletiva na última terça-feira (21) a secretária de Planejamento Urbano da capital, Maria Caldas, foi questionada sobre o tema e disse que a PBH fez um estudo elaborado sobre o impacto do Plano Diretor na capital.

“A prefeitura fez não só um estudo de impacto, como milhares de simulações, que estão à disposição da imprensa quando quiser conhecê-las”, disse Maria Caldas.

Contudo, na quarta-feira (22), o BHAZ solicitou à secretaria o estudo, conforme adiantado pela própria secretária e, mesmo diante da insistência, até o momento, não recebemos retorno. Os e-mails não foram respondidos e, por telefone, a assessoria alega que o estudo será apresentado em uma coletiva à imprensa que ainda não tem previsão de acontecer.

Outorga Onerosa

A Outorga Onerosa tem dois entendimentos. O primeiro de que é um novo imposto criado em Belo Horizonte e, o segundo, de que a cobrança democratiza a cidade.

A proposta é considerada a mais polêmica do plano até o momento. A taxa deve custar até 40% do valor de mercado dos terrenos da capital.

Funciona assim: a fórmula para determinar o tamanho de uma construção é feita multiplicando o Coeficiente de Aproveitamento (CA) pelo tamanho da área do terreno em metros quadrados. Atualmente, há terrenos com diversos coeficientes na capital, variando entre 1.0 e 5.0.

A outorga coloca todos os terrenos da cidade em coeficiente 1.0, que é o básico. Para o empresário chegar ao máximo, ele tem de comprar o direito de construir.

Entenda como funciona a Outorga Onerosa (Arte de Henrique Coelho/BHAZ)

Segundo a arquiteta e urbanista, mestre em planejamento urbano pela UFRJ, Júlia Birchal, que faz parte do movimento ‘Vereador, aprove o Plano Diretor’, a outorga é uma espécie de retorno para a sociedade.

“A outorga é o reconhecimento que o potencial construtivo de uma região é fruto do investimento público e, por isso, deve apresentar retorno para a sociedade. Por exemplo, quando um empresário constrói um grande empreendimento ele gera a necessidade de serviços públicos na região como escolas, colheita de lixo, saneamento etc. O pagamento da outorga é para ajudar no pagamento dessas necessidades”, diz a arquiteta.

Empresários afirmam que construções podem ficar mais caras em BH (Letícia Vianna/BHAZ)

Por outro lado, o vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Teodomiro Diniz Camargos, alega que o plano só pensa em arrecadação, atrasando o avanço da cidade.

“Essa questão de arrecadar para aplicar na infraestrutura da região e utilizar o recurso para fazer política social de habitação não passa de uma desculpa da PBH. O plano, na verdade, pensa somente em arrecadar e manter a política dos últimos anos, que deixou BH com um IPTU mais caro que as cidades ao redor. A outorga é danosa e não estimula processo construtivo para gerar mais renda na cidade”, diz.

Estudos

Conforme citado acima, a PBH ainda não disponibilizou o estudo de impacto econômico do Plano Diretor. Contudo, outras pesquisas se contradizem quanto a aplicação do plano na capital. A Fiemg, por exemplo, questiona a afirmação da prefeitura de que há um levantamento feito pela gestão municipal.

“Eles falam, mas nunca mostraram esse estudo, nem durante a conferência sobre o plano. O estudo de estoque de outorga, por exemplo, nunca foi apresentado. Não existe esse estudo. Se existe peço que me contrariem. Não tem clareza. Na verdade, o estoque de outorgas em BH será a necessidade de caixa da prefeitura. A PBH vai virar a grande especuladora urbana e vender terrenos conforme a necessidade de caixa. Com isso, o desenvolvimento deixa de ser planejado. É isso que estamos tentando dizer”, diz Teodomiro.

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A Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura (Asbea) também fez um estudo sobre a implantação do plano na capital. Segundo a presidente da Asbea, Fernanda Basques, o levantamento mostra que haverá perdas e consequências para a capital.

Estudos divergem sobre o custo de verticalização na cidade (Amanda Dias/BHAZ)

“Quando a PBH alega que só os grandes empresários vão perder, não é verdade. As pessoas com residências unifamiliares, ou seja, a classe média que tem uma casa, não conseguirá bancar a outorga. Além disso, o aumento de preço na capital vai acabar levando as pessoas para as periferias”, contesta a arquiteta.

Fernanda considera o plano como uma espécie de cheque em branco para a PBH. “A arrecadação da prefeitura com a outorga não vai suprir a arrecadação com o IPTU, porque o número de pessoas para pagar é menor. A conta não fecha. Isso nos assusta. Para o nosso setor é um cheque em branco, não sabemos como vai ser”, diz.

A arquiteta Júlia Birchal contesta a afirmação. Segundo ela, os estudos feitos pelo projeto ‘Vereador, aprove o Plano Diretor’, em parceria com membros da UFMG e PUC Minas, mostram que o novo plano não encarece os imóveis.

“Os primeiros anos do plano não serão com coeficiente um. Terá tempo para o mercado se adaptar. O plano, na verdade, abaixa o lucro dos empresários, pois, muitas vezes, as construtoras querem fazer prédios gigantes sem nenhum compromisso com a cidade e com os vizinhos. A iniciativa privada precisa assumir responsabilidades e não ficar só com o lucro”, rebate.

Quanto ao argumento de que a classe média da capital pode sofrer com a aplicação da outorga, Júlia alega que é mais uma afirmação falsa. “Na realidade, o que eles falam não é o que vai acontecer. Todo mundo tem direito a construir um prédio de até três andares com o potencial já dado pela outorga, dependendo do tamanho do terreno. É uma construção de médio porte sem pagar a outorga. Essa afirmação de que vai afetar cidadão comum é uma inverdade. Inclusive a ideia do plano diretor é facilitar a vida do cidadão de classe média baixa. Aumentar moradia mais barata nas outras centralidades”, diz.

Santa Tereza e o ‘Chapéu de Napoleão’

Outro ponto polêmico do Plano Diretor é a região da Vila Dias, no bairro Santa Tereza, na região Leste da capital. Os moradores lutam para que a área conhecida como ‘Chapéu de Napoleão’, referência ao formato parecido com o adereço do líder francês, entre na Área de Diretrizes Especiais (ADE) do bairro.

No último substitutivo do projeto apresentado na Câmara Municipal, a região não está inclusa nas diretrizes. Os moradores temem que isso possa prejudicar as características do bairro, já que uma construtora pretende construir um complexo de prédios no local.

No dia 16 deste mês, os moradores fizeram uma audiência pública na sala multiuso do MIS Cine Santa Tereza onde cobraram da prefeitura a inclusão da área na região protegida. “Não somos contra o plano, pois entendemos que é bom para a cidade. Mas queremos que o bairro seja preservado. No caso de uma grande construção nessa área, por exemplo, inviabilizaria a permanência das vilas no local e mudaria a dinâmica do bairro”, afirma a representante do grupo Salve Santa Tereza, Brígida Alvim, que é moradora do bairro há 10 anos.

ADE Santa Tereza defendida pelos moradores / ADE Santa Tereza que consta no Plano Diretor

A construtora PHV Engenharia, em parceria com o escritório FarKasVolGyi, a NGR Empreendimentos e a Aliansce Shopping Centers já apresentaram projetos para construção na área do ‘Chapéu de Napoleão’.

(Divulgação/PHV Engenharia e Farkasvolgyi Arquitetura )
(Divulgação/PHV Engenharia e Farkasvolgyi Arquitetura )

Além de serem contra as construções, os moradores defendem a permanência da fábrica de pregos São Lucas, que é considerada um patrimônio da capital e seria retirada do local, caso as obras das torres fossem aprovadas. “O campo de futebol, que é utilizado pela comunidade, já foi comprado pela construtora. Agora, querem derrubar a fábrica e construir na área toda. Entendemos que a fábrica de pregos faz parte do patrimônio e defendemos que ela seja incluída na área de proteção do bairro”, diz a moradora.

Questionado sobre a inclusão do ‘Chapéu de Napoleão’ na ADE do Santa Tereza, o vereador líder de governo, Léo Burguês disse que “isso só será decidido no plenário, no dia da votação”.

Rafael D'Oliveira[email protected]

Repórter do BHAZ desde janeiro de 2017. Formado em Jornalismo e com mais de cinco anos de experiência em coberturas políticas, econômicas e da editoria de Cidades. Pós-graduando em Poder Legislativo e Políticas Públicas na Escola Legislativa.

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