O assassinato de Ágatha e a falência do atual modelo de segurança pública

Por Áurea Carolina, deputada federal pelas Muitas/Psol

Diante de um país estarrecido pelo horror, o assassinato da pequena Ágatha durante operação policial no Complexo do Alemão vem nos lembrar, mais uma vez, da inegável falência do atual modelo de segurança pública. Somente este ano, ela foi a 16ª criança baleada no Rio de Janeiro e a quinta que não resistiu aos ferimentos. Em vez de proteger suas crianças, o Estado as mata com um tiro de fuzil nas costas.

A PM do Rio nega participação no caso e diz que “não vai recuar”. Responsável pelo comando da polícia no estado, o governador insiste em tratar mais essa morte como um “caso isolado” – Witzel, o mesmo entusiasta do uso de snipers e da execução sumária de suspeitos pelos agentes de segurança. Do Ministro da Justiça, lemos apenas condolências protocolares, somadas à reiterada defesa de seu famigerado projeto “anticrime”, que deverá agravar a já altíssima letalidade policial no país. E o presidente da República mantém o silêncio sobre o caso, postura covarde, omissa e indigna de seu cargo. É o triunfo da política da morte.

Infelizmente, Ágatha NÃO é um caso isolado, um mero “erro” de uma atuação policial eficiente e preparada como querem fazer crer alguns dos mais notáveis expoentes da necropolítica que se instalou nos corredores do poder. Em um país cujas taxas de homicídio têm superado recordes históricos, sabemos que a principal vítima desse modelo repressivo, armamentista e de superencarceramento continua sendo a população negra e pobre – mais de 75% das pessoas assassinadas são negras, como aponta estudo do Ipea e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Uma guerra cotidiana e extremamente letal. Um verdadeiro genocídio da população negra, como gritamos há tempos nas lutas antirracistas e por defesa das vidas negras e periféricas do nosso país.

Esse cenário de trevas pode se agravar com a aprovação do pacote “anticrime” de Sergio Moro, especialmente com o chamado “excludente de ilicitude”. Esse ponto altera o Código Penal para ampliar as hipóteses de legítima defesa e prever a possibilidade de redução da pena pela metade ou mesmo sua não aplicação em caso de excesso decorrente de “excusável medo, surpresa ou violenta emoção”. Na prática, dá imunidade para agentes da segurança que matarem pessoas em serviço, uma “licença para matar”. No caso de Ágatha, por exemplo, sendo mesmo um policial o seu assassino, ele poderia alegar que agiu imbuído dos sentimentos acima. E poderia ser absolvido pelo juiz.

Na Câmara dos Deputados, o Grupo de Trabalho dedicado a discutir o projeto se reúne nesta terça (24) para votar um relatório final e, assim, subsidiar a discussão sobre o texto na Comissão de Constituição e Justiça da Casa. Nós do PSOL na Câmara, por meio do querido Marcelo Freixo, que compõe o GT, estamos empenhados em derrubar o artigo sobre o excludente de ilicitude e contamos com o apoio dos colegas parlamentares. É o mínimo que podemos fazer depois do terrível episódio do final da semana. Além disso, em conjunto com outros partidos da oposição, o PSOL protocolou nesta segunda uma denúncia contra Witzel no Superior Tribunal de Justiça, para que ele responda pelos crimes que vêm sendo praticados pela PM e que ocorrem, como é sabido, sob seu aval, estímulo e fomento públicos.

O pacote do Moro reforça a ação do racismo estrutural na política de segurança pública do país. Não ataca efetivamente a violência e agrava a imposição de um Estado penal, a partir do controle explícito dos corpos negros, historicamente tidos como alvos do encarceramento em massa, da seletividade criminal e da violência policial. Mudar essa lógica é também proteger vidas e, sobretudo, as vidas desses grupos em situação de vulnerabilidade, expostos a violações de direitos de toda ordem. Nossas vidas importam e não descansaremos na luta por justiça para Ágatha e para todos os que tombam pela ação do Estado.

Gabinetona[email protected]

A Gabinetona é um mandato coletivo construído por quatro parlamentares em três esferas do Legislativo. É representada pelas vereadoras Cida Falabella e Bella Gonçalves na Câmara Municipal de Belo Horizonte, pela deputada estadual Andréia de Jesus na Assembleia Legislativa de Minas Gerais e pela deputada federal Áurea Carolina na Câmara dos Deputados, em Brasília.

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