Nossos encontros com Angela Davis

Angela Davis homenageada com a Medalha Tiradentes durante o 12º Encontro de Cinema Negro Zózimo Bulbul (Mayra Bernardes/Gabinetona)

por Andreia de Jesus, deputada estadual pelas Muitas/Psol

Nos dias que antecederam minha viagem ao Rio de Janeiro, a equipe da Renata Souza me pediu para gravar um vídeo sobre como conheci o trabalho de Angela Davis, que seria homenageada com a Medalha Tiradentes durante o 12º Encontro de Cinema Negro Zózimo Bulbul. Antes de gravar o vídeo, ficamos olhando várias fotos da trajetória de vida de Davis; eram muitas fotos antigas, tiradas antes mesmo de eu nascer, com presidentes, líderes sindicais, líderes de partidos e, também, discursando para milhares de outras pessoas negras. Fiquei imaginando o dia daqueles eventos fotografados. As passeatas com centenas de punhos cortando o ar. O dia de sua prisão, em Nova York. Sua passagem por Cuba. Os títulos que recebeu enquanto acadêmica, mais recentemente.

Essa era a Angela que conhecia – a Angela das fotos históricas, cuja força nutre o meu trabalho enquanto uma das únicas parlamentares negras da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Seus escritos sobre abolicionismo penal, sobre a relação indissociável entre gênero, raça e classe, e sobre histórico secular das lutas de resistência das mulheres negras ao patriarcado, ao capitalismo e ao racismo estão presentes em cada passo que dou na minha atuação enquanto parlamentar e militante. Eu não ando só.

Não falo e nem entendo uma palavra de inglês, mas Angela Davis queria me conhecer, e eu iria ao seu encontro alguns dias depois. Embarquei para o Rio de Janeiro no final da manhã de terça-feira, depois de conversar via Skype com o prefeito de Valparaíso, no Chile, que me contava sobre os levantes populares que, indignados, tomavam as ruas para lutar por mudanças. Às 18h, chegamos no centro do Rio de Janeiro, e fui me preparar para o jantar de logo mais, organizado pela Fundação Rosa Luxemburgo, cujo local era mantido em segredo por questões de segurança.

Com um friozinho na barriga, desço do carro e entro em um estabelecimento que parecia familiar do lado de fora; Quando entro, reconheço que é o Bar da Dida, ponto de aquilombamento. E é isso que encontramos lá dentro: um aquilombamento de pretas e pretos que resistem a esse cenário de tantos retrocessos que temos vivido no Brasil. Somos sementes de Marielle – eu, Áurea Carolina, Mônica Francico, Dani Monteiro, Talíria Petrone, Jô Cavalcanti, Érica Malunguinho, Vilma Reis, Renata Souza, e estamos ali sentadas com seus pais, Marinete e Toinho Franco, e também com sua irmã e filha. Chega, então, uma mulher alta, com um black grisalho e de óculos, tão diferente daquela das fotos, mas é ela: Angela Davis.

Durante o jantar, pediram que eu me apresentasse. Comecei a contar que antes de estar deputada, fui empregada doméstica e educadora infantil, e então cai a ficha que estou ali contando a minha história para aquela mulher das fotos. Nunca imaginei que fosse conseguir falar com ela, mas estou ali, falando. No final da noite, saio cansada, mas mais fortalecida do que nunca para o encontro do próximo dia.

Antes de chegar ao Odeon, na tarde de quarta-feira, visitei o prédio histórico da Alerj. Sou anunciada no microfone do Plenário pelo presidente da casa onde, antes, funcionava o Congresso Nacional. Passo pelos corredores e mesas onde sentaram e ainda se sentam infinitos homens. É impossível não pensar que tem um pouquinho de história sendo escrita quando eu entro ali e me sento.

E, mais tarde, compartilho com outras centenas de pretas e pretos a honra de ver Angela palestrar e ser condecorada. O coração se aquece quando, no palco, ela se lembra da minha história ao dizer que temos mulheres negras movendo as estruturas no Brasil. É uma responsabilidade enorme, mas estamos juntas, conectadas pela força de nossas ancestrais. E, agora, inspiradas pelos encontros com Angela na cidade de Marielle Franco

Gabinetona[email protected]

A Gabinetona é um mandato coletivo construído por quatro parlamentares em três esferas do Legislativo. É representada pelas vereadoras Cida Falabella e Bella Gonçalves na Câmara Municipal de Belo Horizonte, pela deputada estadual Andréia de Jesus na Assembleia Legislativa de Minas Gerais e pela deputada federal Áurea Carolina na Câmara dos Deputados, em Brasília.

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