Vale previa tragédia em Brumadinho desde 2017 e calculava 215 mortes

Aline Diniz/BHAZ + Amanda Dias/BHAZ

Desde novembro de 2017, a Vale e a TÜV SÜD sabiam que a Barragem I, da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, na região metropolitana da capital, não apresentava condições favoráveis de segurança. Havia, inclusive, um documento que indicava que, no pior cenário, 215 pessoas morreriam em caso de rompimento. A empresa “calculava” que, a cada vida perdida, teria que desembolsar dois milhões e 600 mil dólares.

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“Era uma gestão opaca. A Vale impôs uma ditadura corporativa e escondeu os riscos da sociedade e do poder público”, afirmou o promotor e coordenador da força-tarefa do MPMG (Ministério Público de Minas Gerais), William Garcia Pinto Coelho. 

A quatro dias da tragédia de Brumadinho completar um ano, o MPMG denunciou 16 pessoas por 270 mortes. Entre os denunciados está o ex-presidente da Vale, Fabio Schvartsman. Se os suspeitos forem condenados a 30 anos por cada homicídio doloso (quando a pessoa tem a intenção de matar), a pena individual seria de 8.100 anos. Além disso, as 16 pessoas foram denunciadas por crimes ambientais e as duas empresas também terão que responder pelos mesmos delitos. 

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Top 10 da calamidade

Além da barragem que se rompeu, outras nove estruturas da Vale fazem parte de uma lista chamada dentro da mineradora de “TOP 10 – Probabilidade”. Estas dez barragens estariam em situações inaceitáveis. No entanto, a Tüd Süd – que atesta a segurança das estruturas -, emitiu Declarações de Condição e Estabilidade (DCEs).

O MPMG e a Polícia Civil acreditam que, se a verdade tivesse sido informada para a sociedade e para o governo, a tragédia de Brumadinho, que deixou 259 mortos e 11 desaparecidos, poderia ter sido evitada. 

Com relação as outras nove barragens, o MPMG informou que há auditores trabalhando para o órgão para saber a real situação em que elas se encontram. Algumas delas, inclusive, sofreram algum tipo de intervenção após a tragédia, como em Itabira e Ouro Preto, ambas na região Central do Estado. 

“A situação inaceitável de segurança geotécnica da barragem I da Mina Córrego do Feijão era plena e profundamente conhecida pelos denunciados, os quais concorreram para a omissão na adoção de medidas conhecidas e disponíveis de transparência, segurança e emergência, assumindo, desta forma, o risco de produzir os resultados decorrentes do rompimento”, explicou.

Caixa-preta da Vale

As autoridades chegaram ainda à conclusão de que a Vale e a TÜV SÜD estruturaram uma espécie de proteção inviolável com relação aos fatos relacionados às barragens. As informações eram sigilosas e não eram repassadas.

O principal motivo seria manter uma “boa” imagem da Vale no mercado mesmo após o rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana, em 2015. A mineradora foi ré no processo. Conforme o Ministério Público, esse era um dos objetivos do ex-presidente. Ele comandaria a Vale por um período curto: de dois anos prorrogáveis por mais dois. 

Lista dos denunciados

Da mineradora Vale, foram denunciados os seguintes empregados:

  1. Fábio Schvartsman, diretor-presidente da companhia;
  2. Silmar Magalhães Silva, diretor do Corredor Sudeste;
  3. Lúcio Flávio Gallon Cavalli; diretor de Planejamento e Desenvolvimento de Ferrosos e Carvão;
  4. Joaquim Pedro de Toledo, gerente-executivo de Planejamento, Programação e Gestão do Corredor Sudeste;
  5. Alexandre de Paula Campanha, gerente-executivo de Governança, Geotecnia e Fechamento de Mina;
  6. Renzo Albieri Guimarães de Carvalho, gerente operacional de Geotecnia do Corredor Sudeste;
  7. Marlene Christina Oliveira Lopes de Assis Araùjo, gerente de Gestão de Estruturas Geotécnicas;
  8. César Augusto Paulino Grandchamp, especialista técnico em Geotecnia do Corresor Sudeste;
  9. Cristina Heloiza da Silva Malheiros, engenheira sênior na Gerência de Geotecnia Operacional;
  10. Washington Pirete da Silva, engenheiro especialista da Gerência Executiva de Governança em Geotecnia e Fechamento de Mina;
  11. Felipe Figueiredo Rocha, engenheiro civil que atuava na Gerência de Gestão de Estruturas Geotécnicas.

Da companhia Tüv Sud, foram cinco colaboradores denunciados:

  1. Chris-Peter Méier, gerente-geral da empresa;
  2. Arsênio Negro Júnior, consultor técnico;
  3. André Jum Yassuda, consultor técnico;
  4. Maroto Namba, coordenador;
  5. Marlísio Oliveira Cecílio Júnior, especialista técnico

Nota da TÜV SÜD na íntegra

A TÜV SÜD continua profundamente consternada pelo trágico colapso da barragem em Brumadinho, em 25 de janeiro de 2019. Nossos pensamentos estão com as vítimas e suas famílias.

Um ano após o rompimento, suas causas ainda não foram esclarecidas de forma conclusiva.

Como era esperado, as investigações levam um tempo considerável: muitos dados de diferentes fontes precisam ser compilados, apurados e analisados. Por esse motivo, as investigações oficiais continuam.

A TÜV SÜD reitera seu compromisso em ver os fatos sobre o rompimento da barragem esclarecidos. Por isso, continuamos oferecendo nossa cooperação às autoridades e instituições no Brasil e na Alemanha no contexto das investigações em andamento.

Enquanto os processos legais e oficiais ainda estiverem em curso, e até que se apurem as reais causas do acidente de forma conclusiva, a TÜV SÜD não poderá fornecer mais informações sobre o caso.

Nota da Vale na íntegra

“A Vale informa que tomou conhecimento nesta data, 21 de janeiro de 2020, do oferecimento de denúncia pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) com relação ao rompimento da Barragem I, na Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG).

Sem prejuízo de se manifestar formalmente após analisar o inteiro teor da denúncia, a Vale desde logo expressa sua perplexidade ante as acusações de dolo.  Importante lembrar que outros órgãos também investigam o caso, sendo prematuro apontar assunção de risco consciente para provocar uma deliberada ruptura da barragem.

A Vale confia no completo esclarecimento das causas da ruptura e reafirma seu compromisso de continuar contribuindo com as autoridades”.

Aline Diniz[email protected]

Editora do BHAZ desde janeiro de 2020. Jornalista diplomada pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) há 10 anos e com experiência focada principalmente na editoria de Cidades, incluindo atuação nas coberturas das tragédias da Vale em Brumadinho e Mariana. Já teve passagens por assessorias de imprensa, rádio e portais.

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