Rap e doações freiam a Covid-19 no Morro do Papagaio: ‘Parece inofensivo, mas é nosso grande inimigo’

ação favela conter covid-19
Comunidade se mobiliza para afastar Civid-19 e ajudar moradores do Morro do Papagaio (Arquivo Pessoal/Reprodução)

Ao lado de bairros ricos como o Santo Antônio, o Santa Lúcia e o São Bento está o Morro do Papagaio. A comunidade, que abriga entre 17 e 20 mil pessoas, achou uma maneira solidária para combater o novo coronavírus. O líder comunitário Julio Fessô e o pessoal do Movimento Livre Eu amo Minha Quebrada resolveram conscientizar sobre o isolamento social onde, muitas vezes, o poder público não chega.

Há mais de um mês, a iniciativa começou com um rap. Depois seguiu com doações de comida, produção de máscaras e projetos para tirar as crianças das ruas, entre outras ações.

A música não só chama a atenção para os cuidados com relação a Covid-19, como leva em consideração a realidade da comunidade. “Estava lá do outro lado, chegou aqui de mansinho. Coronavírus é tipo cerol fininho. Na favela é complicado mudar suas ações, mas, na medida do possível siga as orientações”, diz um trecho da canção.

A letra e voz de Julio Fessô se misturam com a voz de Mc Jhonata e dão o recado nas ruas estreitas do morro com a ajuda de um carro de som. Os integrantes da ação usam ainda dois megafones emprestados para ajudar na conscientização. O aluguel do carro é de R$ 20 por hora e o financiamento vem de doações. Ouça abaixo:

‘Como evitar aglomeração se vivemos num aglomerado?’

Nascido e criado no Morro do Papagaio, Julio, de 44 anos, revelou ao BHAZ que a linguagem técnica usada pela OMS (Organização Mundial da Saúde) não atinge como deveria grande parcela dos moradores da comunidade. Por isso, eles resolveram facilitar.

Além da composição do rap, foram confeccionados cartazes e panfletos. “Como falar que não se pode fazer aglomeração, se moramos em um aglomerado. Por isso, a gente pede que se evite, na medida do possível. E pra quem precisa descer para o asfalto, para trabalhar, a gente distribuiu máscaras e álcool em gel”, explicou Fessô.

Ele mesmo dá o exemplo. Morando com dois adolescentes, de 16 e 17 anos, Julio tira as roupas assim que chega em casa e se higieniza. No entanto, ele tem preferido não voltar para casa para reduzir o risco. “Muitas vezes eu durmo na ONG. Meus filhos estão isolados”, contou.

Ação do Morro do Papagaio (Arquivo Pessoal/Reprodução)

As máscaras estão sendo produzidas por costureiras do morro a partir de materiais doados. A conscientização é feita com idosos, como pessoal do grupo de risco e também com as crianças, que passaram a ser aliadas no processo.

Crianças parceiras

“A gente estava vendo muita criança nas ruas. Uma pessoa do Sion doou xerox com desenhos e entregamos com lápis de cor. Mas só para quem concordasse em ficar em casa. Distribuímos também 600 sabonetes para as crianças. Como elas aprenderam a lavar as mãos nas escolas, elas ensinam aos adultos”, acrescentou Julio.

A ação fez sucesso na casa de Edvania Zenilda de Paula, de 44 anos. A manicure e cozinheira está em casa acompanhada de quatro crianças. “Aqui o que salvou foram os desenhos para colorir e o video game”, brincou.

WhapsApp contra notícias falsas

O pessoal criou ainda um grupo no WhatsApp para combater as notícias falsas e espalhar verdades e informações sobre a doença.

Ação do Morro do Papagaio (Arquivo Pessoal/Reprodução)

Doações de cestas

Em tempos de desemprego, a turma tratou de juntar donativos e distribuir cestas básicas. No entanto, o grupo faz um cadastro. Recebem os alimentos aqueles que não obtiveram, por exemplo, o benefício da prefeitura. Edvania contou que abriu mão. “Eu recebi da escola e recebo o bolsa família. É melhor deixar para quem está precisando”, contou.

O rap funcinou?

Ainda segundo Edvania, depois que o carro de som começou a passar, as pessoas decidiram ficar mais em casa. “Julio conscientizou muita gente. As ruas estão mais vazias e o pessoal mais conscientizado. Todo mundo sabe que tem que lavar as mãos, usar máscaras. É bem explicado”, revelou a manicure.

Ação do Morro do Papagaio (Arquivo Pessoal/Reprodução)

É possível ajudar?

Como a quarentena ainda não tem data para acabar, quem quiser e puder pode ajudar com doações. O endereço do Centro Comunitário Tio Flavio é rua São Tomás de Aquino, número 487.

Quem preferir pode ainda mandar um WhatsApp ou ligar para o Julio no número: (31) 99457-2625. A ideia do grupo é expandir a ação para outros aglomerados de Belo Horizonte.

Ação do Morro do Papagaio (Arquivo Pessoal/Reprodução)
Aline Diniz[email protected]

Editora do BHAZ desde janeiro de 2020. Jornalista diplomada pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) há 10 anos e com experiência focada principalmente na editoria de Cidades, incluindo atuação nas coberturas das tragédias da Vale em Brumadinho e Mariana. Já teve passagens por assessorias de imprensa, rádio e portais.

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