Após pandemia, transferências de presos aumentam em MG e grupo fará manifestação em frente à ALMG

Além das transferências, grupo denuncia aumento da violência
Além das transferências, grupo denuncia aumento da violência (IMAGEM ILUSTRATIVA – Marcello Casal Jr./Agência Brasil)

Um grupo de apoio a familiares de detentos denuncia o aumento de transferências e o crescimento da violência nas unidades prisionais de Minas Gerais, durante a pandemia do novo coronavírus. Um ato deve ocorrer nesta quinta-feira (4), em frente à ALMG (Assembleia Legislativa de Minas), em busca de solução para os problemas relatados.

A psicóloga Bárbara Fialho integra o “Grupo de Amigos e Familiares de Pessoas em Privação de Liberdade” e conta, ao BHAZ, como está a situação. “Estamos tendo um grande aumento no número de transferências dos presos. Uma coisa absurda. Só para ter ideia, na Nelson Hungria mais de 400 pessoas foram levadas para outras unidades”, explica.

A transferência fez, segundo Bárbara, cidades do interior registrarem casos de Covid-19. “Quando se faz a transferência é preciso ter aparato, escolta e você acaba aumentando a exposição ao vírus, além de fazer o vírus ‘viajar’”, pondera.

‘Sem justificativa’

Fernanda Oliveira é advogada do grupo e diz que as transferências acontecem “sem nenhuma justificativa”. O Governo de Minas explicou o motivo por meio de nota (veja abaixo).

“Familiares dos detentos nos procuram dizendo que houve aumento nas transferências. Uma comissão da OAB-MG (Ordem dos Advogados do Brasil – Minas Gerais) apurou que após a pandemia ter sido declarada, as transferências aumentaram em 60%”, diz Fernanda.

A advogada informa que a maioria dos detentos estão sendo levados para Formiga e Francisco Sá, no Centro-Oeste e Norte de Minas, respectivamente. “Quando a gente verifica o atestado carcerário falam em “Movimentação Prisional”, só que neste momento não tinha que ter isto”, diz.

Bárbara conta que a situação dos detentos está “muito complicada”. “Era possível colocar muita gente em prisão domiciliar. São pessoas que não cometeram crimes contra a vida. O Estado está indo contra as orientações da OMS (Organização Mundial da Saúde) e do Conselho Nacional de Justiça”.

Sejusp esclarece

O BHAZ questionou o Governo de Minas, por meio da Sejusp (Secretaria de Estado de Justiça Segurança Pública), sobre o números de detentos transferidos, porém não obteve resposta.

Segundo a pasta, houve aumento de transferências e isso ocorreu “em decorrência da criação das 30 unidades prisionais que passaram a funcionar como porta de entrada do sistema prisional mineiro”.

A “porta de entrada” é, conforme a Sejusp, um modelo pioneiro de circulação restrita de detentos no período da pandemia.

“Todas as pessoas presas em Minas Gerais estão sendo encaminhadas para uma unidade específica em cada região e ficam, pelo menos, 15 dias, em quarentena e observação, evitando possível contágio caso fossem encaminhadas de imediato para outras unidades. Após a observação e atestada a sua saúde, são encaminhadas para as demais unidades prisionais do Estado”, informou.

Com relação à autorização para o regime domiciliar, a secretaria esclareceu que a decisão é feita “de forma pontual e criteriosa por cada juiz das Varas de Execuções Penais do Estado”. “Ao Departamento Penitenciário, cabe apenas executar a decisão judicial”, diz em um dos trechos.

O número de detentos liberados para o regime domiciliar não foi informado, pois “estão em consolidação” segundo a pasta.

A reportagem questionou o número de policiais penais infectados pelo novo coronavírus e também não obteve resposta. “O Departamento Penitenciário de Minas Gerais (Depen-MG) não divulga o total de servidores afastados pela Covid-19, por questões de segurança, e também porque o número não impacta na prestação dos serviços à população”.

Já o número de presos foi informado: 11. Quatro estão em prisão domiciliar e estão sendo monitorados por tornozeleira eletrônica, quatro permanecem no presídio de Corinto, um no de Curvelo e dois no Ceresp Gameleira.

“Eles estão sendo acompanhados pela área de saúde das unidades. As alas em que se encontram foram isoladas, desinfectadas e todos os demais detentos usam máscaras de forma preventiva”, detalhou.

Violência e higiene

Com as transferências dos detentos, a comunicação entre eles e os familiares não acontece. Isso tem provocado o aumento da violência nas unidades prisionais, segundo as fontes ouvidas pelo BHAZ.

“Tem família sem notícia do ente há mais de dois meses. As pessoas em privação de liberdade não tem contato com os familiares e isso gera conflito entre eles. Se a gente, dentro de casa, já fica nervoso, imagina quem não tem meios, e se tiver são ilegais, para saber como as pessoas estão aqui fora?”, indaga Fernanda.

Outro ponto questionado pela advogada é a higienização, aliado importante na prevenção ao novo coronavírus. “Os detentos não têm condições de manter higiene adequada. Tem unidade que a água é ligada somente 9 minutos por dia. Eles enchem sacos plásticos para armazenar água. Não tem nem garrafa pet”.

Uma série de medidas foram tomadas pela Sejusp para prevenir e controlar o Covid-19 no sistema prisional. Entre elas está a suspensão das visitas. Para que o contato familiar continue acontecendo, segundo a secretaria, há três formas de comunicação:

  • Por meio de cartas – ação prevista para todas as unidades e com média de 35 mil recebimentos por semana
  • Ligações telefônicas – cujo número é diferente em cada unidade e deve ser fornecido pelo presídio ou penitenciária – a média semanal é de 15 mil ligações realizadas
  • Videoconferências – nas unidades em que essa tecnologia já está disponibilizada

Sobre o racionamento de água na Penitenciária de Formiga, a Sejusp disse que está havendo um problema de abastecimento em toda a região onde a unidade está localizada. “O problema não é na unidade prisional especificamente”.

A pasta negou que os registros ficam abertos somente por 9 minutos. ” As torneiras são abertas quatro vezes diariamente, enquanto durar o recurso hídrico. Para que os detentos se mantenham hidratados, são disponibilizadas garrafas de água nos corredores”.

Ato

Para denunciar as condições dos detentos, em meio à pandemia, a Frente Estadual pelo Desencarceramento realizará um ato nesta quinta-feira (4). A manifestação acontecerá, a partir das 14h, na rua Rodrigues Caldas – nº 30 – bairro Santo Agostinho, na região Centro-Sul de Belo Horizonte.

Nota da Sejusp na íntegra:

“Até o momento, mesmo com cerca de 70 mil detentos no sistema prisional, apenas 11 presos tiveram diagnóstico positivo para Covid-19. Quatro deles foram para prisão domiciliar, monitorados por tornozeleira eletrônica (nas unidades de Corinto, Botelhos, São Joaquim de Bicas II, na cidade de mesmo nome e Jacy de Assis, em Uberlândia).

Quatro detentos permanecem no presídio de Corinto, um no Presídio de Curvelo e dois no Centro de Remanejamento do Sistema Prisional Gameleira (Ceresp Gameleira). Eles estão sendo acompanhados pela área de saúde das unidades. As alas em que se encontram foram isoladas, desinfectadas e todos os demais detentos usam máscaras de forma preventiva.

Os dados de detentos liberados para o regime domiciliar, durante a pandemia, estão em consolidação. Vale ressaltar que as decisões sobre possíveis liberações de detentos que se enquadram na Portaria 19 são realizadas de forma pontual e criteriosa por cada juiz das Varas de Execuções Penais do Estado. Ao Departamento Penitenciário, cabe apenas executar a decisão judicial.

O Departamento Penitenciário de Minas Gerais (Depen-MG) não divulga o total de servidores afastados pela Covid-19, por questões de segurança, e também porque o número não impacta na prestação dos serviços à população.

A Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública destaca ações que estão sendo realizadas para prevenir e controlar o Coronavírus no ambiente prisional:

Unidades portas de entrada – Foi adotado um modelo pioneiro no país de circulação restrita de detentos no período de pandemia, classificado como referência pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública. Para evitar a contaminação por novos presos, foram criadas 30 unidades de referência, distribuídas em todo o território mineiro, que funcionam como centros de triagem e portas de entrada para novos custodiados do sistema prisional. Todas as pessoas presas em Minas Gerais estão sendo encaminhadas para uma unidade específica em cada região e ficam, pelo menos, 15 dias, em quarentena e observação, evitando possível contágio caso fossem encaminhadas de imediato para outras unidades. Após a observação e atestada a sua saúde, são encaminhadas para as demais unidades prisionais do Estado.

Suspensão das visitas: para evitar a disseminação do vírus por meio de contato com o público externo, as visitas foram suspensas, para diminuir a circulação de pessoas externas, assim como a entrega, até então opcional, de kits suplementares contendo alimentos, remédios entre outros itens, para evitar a circulação de materiais contaminados. Destaca-se que esses itens continuam sendo fornecidos pelas unidades prisionais e recebidos, ainda, via Correios. Todos os kits enviados por meio postal são inspecionados, por questões de segurança.

Cuidados com quem já está preso: No caso de presos que já se encontram no sistema prisional, caso apresentem sintomas da Covid-19, o protocolo é o seguinte: isolamento imediato, realização de exames e, em caso de confirmação, tratamento segundo protocolo da área da Saúde. Em todas as unidades em que há presos com Covid-19 confirmados, a desinfecção do ambiente também é imediata e todos os demais detentos passam a usar máscaras, de forma preventiva.

Evitar o contágio via profissionais de segurança: Imprescindíveis para a segurança das unidades, os profissionais estão com as escalas de trabalho dilatadas, de forma a diminuir a circulação desses servidores intra e extramuros.

Evitar a circulação de presos para realização de audiências: foram instalados equipamentos para a realização de videoconferências judiciais em todas as unidades prisionais que estão, aos poucos, se adaptando para uso dessa ferramenta. Com isso, evita-se o deslocamento da maioria dos presos para o ambiente extramuros e diminui-se o risco de contágio pelo Coronavírus.

Contato com as famílias: com a suspensão das visitas, necessárias para contenção do vírus, os familiares podem ter contato com seus parentes de três formas: por meio de cartas (ação prevista para todas as unidades e com média de 35 mil recebimentos por semana), ligações telefônicas (cujo número é diferente em cada unidade e deve ser fornecido pelo presídio ou penitenciária; a média semanal é de 15 mil ligações realizadas) ou videoconferências nas unidades em que essa tecnologia já está disponibilizada.

Limpeza geral e desinfecção de ambientes: As áreas estruturais como celas, pátios, áreas administrativas e técnicas, portarias, guaritas e, também, veículos estão passando por higienização reforçada, semanal, durante a pandemia. A ação é simultânea e sempre as terças-feiras em todas as 194 unidades do Estado .

Máscaras e EPIs: o sistema prisional está produzindo máscaras para uso nas próprias unidades e segurança de todos. Todos os servidores são obrigados a circular no interior das unidades de EPIs e, a eles, este material é fornecido sistematicamente. Os presos também utilizam máscaras quando estão com algum sintoma suspeito ou quando pertencem à alas ou pavilhões onde outro detento foi testado positivo para a doença.

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O aumento de transferências se deu em decorrência da criação das 30 unidades prisionais que passaram a funcionar como porta de entrada do sistema prisional mineiro. Esta foi uma das principais frentes de atuação da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), por meio do Departamento Penitenciário (Depen-MG), para combater a disseminação da Covid-19 no ambiente prisional – iniciativa elogiada, inclusive, pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Atualmente, cerca de 98% das transferências  realizadas no sistema prisional mineiro são para cumprir esse protocolo: ou seja, transferência do presídio porta de entrada para outro presídio ou penitenciária, após completa certeza que, vindos do ambiente extramuro, não estão contaminados. Outras transferências que não são da porta de entrada, durante a pandemia, são excepcionalidade e levam em conta questões de segurança.

Portanto, a Secretaria não só estabeleceu novos protocolos de admissão de presos, pautados em regras científicas de não circulação de pessoas de ambientes extramuros em ambientes prisionais, como está atuando totalmente em ressonância com todas as recomendações da área de saúde, adotando várias medidas como suspensão de visitas, alargamento da escala de trabalho, entre outras.

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Existe problema de abastecimento de água em toda a região onde está localizada a Penitenciária de Formiga, portanto o problema não é na unidade prisional especificamente. No entanto, não procede a informação de que os registros sejam abertos apenas nove minutos ao dia. As torneiras são abertas quatro vezes diariamente, enquanto durar o recurso hídrico. Para que os detentos se mantenham hidratados, são disponibilizadas garrafas de água nos corredores”.

Vitor Fórneas[email protected]

Repórter do BHAZ de maio de 2017 a dezembro de 2021. Jornalista graduado pelo UniBH (Centro Universitário de Belo Horizonte) e com atuação focada nas editorias de Cidades e Política. Teve reportagens agraciadas nos prêmios CDL (2018, 2019 e 2020), Sebrae (2021) e Claudio Weber Abramo de Jornalismo de Dados (2021).

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