Black Lives Matter… Mas por que não no Brasil?

Sub-representatividade, altos índices de violência e desemprego, diferenças salariais significativas, falta de acesso e oportunidades marcam a vida da segunda maior população negra no mundo (@sergiodireita1/@DarrenEuronews/Twitter/Reprodução)

Por Rodolpho Barreto Sampaio Júnior*

Ao cantar que “a carne mais barata do mercado é a carne negra”, Elza Soares expõe o racismo estrutural da sociedade brasileira. Mais de três décadas após a Constituição da República registrar seu repúdio ao racismo e considerá-lo crime inafiançável e imprescritível, a população negra ainda sente em seu cotidiano as chagas da escravidão.

Sub-representatividade, altos índices de violência e desemprego, diferenças salariais significativas, falta de acesso e oportunidades marcam a vida da segunda maior população negra no mundo.

No país em que o mito da democracia racial ainda é levado a sério, em que o presidente da instituição destinada à proteção da cultura negra cria o selo “não é racista” e chama de “escória maldita” os integrantes do movimento negro, em que crianças negras são assassinadas pela polícia e em que os jovens negros sofrem os efeitos de uma irrefletida política de superencarceramento, o gatilho para os protestos da sociedade brasileira foi a morte de um norte-americano.

A indignação que percorreu o mundo após o assassinato de George Floyd é mais do que compreensível. Afinal, como pode-se admitir que um policial, em plena luz do dia, cercado por colegas de farda, fique ajoelhado sobre o pescoço de um suspeito já rendido e algemado, por quase dez minutos, ignorando seus lamentos?

No entanto, por mais que se compreenda os motivos que levaram os brasileiros a se engajar e a apoiar o movimento Black Lives Matter, é necessário investigar por que a brutalidade policial e o racismo nos Estados Unidos provocaram a reação da sociedade brasileira que, no entanto, não se comove nem com o músico negro metralhado pelos soldados do exército, nem com o adolescente negro alvejado pela polícia civil nem com o garoto negro enviado à morte pela patroa que estava muito ocupada para cuidar do filho de sua empregada.

Ágatha, João Pedro, Amarildo, Jenifer, Kauã; nomes que surgem nos noticiários e somem logo depois, sem causar maior incômodo à população branca que, em grande parte, acredita que não há racismo no Brasil… Mas que, estranhamento, protesta em suas redes sociais contra o racismo nos Estados Unidos …

A intensa mobilização da sociedade norte-americana já deu frutos: reacendeu o debate sobre o racismo, acarretou a proibição do uso de técnicas de enforcamento em algumas unidades policiais e levantou a questão da reestruturação de departamentos de polícia.

No Brasil, pouco se viu. Tivemos algumas manifestações repudiando o racismo, mas que não conseguiram mobilizar a opinião pública. Retomou-se o debate sobre as homenagens em locais públicos para personalidades com um passado controvertido. Mas, aparentemente, as coisas voltam à situação de sempre: uma normalidade hipócrita, em que as tensões raciais são apagadas ou escondidas. E não por falta de mártires: não nos faltam Floyds; nós os temos até demais.

Infelizmente, por aqui, as vidas negras pouco importam. Como diz a música, a carne negra continua sendo a carne mais barata do mercado…

Rodolpho Barreto Sampaio Júnior[email protected]

Rodolpho Barreto Sampaio Júnior é doutor em direito civil, professor universitário, Diretor Científico da ABDC – Academia Brasileira de Direito Civil e associado ao IAMG – Instituto dos Advogados de Minas Gerais. Foi presidente da Comissão de Direito Civil da OAB/MG. Apresentador do podcast “O direito ao Avesso”.

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