Depois de cutucar o STF com vara curta, Bolsonaro parou de piar errado

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Bolsonaro dá comida a emas no Palácio da Alvorada (@jairmessias.bolsonaro/Facebook/Reprodução)

Pelo menos por enquanto, o presidente Bolsonaro recolheu as armas e já não faz mais ameaças como aquelas que alimentam arroubos autoritários de seus seguidores. Quem já disse, durante atos antidemocráticos de aliados, “acabou, porra!”, “não tem mais conversa”, “chega de interferência”, “acabou a paciência”, agora não diz mais nada.

Entre um estilo e outro, várias derrotas no Supremo Tribunal Federal (STF) chacoalharam a república bolsonarista. Ministros do STF investigam a rede de fake News, em favor dele, que ganhou o sugestivo nome de ‘gabinete do ódio”. E mais, apuram se o presidente interferiu politicamente na Polícia Federal para impedir investigações contra os próprios filhos, amigos como o ex-assessor Fabrício Queiroz.

“Vou trocar o superintendente da PF do Rio, se não puder, troco o ministro”, esbravejou ele naquela amaldiçoada e última reunião ministerial do dia 22 de abril. De lá pra cá, dois ministros já caíram após os efeitos dela e, pelo menos, outro está ameaçado pela mesma razão.

‘Ainda há juízes em Brasília’

Dois ministros do STF, Celso de Mello e Alexandre de Moraes, resgataram o conto “O Moleiro de Sans-Souci” (François Andriex, 1759-1833) para dizer que aquilo que muitos esquecem. “Ainda há juízes em Berlim!”, foi a advertência do moleiro, que, agora, no tempo e espaço, recai sobre Brasília.

Um terceiro ministro da mesma corte vem e dá outra chacoalhada ao dizer que “até o Exército se associou a um genocídio”. A grave, exagerada e até generalizante crítica foi feita por Gilmar Mendes, fora dos autos e da curva, ao criticar a falta de um ministro da área na saúde em plena pandemia. Em vez disso, quem está lá é um general da ativa do Exército. Daí a associação feita.

Houve ranger de dentes na caserna, cobrança de retaliação e de desculpas públicas. A poeira baixou na sequência e os tigres de papel pararam de rugir. Quando se manifestou, Bolsonaro assumiu mais a condição de bombeiro dizendo que a crise estava superada com a divulgação de nota de repúdio por seu ministro da Defesa. Disse que “crítica construtiva é bem-vinda” e que considerou o assunto encerrado.

Saúde não é um lugar de militar

Gilmar Mendes pegou pesado mesmo, mas disse o que todos gostariam de dizer. Apesar dos melindres, o Brasil é o segundo país do mundo em casos e mortes (80 mil) na pandemia do coronavírus. Isso, sim, deveria ser motivo de indignação das Forças Armadas. A matança da Covid-19 é por conta do ministro interino da Saúde, Eduardo Pazuello? Não, ele não deveria estar ali. Não basta ser bom técnico em gestão, como elogia Bolsonaro, é necessário ser do ramo.

A crítica do ministro provocou duas reações. Para o público externo, a cúpula militar rechaçou e até fez representação contra ele na Procuradoria-Geral da República. Internamente, integrantes do Exército ficaram incomodados com a responsabilização. Por isso, renovaram as pressões para que Pazuello seja substituído no cargo ou vá para a reserva, como fez o ministro Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo.

Assim, o Exército não teria essa responsabilidade nas costas. Hoje, ele é o único general da ativa no governo, mas não quer ir para a reserva. Então, terá que, neste ou no próximo mês, deixar o Ministério.

Um ‘fica’ sem muita convicção

Na quinta, Bolsonaro afirmou que “crítica construtiva é bem-vinda” e que, com a nota do Ministério da Defesa, considera o assunto encerrado. Ainda chamou de “excepcional” o ministro da Saúde e questionou se era proibido militar na política. Até que não, tanto é que ele está nela há mais de 30 anos e até virou presidente; seu vice também é um general.

Mas militar no comando do Ministério da Saúde deveria ser impedido, sim, e numa pandemia, até proibido para responder ao argumento distorcido do presidente. Para completar o desastre, o interino levou consigo outros 15 militares para auxiliá-lo na pasta da Saúde.

Na mesma live (quinta, 16), Bolsonaro disse que, além de Pazuello, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, também continuaria no cargo apesar das pressões. Isso é um mau sinal para os dois ministros, quando um presidente precisa dizer que eles continuarão no cargo, é porque já estão é no telhado.

Recuo ante o vírus que desafiava

De alguma forma, após a crítica, o ministério da Saúde começou a se mexer. Tanto é que o Ministério da Saúde liberou quase R$ 5 bilhões em um único dia, na última quarta (15). O repasse aconteceu após o confronto. Pazuello disse que soltaria o restante do total de R$ 13,8 bi até o mês que vem.

Além dos ministros do STF, o vírus da Covid-19, tantas vezes humilhado e desafiado pelo presidente, o infectou, deixando-o mais vulnerável e acuado. As consecutivas derrotas fizeram Bolsonaro recuar, mas não deverá demorar muito porque Bolsonaro é Bolsonaro e ele não dá conta de governar. Por isso, prefere os confrontos.

Orion Teixeira[email protected]

Jornalista político, Orion Teixeira recorre à sua experiência, que inclui seis eleições presidenciais, seis estaduais e seis eleições municipais, e à cobertura do dia a dia para contar o que pensam e fazem os políticos, como agem, por que e pra quem.

É também autor do blog que leva seu nome (www.blogdoorion.com.br), comentarista político da TV Band Minas e da rádio Band News BH e apresentador do programa Pensamento Jurídico das TVs Justiça e Comunitária.

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