Acostumados a um estilo de vida pacato, moradores da pequena cidade de Bandeira, no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, viram o município alcançar o topo da lista de localidades com maior incidência de casos do novo coronavírus em todo o estado. Por lá, o número de infectados saltou de um para 198 no intervalo de apenas um mês.
Bandeira tem a população aproximada de 4,7 mil pessoas, de acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), atualizados em 2019. A SES-MG (Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais) reconhece que a cidade passa por um surto da doença, com um aumento repentino de casos e monitora a situação.
Alto índice
Para calcular a incidência do novo coronavírus é feito um cálculo do índice de contaminados a cada 100 mil habitantes. O objetivo da taxa por cem mil é garantir que a comparação entre municípios pequenos e grandes seja proporcional. Por exemplo, BH, até ontem (29), era a cidade com o maior número de casos de Covid-19, com um total de 17.237 infectados. No entanto, por ter uma população maior, o índice de contaminados é de 686 a cada 100 mil habitantes.
Dentro desta fórmula, Bandeira chega, atualmente, ao topo da lista. É como se, na cidade, 4.129 mil pessoas estivessem infectadas a cada 100 mil habitantes. A proporção é de que, a cada 100 moradores de Bandeira, quatro estão infectados pela doença.
Na tabela abaixo estão as 10 cidades com maior índice de contaminação por 100 mil habitantes em Minas Gerais:
Cidade | População | Casos confirmados | Casos por 100 mil/h |
Bandeira | 4.795 | 198 | 4.129 |
Santana do Paraíso | 34.663 | 1.235 | 3.563 |
Alvarenga | 3.907 | 114 | 2.918 |
Chiador | 2.687 | 77 | 2.866 |
Conceição do Mato Dentro | 17.842 | 429 | 2.404 |
Santa Juliana | 14.003 | 324 | 2.314 |
Extrema | 36.225 | 826 | 2.280 |
Itapeva | 9.783 | 210 | 2.147 |
Ipatinga | 263.410 | 5.453 | 2.070 |
Doresópolis | 1.527 | 31 | 2.030 |
A prefeitura de Bandeira credita o surto de Covid-19 à empresa de energia Tabocas, que tem sede na cidade. Segundo prefeito, Antônio Rodrigues (partido), cerca de 70% do total de casos do município são funcionários da instituição. Ou seja, dos 198 infectados na cidade, 136 trabalham na companhia de energia.
Outra questão apontada por Antônio é a vinda de infectados da Bahia, estado onde a Tabocas também tem sede, para Minas Gerais. “Alguns casos são de pessoas que vieram do Nordeste, vieram de cidades vizinhas, na Bahia e empresa não conseguiu manter controle, provocando esse surto”, diz o prefeito.
Explosão de casos
Bandeira registrou o primeiro caso de Covid-19 no dia 20 de junho e manteve apenas um registro até o dia 26 daquele mês. “A situação estava sob controle. Nós fizemos um decreto no dia 17 de março restringindo o funcionamento do comércio, determinando o uso obrigatório de máscara, o isolamento social, o uso de álcool gel etc. Tanto que só fomos ter o primeiro caso em junho”, explica o chefe do Executivo.
A explosão de casos ocorreu quando o prefeitura ampliou a testagem nas duas principais empresas de energia da cidade, dentre elas a Tabocas, que, segundo ele, conta com mais de 300 funcionários.
“Fizemos testes em 258 funcionários da empresa e 136 deram positivos. Deu pra ver nitidamente que eles não conseguiram manter o controle da situação. Desde o início, a prefeitura vem cobrando medidas. Conforme os resultados dos testes foram saindo, o número de casos foi só aumentado, saiu do controle”, diz.
O gráfico de casos mostra a explosão no número de casos na cidade a partir do dia 26 de junho, quando, em apenas 24h, a cidade registrou 50 novo infectados. O maior salto foi registrado entre os dias 10 e 11 do mesmo mês, quando a alta foi de 111 caos em um dia. Confira:
“Isso deixou população em pânico. Após essa situação, nós acionamos o MPT (Ministério Público do Trabalho) e suspendemos o funcionamento da Tabocas por 14 dias e solicitamos a testagem em massa dos funcionários e familiares que tiveram contato com os infectados. Foram mais de 900 testes em todo o município”, afirma o prefeito.
Surto
Procurada, a SES-MG afirma que monitora e considera o caso de Bandeira como um surto de Covid-19, que são quadros de disseminação da doença com números crescentes em pouco período de tempo concentrados apenas em uma região. Até o momento, Minas já registrou 245 surtos confirmados e tem ainda 82 em investigação.
“As medidas mais importantes em um surto são: fazer o isolamento adequado dos casos sintomáticos e os contatos destes e realizar o teste para confirmação. Além disso, nas situações mais críticas, ou quando solicitado pelo município uma equipe técnica da SES/MG desloca-se para o município para auxiliar de forma presencial na tomada de medidas necessárias para a contenção do surto. O mais importante nas medidas é impedir a disseminação dos casos para a comunidade”, disse a secretara de Saúde.
Casos importados
Ainda de acordo com o prefeito de Bandeira, parte dos infectados da empresa Tabocas são residentes da Bahia, estado vizinho, mas acabaram sendo registrados como casos da cidade. “O cara mora lá, e quando testa positivo, jogam no sistema de cá. É um problema grava na comunicação entre os estados e o Governo Federal”.
Questionado sobre isso, a SES-MG afirmou que “não há barreiras sanitárias no estado”, mas que existem “orientações para os empregadores que contratam trabalhadores que residem em outras cidades e estados”.
Sem retorno
O BHAZ tentou contato com a empresa Tabocas para comentar a situação dos funcionários infectados. O primeiro contato foi feito por telefone na terça (28) e os responsáveis ficaram de retornar por e-mail. No entanto, a empresa não respondeu às perguntas e nem ao pedido de retorno. Caso a Tabocas responda ou se posicione, o texto será atualizado.