Governo de MG não tem equipes para operar respiradores e admite ‘improviso’

Minas tem mais equipamentos do que profissionais para operá-los (Pedro Gontijo/Imprensa MG + Amanda Dias/BHAZ)

Minas Gerais tem mais equipamentos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do que equipes médicas necessárias para colocar os aparelhos em funcionamento. A própria SES-MG (Secretaria de Estado de Saúde) admite que a falta de profissionais dificulta a abertura de novos leitos e que é preciso improvisar (leia mais abaixo). Enquanto isso, o governo segue adquirindo respiradores o que, para um especialista ouvido pelo BHAZ, cria uma “falsa segurança”.

“Só o respirador não salva vidas, é preciso ter profissionais qualificados para operar, senão não adianta nada”, afirma o médico intensivista, pneumologista e diretor jurídico do Sinmed-MG (Sindicato dos Médicos de Minas Gerais), Maurício Meireles Goes.  

De acordo com informações da SES-MG, o estado tem, atualmente, 3.801 leitos e 66 intensivistas, especialista indicado para esse tipo de unidade de saúde. São 51 trabalhadores efetivos da rede Fhemig (Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais) e 15 contratados. Em média, são 57 leitos para cada médico, quando o ideal, segundo especialistas, é de apenas 10.

De acordo com a SES-MG, o estado segue à procura de mais profissionais, mas sem sucesso. “A dificuldade de contratação de médicos especialistas em UTI realmente tem atrasado a expansão das unidades de terapia intensiva para o enfrentamento da Covid-19 em hospitais da Fhemig”, diz a SES-MG.

“A fundação tem feito sucessivos chamamentos emergenciais para contratação desses profissionais e, mesmo oferecendo uma remuneração compatível com a do mercado, poucos candidatos preenchem os requisitos necessários”, acrescenta a secretaria.

Equipamentos podem ficar parados

Na última sexta-feira (14), o governador do estado, Romeu Zema (Novo), anunciou mais 1,6 mil respiradores que foram doados pela empresa Tacom, em parceria com a FIEMG. Antes disso, o estado já havia adquirido 1.047 equipamentos e recebido outros 343 do Ministério da Saúde. Com isso, são 2.990 aparelhos.

Mesmo com gargalo de equipe médica, governador segue anunciando novos respiradores
(Gil Leonardi/Imprensa MG)

Para operar o leito, cada unidade de saúde para pacientes graves precisa, em um turno de 12h, de um coordenador de UTI, um intensivista horizontal, que cuida dos protocolos, um enfermeiro, um fisioterapeuta e, para cada dois leitos, um técnico em enfermagem.

Para o médico Maurício Meireles, sem a contratação de pessoal adequado, caso a pandemia se agrave, os respiradores não serão suficientes e poderemos enfrentar a crise com os aparelhos parados.

“As autoridades acham que é só pôr o respirador para funcionar, e não é assim. É preciso de equipe treinada, com conduta e protocolo para abrir o leito, senão o aparelho fica lá parado. Estamos em estado de platô, sem um risco de colapso, mas não podemos baixar a guarda, senão as pessoas podem começar a morrer por falta de assistência, como vimos no Amazonas, por exemplo”, diz o médico.

Ainda de acordo com Maurício, o Estado deveria ter pensado primeiro na contratação dos profissionais. “A demanda no limite, e não tem como criar intensivistas de uma hora para outra. É uma especialidade que exige, além da faculdade, mas dois anos de especialização. Foi o que ocorreu com o hospital de campanha. Abriram uma grande estrutura e não conseguiram intensivistas para atura nos leitos de transição”, explica

Sobrecarga e medo

Com a falta dos profissionais, a situação na linha de frente do combate à Covid-19 acaba sobrecarregando os profissionais que já atuam no serviço de assistência, não só para os intensivistas, mas também para os outros profissionais que operam uma UTI, como o caso dos enfermeiros, que são responsáveis por monitorar os pacientes e acionar os médicos em necessidade de intervenção.

Segundo o presidente do SEEMG (Sindicato dos Enfermeiros de Minas Gerais), Anderson Rodrigues, que é enfermeiro intensivista, a situação já era crítica e piorou após o início da pandemia.

Profissionais relatam sobrecarga no trabalho (Amanda Dias/BHAZ)

“Já existia uma sobrecarga, agora, isso está de maneira até mais acirrada. Existam trabalhadores fazendo dobra [plantões de 24h] dentro das unidades de saúde, isso é prejudicial tanto para o profissional quanto para o paciente”, conta.

Ele diz ainda que os trabalhadores estão com medo de denunciar a falta de profissionais e o excesso de trabalho. “Existe o medo de perder o emprego ou ser perseguido. Mas, é importante ressaltar que essas pessoas precisam denunciar, para que a gente lute por condições melhores”, conclui.

Improviso

A SES-MG explica que um leito de UTI exige médicos do nível III, com residência e especialização registrada no Conselho Federal de Medicina. A remuneração básica oferecida para esse tipo de profissional é no valor de R$ 9 mil, com 24 horas de trabalho semanais.

Entretanto, sem retorno para a abertura de vagas, o Estado tem improvisado. “Um procedimento adotado pelo Governo de Minas para conseguir os profissionais, é abrir o chamamento também para médicos de nível I, que têm a graduação em medicina e experiência comprovada em leitos de UTI, sem a especialização registrada. Para eles, tem sido oferecida a remuneração de R$ 7mil por 24 horas semanais”, explica a secretaria.

Improviso é necessário para que equipamentos entrem em operação
(Pedro Gontijo/Imprensa MG)

Médica especialista em gestão de saúde e diretora de operações da RCS (Rede de Cuidados em Saúde), Mariane Tarabal explica que esse modelo de contratação tem sido adotado no mercado devido ao “cenário de guerra” da pandemia.

“O profissional intensivista tem uma formação longa, o estado não teria tempo de esperar. Então, o que tem sido feito é colocado os intensivistas como coordenadores e médicos horizontais nos CTIs (Centros de Terapia Intensiva) e contratado profissionais de outras áreas, mas que tenham experiência com paciente em estado crítico, como cirurgiões, cardiologistas etc”, explica a especialista.

Mesmo com essa estratégia, a alta demanda tem esgotado também esses outros médicos. “Como o Brasil é um país continental, a Covid-19 teve picos diferentes em cada região, então houve uma corrida pelos médicos. E, agora, é o momento em que Minas passa por um período mais crítico e estão faltando esses médicos no mercado”, diz Mariane.

Ela conta que isso tem refletido na linha de frente do combate à doença. “Eu recebi a reclamação de uma profissional que está trabalhando exaustivamente fazendo plantões de 24h e 36h. Os médicos estão precisando se desdobrar, pois a demanda está alta e não estão conseguindo mais pessoas capacitadas”, finaliza.

Ocupação de leitos

De acordo com a SES-MG, no momento, Minas tem 977 pacientes internados em leitos de UTI em decorrência da covid-19 ou por suspeita da doença, e a taxa de ocupação está em 26,07%.

A taxa de ocupação geral de leitos de UTI está em 65,63% e de leitos de enfermaria está em 58,07%. Em relação aos leitos de enfermaria, são 1.666 pessoas internadas em decorrência da covid-19, ou por suspeita da doença em Minas e a taxa de ocupação está em 8,40%.

O que diz a SES-MG

“A Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) esclarece que a estratégia do estado foi ampliar leitos em unidade de saúde onde já existia a oferta do serviço de terapia intensiva. Os constantes investimentos em hospitais de estruturas permanentes serão um legado que as ações de enfrentamento à pandemia deixarão para o Sistema Único de Saúde (SUS) do Estado.

Em fevereiro, em Minas Gerais, havia 2.072 leitos de UTI, atualmente são 3.801. Minas adquiriu 1.047 respiradores para auxiliar os municípios no enfrentamento à pandemia. Outros 343 equipamentos foram enviados pelo Ministério da Saúde e recebeu doação da empresa Tacom, em parceria com a FIEMG, de 1,6 mil respiradores.

A dificuldade de contratação de médicos especialistas em UTI realmente tem atrasado a expansão das unidades de terapia intensiva para o enfrentamento da covid-19 em hospitais da Fundação Hospitalar de Minas Gerais (Fhemig). A fundação tem feito sucessivos chamamentos emergenciais para contratação desses profissionais e, mesmo oferecendo uma remuneração compatível com a do mercado, poucos candidatos preenchem os requisitos necessários.

Um leito de UTI exige profissionais com maior qualificação. A princípio, o profissional precisa ser do nível III, com graduação em medicina, residência e especialização registrada no Conselho Federal de Medicina. A remuneração básica oferecida para o médico nível III é no valor de R$ 9 mil, com 24 horas de trabalho semanais.

Um procedimento adotado pelo Governo de Minas para conseguir os profissionais, é abrir o chamamento também para médicos de nível I, que têm a graduação em medicina e experiência comprovada em leitos de UTI, sem a especialização registrada. Para eles, tem sido oferecida a remuneração de R$ 7mil por 24 horas semanais. As demais vagas oferecidas, para outras categorias profissionais, também necessárias à formação de novas equipes, são preenchidas, formando, inclusive, cadastro reserva.

Atualmente, na Rede Fhemig, são 66 profissionais médicos intensivistas atuantes; desses, 51 são efetivos e 15, contratos.

O Governo de Minas reafirma que o Hospital de Campanha foi planejado para um cenário bastante mais negativo, quando se previa uma média diária de óbitos próxima a 900. Portanto, reafirma-se que o Hcamp é uma reserva técnica, com conceito de hospital de “porta fechada”, ou seja, será utilizado apenas após deliberação da Secretaria Estadual de Saúde (SES) em caso de necessidade.

Com a ampliação de leitos, descrita acima, foi possível manter estável a taxa de ocupação geral dos leitos de UTI e de enfermaria. A taxa de ocupação geral de leitos de UTI está em 65,63% e de leitos de enfermaria está em 58,07%. No momento, são 977 pacientes internados em leitos de UTI no estado, em decorrência da covid-19 ou por suspeita da doença, e a taxa de ocupação está em 26,07%. Em relação aos leitos de enfermaria, são 1.666 pessoas internadas em decorrência da covid-19, ou por suspeita da doença em Minas e a taxa de ocupação está em 8,40%”.

Rafael D'Oliveira[email protected]

Repórter do BHAZ desde janeiro de 2017. Formado em Jornalismo e com mais de cinco anos de experiência em coberturas políticas, econômicas e da editoria de Cidades. Pós-graduando em Poder Legislativo e Políticas Públicas na Escola Legislativa.

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