‘Ele foi ficando roxo’, relata motoboy que filmou assassinato de Beto Freitas

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Motoboy contou que foi intimidado por funcionário para que parasse de filmar (Reprodução/Twitter + Arquivo pessoal/Reprodução/Facebook)

Por Paula Sperb e Mariana Grazini

Após espancarem e asfixiarem Beto Freitas, 40, em uma loja do Carrefour em Porto Alegre, funcionários da empresa passaram minutos tentando descobrir se ele estava vivo, disse à reportagem motoboy que viu funcionários tentando descobrir se o homem estava vivo.

O motoboy, que pediu para não ter seu nome publicado por temores de segurança, foi buscar compras feitas por aplicativo para entregá-las a um cliente. Depois de colocar as sacolas no bagageiro da moto, prestes a deixar o local, viu o início da sessão de espancamento.

“Eu disse para um colega, também motoboy: Grava isso. Peguei meu telefone também. Foi muito soco”, disse. Foi esse motoboy que produziu as imagens disseminadas por redes sociais e veículos de imprensa que primeiro chamaram a atenção pública para o assassinato, ainda na noite de quina (19), quando ele ocorreu.

Segundo o motoboy, ele começou a filmar com o intuito de evitar que o espancamento continuasse, como uma forma de constranger os agressores para que interrompessem os golpes. “Tinha muito sangue no chão. Avisei que estava filmando. Daí veio uma moça, que depois soube ser fiscal do Carrefour, me ameaçando. Ela disse que ia me queimar na loja se continuasse”, contou.

Depois disso, outro funcionário do supermercado intimidou o motoboy para que parasse de filmar. “Fui ficando com medo e fui baixando o telefone. Mas fui tentando explicar que tinham que parar. Começaram a me coagir e pressionar. Baixei o telefone e conversei um pouco com a fiscal”, contou.
“Ela disse: Se acalmarem ele, eu tiro todo mundo de cima dele. Mas isso não aconteceu, ela não tirou.”

O motoboy diz que, nesse momento, a fiscal do Carrefour feriu a própria mão, dizendo que Beto havia cortado seu dedo. “Ela pegou a unha dela e começou a forçar no dedo. Não tinha machucado, eu olhei bem. Me chamou atenção ela tentar machucar a própria mão”, disse.

De acordo com o entregador, Beto pedia socorro. “Me ajuda, me ajuda”, contou ter escutado. “Cheguei a me aproximar para tentar ajudar, mas os seguranças não deixaram Nem eu nem a dona Milena, que foi empurrrada. Eles não chegaram a me empurrar, mas ela, sim”, disse sobre a viúva, Milena Borges Alves.

Segundo a testemunha, nas duas vezes em que tentou se aproximar de Beto, escutou ele pedindo ajuda. “Era um som, quando pedia ajuda, como se tivesse um líquido na boca, talvez sangue. Era um som diferente, não sei explicar, não era a voz normal Ele levou muito socos na boca, o queixo dele estava cortado. Machucaram muito ele, foi desproporcional o que fizeram”, disse.

Ele conta ter escutado Milena gritar: “Vocês vão matar meu marido”. “Ela estava apavorada e começou a chorar”, disse.

O entregador conta que mais funcionários do mercado se aproximaram da cena. O que para eles parecia ser Beto se acalmando era, na verdade, ele morrendo, relata.

“Ele foi ficando roxo”, disse. “Vocês mataram ele, eu disse. Um dos funcionários perguntou se alguém sabia medir pulsação”, relata. Segundo o entregador, os funcionários passaram a tentar descobrir se Beto estava vivo.

“Medir pulsação?”, o motoboy conta que indagou revoltado. Ele escutou o outro entregador dizendo: “Ele está morto”. O motoboy disse que tentou acalmar Milena, dizendo à mulher que logo o Samu chegaria para cuidar de Beto.

Vídeos da câmera de segurança do Carrefour mostram que os seguranças asfixiaram Beto Freitas por quase quatro minutos.

O entregador diz que não consegue dormir direito desde que foi testemunha do assassianto e que ficou com medo de sofrer retaliação quando descobriu que um dos vigilantes também era policial.

O motoboy afirma que não escutou ofensas racistas a Beto, mas que concorda que existe racismo estrutural e cita um exemplo ocorrido no mesmo Carrefour:

“Um dia estava fazendo entrega ali e vi um garoto sendo acompanhado para fora pelos vigias. Perguntei para ele o que tinha acontecido. ‘Nada. Me disseram que eu estava demorando demais e me mandaram sair’. Ele não estava arrumado, era vendedor ambulante e aproveitou um trocado para comer pão de queijo e tomar café”.

Carrefour: R$ 25 milhões contra racismo

O Carrefour Brasil anunciou nesta segunda-feira (23) que vai criar um fundo para promoção da inclusão racial e combate ao racismo no país.
O fundo terá aporte inicial de R$ 25 milhões.

“O Grupo Carrefour Brasil está fortemente comprometido em lutar pelo combate ao racismo estrutural no país e promover ações afirmativas para a inclusão social e econômica de negros e negras na sociedade”, informou a companhia.

O anúncio ocorre após a morte de João Alberto Silveira Freitas, homem negro de 40 anos, assassinado por dois seguranças da rede de supermercados Carrefour em uma unidade localizada em Porto Alegre.

“Sabemos que não podemos reparar a perda da vida do senhor João Alberto. Este movimento é o primeiro passo da empresa para que o combate ao preconceito e racismo estrutural, que é urgente no Brasil, ganhe ainda mais força e apoio da sociedade. Acreditamos que poderemos evoluir e contribuir para a construção de uma sociedade mais inclusiva e igualitária”, afirmou em nota Noël Prioux, CEO do Grupo Carrefour Brasil.

A empresa afirmou ainda que nos últimos dias tem se reunido com especialistas e entidades representativas da causa para compreender e aprender sobre como atuar de forma concreta na luta contra discriminação, incluindo outros públicos além da população negra.

“A partir das reivindicações, a empresa anunciará na quarta-feira, 25 de novembro, os compromissos e o plano de ação do trabalho, que nortearão este fundo. As iniciativas compreenderão ações internas e projetos de âmbito externo, visando promover ações que envolvam seus milhares de colaboradores e também seus públicos externos”, informou a rede.

Folhapress

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