Milton, Elza e Gilberto: Grandes nomes excluídos da Fundação Palmares

Milton, Elza e Gilberto
Decisão da Fundação Palmares foi liberada nessa quarta-feira (2) e gerou debate (Reprodução/@miltonbitucanascimento/@elzasoaresoficial/Instagram)

Nessa quarta-feira (2), a Fundação Palmares divulgou uma série de nomes que foram excluídos da Lista de Personalidades Negras que eram homenageadas pelo órgão. A exclusão causou espanto, por conta dos nomes de peso que foram retirados, como o de Elza Soares, Milton Nascimento e Gilberto Gil. A justificativa para a mudança, dada pelo presidente da fundação, Sérgio Camargo, foi de que a lista passará a fazer homenagens póstumas.

Vinte e sete nomes foram divulgados pela Fundação Palmares, e entre eles estão personalidades negras que trouxeram grande representatividade para o movimento negro. Nomes como Benedita da Silva, Conceição Evaristo e Martinho da Vila também foram excluídos, bem como outros grandes da política, da cultura, do atletismo e intelectuais. Alguns dos ex-homenageados pela fundação se pronunciaram sobre a mudança.

“Não deixo te ter feito as coisas que fiz. Com ou sem homenagem continuarei a ter a minha história, me tiraram da lista, mas não tiraram minha história. Tomara que eu volte para a lista, mas não vou poder presenciar. É desnecessário, dá para homenagear todo mundo. Caberia todo mundo”, disse Terezinha Guilhermina, que é dona de oito medalhas paralímpicas, com dois ouros nos 200 metros rasos, em Pequim-2008 e Londres-2012.

Ádria Santos lamenta exclusão

Ádria Santos, que acumulou 13 medalhas paralímpicas durante a carreira, incluindo três ouros nos 100 metros rasos, também se demonstrou incomodada com a exclusão. “Fico triste, foi uma homenagem pelo meu feito no esporte. Excluir é uma palavra tão forte. Fiquei surpresa e ao mesmo tempo triste com isso. Acho que as pessoas estavam lá por mérito, como eu, por representar o país, por tudo que fiz”, lamentou.

“Tudo isso só confirma que o nosso país não consegue valorizar o que nós atletas e outras pessoas fazem pelo Brasil. É triste, mas a gente respeita”, falou Janeth Arcain. Ela é uma das grandes referências do basquete brasileiro, sendo campeã mundial em 1994, e conquistou duas medalhas olímpicas. Já o ex-boxeador Servílio de Oliveira, que conquistou uma medalha de bronze nos Jogos de 1968, no México, disse acreditar que tal medida está ligada à polarização do país.

‘Homenagem é fruto das coisas boas’

No Twitter, Sérgio Camargo, o presidente da fundação, disse que “é certo que alguns voltarão um dia, mas a maioria não”. Camargo reiterou que a Fundação Palmares agora fará “homenagens póstumas a quem tem valor”. Um dia depois, nessa quinta-feira (3), o representante do órgão adicionou outros nomes à lista, sendo o de Mussum, Negão do Bope, Pixinguinha, Jacira Sampaio, Wilson Simonal, Marcílio Pinto, João do Pulo e Luiz Melodia.

A medida de Camargo também teve repercussão no Senado, onde se debate medida para barrar a decisão na Palmares. O presidente da fundação também rebateu, em seu perfil no Twitter, a tentativa do Senado de impedir a mudança. Confira alguns dos tuítes feitos por Sérgio:

Milton Nascimento, Elza Soares e Gilberto Gil

Ao BHAZ, o doutorando em psicologia na Universidade Federal de Pernambuco Bruno Vieira disse que a exclusão desses nomes é uma negação da existência da cultura brasileira. “Como é que você vai pensar uma cultura brasileira – e aí eu não estou falando necessariamente progressista ou conservadora – mas uma cultura negra, que você não consiga pensar num nome como Milton Nascimento?”. O cantor é reconhecido mundialmente como um dos mais influentes do MPB.

“É uma pessoa que tem cinquenta anos de trajetória artística e cultural nesse país, e que você simplesmente tira desse lugar de importância, você está realmente desrespeitando a memória de um país”, pontou Bruno. O pesquisador em ativismo juvenil disse que tirar o nome de pessoas como Milton Nascimento, Elza Soares e Gilberto Gil da lista é, além de desrespeitar, não considerar a memória cultural do Brasil.

Essa modificação na lista, para Bruno Vieira, significa a continuidade do apagamento das referências e das memórias negras no Brasil. “E o pior dessa situação, é que é um apagamento promovido por uma instituição que justamente deveria enfrentar esse apagamento”, disse Bruno. Os 27 nomes retirados da Lista de Personalidades da Fundação Palmares vem representando, ao longo dos anos, a comunidade negra em espaços que são historicamente ocupados por pessoas brancas.

“Esse apagamento significa um desrespeito a memória negra e significa, inclusive, um desrespeito a própria memória da Fundação Palmares”, reiterou Bruno. A fundação foi criada para a promoção e preservação dos valores culturais, históricos, sociais e econômicos decorrentes da influência negra na formação da sociedade brasileira. “Sempre tem alguém para dar uma rasteira e voltar eles para o seu lugar, e que lugar seria esse? O lugar de subalternidade. A gente não vai recuar não”, completou o doutorando.

Personalidades negras excluídas

Ádria Santos (atleta)
Alaíde Costa (cantora e compositora)
Benedita da Silva (deputada federal, PT-RJ)
Conceição Evaristo (escritora)
Elza Soares (cantora)
Gilberto Gil (compositor e cantor)
Givânia Maria da Silva (educadora)
Janete Rocha Pietá (arquiteta e política)
Janeth dos Santos Arcain (esportista)
Joaquim Carvalho Cruz (atleta)
Jurema da Silva (política)
Léa Lucas Garcia de Aguiar (atriz)
Leci Brandão (cantora)
Luislinda Valois (jurista e política)
Marina Silva (política)
Martinho da Vila (cantor e compositor)
Milton Nascimento (cantor e compositor)
Paulo Paim (senador, PT-RS)
Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva (pesquisadora)
Servílio de Oliveira (sindicalista e político)
Sueli Carneiro (filósofa e escritora)
Terezinha Guilhermina (atleta)
Vanderlei Cordeiro de Lima (atleta)
Vovô do Ilê (fundador do primeiro bloco afro da Bahia)
Zezé Motta (atriz e cantora)

Com FolhaPress

Edição: Roberth Costa
Andreza Miranda[email protected]

Graduada em Jornalismo pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e repórter do BHAZ desde 2020. Participou de duas reportagens premiadas pela CDL/BH (2021 e 2022); de reportagem do projeto MonitorA, vencedor do Prêmio Cláudio Weber Abramo (2021); e de duas reportagens premiadas pelo Sebrae Minas (2021 e 2023).

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