Vereador bolsonarista corre risco de cassação por suposta fraude da sigla

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Nikolas Ferreira pode ser punido por suposta fraude do partido (Reprodução/@nikolas_dm/Twitter + Google Street View)

Dois vereadores de Belo Horizonte correm risco de cassação de mandato. Nikolas Ferreira (PRTB), o segundo vereador mais votado na última eleição na capital, que exibiu um fuzil de “presente de Natal” e foi recentemente eleito vice-presidente da Comissão dos Direitos Humanos da CMBH (Câmara Municipal de Belo Horizonte), e Wesley Autoescola (PROS), que cumpre o segundo mandato.

A ação tramita na Justiça Eleitoral e envolve a chapa dos dois legisladores. O PRTB (Partido Renovador Trabalhista Brasileiro) e o PROS (Partido Republicano da Ordem Social) estão sendo investigados por possíveis fraudes nas cotas de gênero. Segundo a lei eleitoral brasileira, pelo menos 30% das candidaturas dos partidos devem ser destinadas a mulheres.

De acordo com a denúncia, para ocupar a cota mínima de mulheres, os dois partidos em questão utilizaram-se de candidatas “laranja”, ou seja, candidatas de fachada, que não tinham intenção de concorrer ao cargo. Isso torna a chapa não elegível. Procurados pelo BHAZ, os partidos e os envolvidos negam fraude e demonstram otimismo na manutenção das chapas.

No entanto, se constar que houve de fato a irregularidade, o registro de toda a chapa deve ser cassado, junto com os votos recebidos pelo partido. Desta forma, quem foi eleito pela chapa perde o mandato. Isso afetaria o único vereador que garantiu uma cadeira pelo PRTB, Nikolas Ferreira, e o único político municipal eleito pelo PROS, Wesley Autoescola.

Desta forma, outros dois candidatos entrariam para o legislativo municipal. “Quando os votos são anulados, faz-se um novo cálculo do quociente eleitoral, partidário, aí tem uma nova distribuição das cadeiras. Se as duas chapas forem cassadas, entrariam a Professora Nara (Rede) e o Edmar Branco (PSB)”, explica ao BHAZ Nicole Gondim, advogada responsável por uma das ações.

Sem voto

O PSOL, Rede, PSB, e o ex-vereador Edmar Branco (PSB) entraram, separadamente, com o processo de investigação. Os partidos acreditam que o caso tem evidências suficientes para a comprovação da fraude. As provas apresentadas no processo incluem a ausência de votos, a ausência de arrecadação, a ausência de gastos e a ausência de campanha eleitoral, além de vínculo familiar.

“São dois casos. No do PRTB, as seis candidatas menos votadas foram mulheres. Quatro delas tiveram menos de seis votos. Dentre essas, uma não teve nenhum voto. Além disso, não declararam nenhum gasto eleitoral, despesa, arrecadação. A prestação de contas está totalmente zerada e também, por fim, não tem nenhum indício de realização de campanha eleitoral por parte delas. Não se consegue achar nenhuma propaganda delas na internet”, explica Nicole Gondim.

Campanha para rival

A defensora continua e aponta outro indício: promover a campanha de um concorrente. “No Facebook delas, em vez de fazerem campanhas pra elas mesmas, elas fizeram campanha para outro candidato do PRTB, o Alex Gasparzinho. E elas fizeram campanha pra ele desde julho. Quando ele se lançou pré-candidato a vereador, elas já colocaram o ícone dele na foto de perfil delas. Quando lançou a campanha oficialmente, declararam voto”.

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Candidatas fizeram campanha para outra pessoa do partido (Reprodução/Redes sociais)

“Elas aparecem na página dele tanto fazendo comentários, quanto em fotos e vídeos da campanha, fazendo propaganda para eles, participando do ato de campanha deles com panfleto em mãos, dando depoimento de por que apoiavam. Muitos elementos delas fazendo campanha pra outros candidatos”, relata a advogada Nicole Gondim.

Já no caso do PROS, as nove candidatas menos votadas são mulheres – e, dessas, uma com nem sequer um voto e três com apenas dois votos. “Essa quantidade irrisória, novamente, demonstra que a candidata não fez campanha, não teve intenção de ganhar a disputa”, explica a defensora responsável pela ação. “No momento que eu entrei com a ação, elas também estavam com a prestação de contas zeradas. Depois, até jogaram na prestação de contas gerais uma doação que elas teriam recebido de R$ 200, só que todas com o mesmo valor e do mesmo doador, o que é suspeito”.

Candidata fez campanha para Wesley
Candidata fez campanha para Wesley (PROS), vereador reeleito (Reprodução/Redes sociais)

Assim como no caso do PRTB, em que algumas candidatas fizeram campanha para um concorrente, no PROS também foi identificado a mesma incoerência. “Duas candidatas colocaram o ícone do Wesley Autoescola na foto de perfil dela. E não achei, em nenhuma dessas oito candidatas, qualquer indicativo de campanha, nada”.

Em família

Por fim, a responsável por mover um dos processos aponta outro indício: candidatas com parentesco direto com assessores do gabinete de Wesley Autoescola. “Uma candidata é esposa do assessor parlamentar dele. Outra candidata é irmã de um outro assessor parlamentar dele. Tem uma terceira que é parente de um atendente parlamentar do gabinete dele”, finaliza Nicole Gondim.

Indícios contundentes?

Mas todos esses indícios apontados pela advogada responsável por um dos processos realmente têm força para, de fato, cassar as chapas? Sim, segundo o advogado Felipe Gallo da Franca, membro da Comissão de Direito Municipal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e mestre em Direito Político pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).

“Recentemente, tanto o TSE, quanto o TRE de Minas, começaram a discutir exatamente isso, o que seria um padrão de potencial fraude das cotas das mulheres nas eleições. Na última resolução, número 23.610, de dezembro de 2019, já se coloca alguns parâmetros que estabelecem essa potencial fraude”, explica ao BHAZ.

E quais seriam esses parâmetros? “Se você está montando uma chapa eleitoral e coloca a foto de Facebook ou da rede social para ser a foto de urna, por exemplo. Se a candidata mulher não tem gasto, ou não faz atos de campanha com o dinheiro. Receber nenhum voto também é muito comum de se ver e descobre que nas redes sociais está fazendo campanha pra outro candidato, geralmente do sexo masculino”, enumera o especialista.

No entanto, Franca pondera que outros pontos listados no processo, isolados, não são garantia de evidência, tais quais pequena quantidade de votos ou vínculo familiar. “É possível que tenha sido realizada uma campanha, mas sucesso eleitoral, no caso de poucos votos. Mas se estiver junto com outros indícios, como ausência de campanha ou mesmo realização de campanha para um homem, ganha peso”, explica.

“Muitas vezes a mulher está lá, como candidata, para cumprir a formalidade. Essa cota não é mera formalidade, mas de fato um meio de participação das mulheres na politica”.

As chapas serão cassadas?

“Tudo isso precisa ser provado dentro de um processo. As provas entram em um bojo subjetivo que o juiz também tem que acatar e escutar a outra parte, o acusado”, afirma o advogado Felipe Gallo da Franca, ao explicar, de forma genérica, as etapas para uma chapa ser cassada. O integrante da Comissão de Direito Municipal da OAB complementa ao dizer que uma nova linha da Justiça Eleitoral pode culminar nessa punição.

“A cassação do registro da chapa é um entendimento recente do TSE. A fraude nas cotas, antes, você retirava aqueles votos computados pela aquela candidata em questão. Recentemente, houve uma mudança no TSE que entendeu que isso cassa o registro de toda a chapa. Ela compromete toda a chapa. Não apenas uma candidata. Dessa forma, todos os eleitos pelo partido têm risco de perder o mandato”.

A advogada do caso Nicole Gondim reforça esse movimento do TSE. “A tendência da Justiça agora é ser bem rigorosa com as cotas de gênero, que existem há quase 30 anos e até hoje os partidos fraudam. A Justiça Eleitoral tem demonstrado isso não só nos julgamentos, mas tem feitos diversas campanhas pela participação da mulher na política. Eu acredito que é um caso que tem chances sim de vir a condenação”.

O que dizem os envolvidos?

Procurado pelo BHAZ, o presidente de Belo Horizonte do PRTB, Mauro Quintão, acusa os autores do processo de tentativa de prejudicar um partido de direita e o segundo vereador mais votado da capital mineira. “São supostas candidatas fantasmas. Isso é tentativa de prejudicar um vereador, o segundo vereador mais votado na capital mineira, o Nikolas”, inicia o dirigente.

“Tanto que os que entraram [com o processo] são partidos da esquerda, querendo prejudicar um partido da direita sem fundo partidário, sem tempo de TV, que não só ficou em segundo lugar no Executivo, eu como candidato a vice junto com o deputado Bruno Engler, como também elegeu o Nikolas, segundo vereador mais bem votado”, argumenta.

Mauro Quintão afirma que está convicto de que os processos terão o pedido negado. “Estão nas mãos dos advogados, que me deixaram muito tranquilo, uma vez que os trabalhos desta eleição na Câmara Municipal foram bem transparentes, conduzidos de forma sempre mantendo o princípio da boa fé. As candidatas assinaram um termo confirmando o interesse de saírem candidatas, um termo de compromisso”, diz, antes de alegar que trata-se de “política suja”, com objetivo de “prejudicar o vereador Nikolas Ferreira”.

O BHAZ também procurou o próprio legislador, Nikolas Ferreira, que preferiu responder por meio de sua assessoria. “Informamos que a equipe jurídica já prestou seus esclarecimentos à Justiça, expondo os argumentos de direito, e agora aguarda com tranquilidade a deliberação judicial, na certeza da lisura do processo eleitoral no qual o Nikolas foi eleito”, afirma o posicionamento na íntegra.

O PROS, também procurado pela reportagem, não respondeu às demandas feitas através de mensagens, e-mails e ligações. O vereador do partido com risco de ser cassado, Wesley Autoescola, escreveu ao BHAZ que espera uma posição da Justiça. “A defesa do partido já foi feita em todas as ações. O MP mesmo já apurou esses fatos e manifestou pelo arquivamento. Como foi judicializado, vamos esperar a posição da Justiça”.

Edição: Thiago Ricci

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