Governadores criticam Bolsonaro em carta, Zema não assina e se defende

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O governador de Minas Gerais justificou sua abstenção dizendo que “o momento é de união” (FOTO ILUSTRATIVA: Henrique Coelho/BHAZ)

O governador Romeu Zema (Novo) decidiu não assinar uma carta feita por chefes executivos estaduais responsabilizando o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) pelos estragos da pandemia de Covid-19. A carta foi publicada após o presidente divulgar, nesse domingo (28), os valores repassados pelo governo federal a cada estado – e a abstenção de Zema não agradou a todos. Nesta terça (2), o governador se defendeu e justificou a decisão.

A carta, redigida por 18 governadores e publicada ontem (1º), aponta uma inconsistência na divulgação dos repasses aos estados para o combate à pandemia da Covid-19. Segundo o documento, os valores tratam-se de verbas obrigatórias que devem ser destinadas às Unidades Federativas, como previsto na Constituição. Assim, o dinheiro não se configura como verba extra, e sim, como indispensável aos estados.

“Em meio a uma pandemia de proporção talvez inédita na história, agravada por uma contundente crise econômica e social, o governo federal parece priorizar a criação de confrontos, a construção de imagens maniqueístas e o enfraquecimento da cooperação federativa essencial aos interesses da população”, diz um trecho da carta dos governadores.

“A postagem hoje veiculada nas redes sociais da União e do Presidente da República contabiliza majoritariamente os valores pertencentes por obrigação constitucional aos Estados e Municípios, como os relativos ao FPE, FPM, FUNDEB, SUS, royalties, tratando-os como uma concessão política do atual Governo Federal”, disseram os chefes dos estados brasileiros, em outro trecho.

‘Momento é de união’

Dentre os 18 governadores que redigiram e assinaram o documento, Romeu Zema decidiu se abster da crítica a Bolsonaro. O chefe do estado mineiro justificou sua abstenção, dizendo que “o momento é de união em torno de soluções no combate à pandemia, com a aceleração do processo de vacinação e o financiamento dos leitos de UTI”.

Além disso, o governador ponderou que os “embates políticos devem ficar em segundo plano, com foco na solução de problemas”. Ronaldo Caiado (DEM), Ratinho Junior (PSD) e Cláudio Castro (PSC) deixaram seus nomes na carta que critica as informações repassadas por Bolsonaro. Mesmo assim, a justificativa não impediu que ele fosse criticado por cidadãos que esperavam uma postura mais incisiva.

Zema se defende

Diante da repercussão da carta, o governador voltou a se defender dos ataques nesta terça-feira. Em um vídeo publicado pelo deputado estadual Bruno Engler (PSL), Zema justificou novamente a decisão de não assinar o documento e rebateu as críticas.

Elogiado por Engler e pelo deputado federal Cabo Junio Amaral (PSL) por sua “serenidade” e por não promover “picuinhas políticas em cima da pandemia”, Zema argumentou que o que procura é “resolver problemas”. “Atacar é muito fácil. O que nós queremos é vacinar o mineiro o quanto antes e estamos aqui em Brasília correndo atrás dessas vacinas”, disse.

Carta dos governadores na íntegra

“Nota Pública sobre repasses financeiros aos Entes Federados

Os Governadores dos Estados abaixo assinados manifestam preocupação em face da utilização, pelo Governo Federal, de instrumentos de comunicação oficial, custeados por dinheiro público, a fim de produzir informação distorcida, gerar interpretações equivocadas e atacar governos locais. Em meio a uma pandemia de proporção talvez inédita na história, agravada por uma contundente crise econômica e social, o Governo Federal parece priorizar a criação de confrontos, a construção de imagens maniqueístas e o enfraquecimento da cooperação federativa essencial aos interesses da população.

A Constituição Brasileira, Carta maior de nossa sociedade e nossa democracia, estabelece receitas e obrigações para todos os Entes Federados, tal como é feito em qualquer federação organizada do mundo. No modelo federativo brasileiro, boa parte dos impostos federais (como o Imposto de Renda pago por cidadãos e empresas) pertence aos Estados e Municípios, da mesma forma que boa parte dos impostos estaduais (como o ICMS e o IPVA) pertence aos Municípios. Em nenhum desses casos a distribuição tributária se deve a um favor dos ocupantes dos cargos de chefe do respectivo Poder Executivo, e sim a expresso mandamento constitucional.

Nesse sentido, a postagem hoje veiculada nas redes sociais da União e do Presidente da República contabiliza majoritariamente os valores pertencentes por obrigação constitucional aos Estados e Municípios, como os relativos ao FPE, FPM, FUNDEB, SUS, royalties, tratando-os como uma concessão política do atual Governo Federal. Situação absurda similar seria se cada Governador publicasse valores de ICMS e IPVA pertencentes a cada cidade, tratando-os como uma aplicação de recursos nos Municípios a critério de decisão individual.

São mencionados também os valores repassados aos brasileiros para o auxílio emergencial, iniciativa do Congresso Nacional, a qual foi indispensável para evitar a fome de milhões de pessoas. Suspensões de pagamentos de dívida federal por acordos e decisões judiciais muito anteriores à COVID-19, e em nada relacionadas à pandemia, são ali também listadas. Já as reposições das perdas de arrecadação estadual e municipal, iniciativas também lideradas pelo Congresso Nacional, foram amplamente praticadas em outros países, pelo simples fato de que apenas o Governo Federal apresenta meios de extensão extraordinária de seu orçamento pela via da dívida pública ou dos mecanismos monetários e, sem esses suportes, as atividades corriqueiras dos Estados e Municípios (como educação, segurança, estruturas de atendimento da saúde, justiça, entre outras) ficariam inviabilizadas.

Em relação aos recursos efetivamente repassados para a área de Saúde, parcela absolutamente minoritária dentro do montante publicado hoje, todos os instrumentos de auditoria de repasses federais estão em vigor. A estrutura de fiscalização do Governo Federal e do Tribunal de Contas da União tem por dever assegurar aos brasileiros que a finalidade de tais recursos seja obedecida por cada governante local.

Adotando o padrão de comportamento do Presidente da República, caberia aos Estados esclarecer à população que o total dos impostos federais pagos pelos cidadãos e pelas empresas de todos Estados, em 2020, somou R$ 1,479 trilhão. Se os valores totais, conforme postado hoje, somam R$ 837,4 bilhões, pergunta-se: onde foram parar os outros R$ 642 bilhões que cidadãos de cada cidade e cada Estado brasileiro pagaram à União em 2020? 

Mas a resposta a essa última pergunta não é o que se quer. E sim o entendimento de que a linha da má informação e da promoção do conflito entre os governantes em nada combaterá a pandemia, e muito menos permitirá um caminho de progresso para o País. A contenção de aglomerações – preservando ao máximo a atividade econômica, o respeito à ciência e a agilidade na vacinação – constituem o cardápio que deveria estar sendo praticado de forma coordenada pela União na medida em que promove a proteção à vida, o primeiro direito universal de cada ser humano. É nessa direção que nossos esforços e energia devem estar dedicados.

Brasília, 1º de março de 2021.

RENAN FILHO
Governador do Estado do Alagoas

WALDEZ GÓES
Governador do Estado do Amapá
RUI COSTAGovernador do Estado da Bahia

CAMILO SANTANA
Governador do Estado do Ceará

RENATO CASAGRANDE
Governador do Estado do Espírito Santo

RONALDO CAIADO
Governador do Estado de Goiás

FLÁVIO DINO
Governador do Estado do Maranhão
MAURO MENDESGovernador do Estado do Mato Grosso

HELDER BARBALHO
Governador do Estado do Pará

JOÃO AZEVÊDO
Governador do Estado da Paraíba

RATINHO JUNIOR
Governador do Estado do Paraná

PAULO C MARA
Governador do Estado de Pernambuco

WELLINGTON DIAS
Governador do Estado do Piauí

CLÁUDIO CASTRO
Governador em exercício do Estado do Rio de Janeiro

FÁTIMA BEZERRA
Governadora do Estado do Rio Grande do Norte

EDUARDO LEITE
Governador do Estado do Rio Grande do Sul

JOÃO DORIA
Governador do Estado de São Paulo

BELIVALDO CHAGAS
Governador do Estado de Sergipe”

Edição: Giovanna Fávero
Andreza Miranda[email protected]

Graduada em Jornalismo pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e repórter do BHAZ desde 2020. Participou de duas reportagens premiadas pela CDL/BH (2021 e 2022); de reportagem do projeto MonitorA, vencedor do Prêmio Cláudio Weber Abramo (2021); e de duas reportagens premiadas pelo Sebrae Minas (2021 e 2023).

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