Técnico do Cruzeiro feminino é detido por desacatar fiscal de saúde

Técnico do Cruzeiro feminino
‘Pega essa sua caneta e enfia na sua lomba’, teria dito o técnico à fiscal (Rodolfo Rodrigues/Cruzeiro)

Uma confusão marcada por ofensas direcionadas à coordenadora da Vigilância de Saúde de Juatuba, na região metropolitana de Belo Horizonte, levou à detenção do técnico do time feminino do Cruzeiro, Marcelo Frigério, conhecido como Tchelo. De acordo com registro policial, na sexta-feira (12), a secretária de Saúde tentou interromper uma aglomeração que envolvia as jogadoras do time em um campo de futebol, e ouviu do técnico: “Pega essa sua caneta e enfia na sua lomba”. Já ele nega as ofensas e afirma que a fiscal agiu com falta de educação com as atletas.

Segundo informações da PM, a coordenadora Thaís Rubia Duque recebeu uma denúncia de um funcionário da prefeitura a respeito de violações de restrições contra a Covid-19 no estádio Curumim. De acordo com a denúncia, mais de 33 pessoas se reuniam no local, número acima do permitido por decreto municipal. Havia, ainda, jogadoras do Cruzeiro nas arquibancadas, sem máscaras de proteção e sem respeitar o distanciamento recomendado de dois metros.

A coordenadora, que atua como fiscal das restrições de combate à Covid-19, pediu que todas as pessoas presentes fossem embora. Segundo ela, um dos treinadores presentes no local ouviu suas recomendações e deixou o estádio, mas o técnico do Cruzeiro respondeu “de forma agressiva” e disse às jogadoras do time que “não era para ninguém sair”. A responsável pela fiscalização explicou a Tchelo o poder de polícia sanitária que ela detém, e, ainda de acordo com a PM, o profissional pediu que ela pegasse a caneta e escrevesse “um beijo para o prefeito”.

Mais ofensas

Depois de ser desrespeitada, Thaís Rubia Duque acionou a Polícia Militar. Enquanto aguardava a chegada das autoridades, acompanhada de outros dois funcionários da prefeitura que testemunharam o episódio, ela conta que Tchelo se aproximou dela dizendo palavras de baixo calão e menosprezando seu trabalho. “Pega essa sua caneta e enfiar na sua lomba”, disse o técnico do time feminino do Cruzeiro, de acordo com a coordenadora.

O profissional continuou caminhando na direção dela e um dos funcionários entrou na frente de Thaís, para defendê-la de uma possível agressão. Neste momento, quatro homens seguraram o técnico para impedi-lo de agredir a fiscal. Os dois colegas da vítima confirmaram o relato dela à polícia.

Técnico nega

Já na versão do técnico, quando os funcionários da prefeitura chegaram ao local, perguntaram quantas pessoas compunham o time, e ele respondeu que eram 30. Com isso, os fiscais pediram que somente 11 atletas do time do Cruzeiro ficassem em campo, e que as outras fossem até o anexo da Secretaria Municipal de Cultura. Ainda segundo depoimento de Tchelo à PM, as jogadoras começaram a se deslocar para o local, quando ele ouviu a “voz alterada” de uma mulher do lado de fora do campo.

Um auxiliar do técnico, então, reclamou da falta de educação da fiscal e pediu que ela não se alterasse ao falar com as jogadoras. De acordo com Tchelo, o auxiliar foi ignorado por Thaís Rubia, que continuou gritando para que as atletas deixassem o local, ou ela acionaria a polícia. Neste momento, técnico alega que teria pedido em tom mais alto que ela respeitasse as jogadoras, e a coordenadora da Vigilância de Saúde pegou a caneta e a prancheta “em tom de ameaça”, dizendo que iria reportar a resistência delas em deixar o local.

Ainda segundo depoimento do técnico, ele pediu que ela anotasse “um beijo” dele e voltou para o campo. Depois disso, outra confusão teria começado, após um homem que se apresentou presidente da Liga de Juatuba dizer aos integrantes da equipe do Cruzeiro que “o campo era dele e estavam na cidade dele”. Ao mesmo tempo, Tchelo conta que viu Thaís expulsando as jogadoras da arquibancada para fora do estádio, sem que elas ficassem no anexo da Secretaria Municipal de Cultura.

O presidente da liga municipal, então, teria avançado em direção ao técnico para agredi-lo, mas o auxiliar de Tchelo interveio e pediu que ele não se envolvesse em briga. A jogadora Mayara Cristina, do Cruzeiro, afirmou à PM que um dos fiscais disse à coordenadora que as atletas teriam se recusado a deixar o local, o que, segundo ela, não seria verdade. Ela ainda contou que Thaís se dirigiu de forma grosseira a elas, dizendo “sai, sai, sai”.

Detenção

O estádio foi evacuado e o técnico Marcelo Frigério foi detido pelo crime de desacato, conduzido à delegacia em seguida. Lá, ele se comprometeu a comparecer ao Juizado Especial Criminal de Mateus Leme, na Grande BH, no dia 13 de abril, às 13h20. A coordenadora Thaís Rubia Duque também assinou o termo, se comprometendo a comparecer ao local na mesma data.

Cruzeiro lamenta

Na manhã desta segunda-feira (15), o Cruzeiro publicou uma nota (leia na íntegra abaixo) lamentando o ocorrido e afirmando que os fiscais agiram “sem qualquer educação ou cortesia que lhes competia no exercício da função”. De acordo com o comunicado, Tchelo alega que “no fervor do momento e pela maneira como as atletas estavam sendo tratadas, tentou agir, de forma a protegê-las”, mas nega que houve qualquer agressão verbal ou física.

“O Clube lamenta profundamente que o ocorrido, em um momento delicado como este de pandemia, que afeta a todos, tenha tomado esta proporção. E a instituição tomará todas as providências cabíveis para proteger os seus profissionais e as suas atletas”, diz a nota. Ainda de acordo com o registro policial, a coordenadora da equipe feminina do Cruzeiro, Bárbara Fonseca, reforçou que o clube usa o estádio como centro de treinamento a partir de uma parceria com a Prefeitura de Juatuba, mas que o presidente da liga municipal vinha demonstrando insatisfação com a presença da equipe no local.

Nota do Cruzeiro

“O Cruzeiro Esporte Clube lamenta o ocorrido na última sexta-feira, no Estádio Curumim, em Juatuba, onde a equipe de futebol feminino realizava as suas atividades de pré-temporada. Na ocasião, fiscais sanitários compareceram ao local e solicitaram que as jogadoras deixassem o espaço, sem qualquer educação ou cortesia que lhes competia no exercício da função.

O treinador Tchelo foi convidado a prestar esclarecimentos na delegacia e o mesmo relata que as palavras, no momento de tensão, foram dirigidas a Geraldo Ricardo Lima, que também é o presidente da Liga de Desportos de Juatuba, e que, por motivo desconhecido, não estaria satisfeito com a presença da equipe feminina na cidade. Ele alega que no fervor do momento e pela maneira como as atletas estavam sendo tratadas, tentou agir, de forma a protegê-las, mas negou com veemência que houve qualquer agressão verbal ou física a qualquer membro feminino da equipe de fiscalização.

O Cruzeiro destaca que Marcelo Frigerio, o Tchelo, tem 23 anos de atuação no futebol feminino, com uma trajetória respeitada dentro e fora dos gramados. O Clube lamenta profundamente que o ocorrido, em um momento delicado como este de pandemia, que afeta a todos, tenha tomado esta proporção. E a instituição tomará todas as providências cabíveis para proteger os seus profissionais e as suas atletas.

O Clube destaca ainda o apoio total e irrestrito da Prefeitura de Juatuba, que tomará medidas administrativas sobre o caso.

O Cruzeiro Esporte Clube reforça e apoia a luta para que todas as mulheres ganhem cada vez mais voz, e sejam respeitadas em todos os espaços, valorizando a pluralidade”

Edição: Giovanna Fávero
Sofia Leão[email protected]

Repórter do BHAZ desde 2019 e graduada em jornalismo pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). Participou de reportagens premiadas pelo Prêmio Cláudio Weber Abramo de Jornalismo de Dados, pela CDL/BH e pelo Prêmio Sebrae de Jornalismo em 2021.

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