Herança das enchentes para o povo de Venda Nova

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Temporal deixou rastro de destruição na Vilarinho, em BH (Vitor Fórneas/BHAZ)
GABINETONA

Vereadores deixam para a cidade o descaso com milhares de famílias ao negar empréstimo para obras de saneamento básico e prevenção das enchentes.

Por Iza Lourença

Cresci na região de Venda Nova. Já vivi na pele as consequências das enchentes na Vilarinho, um problema histórico da cidade de Belo Horizonte que um dia resolveu canalizar seus rios em um projeto de urbanização falido. São famílias que perdem tudo, como aconteceu no início deste ano no bairro Primeiro de Maio. Vidas já foram perdidas dolorosamente em décadas de descaso. Quanto dinheiro já foi gasto com medidas totalmente ineficazes para resolver o problema?

A principal urgência do poder público deve ser pensar nas pessoas que vivem em áreas de risco de desabamento, sem saneamento básico ou qualquer estrutura urbanística. É o caso das ocupações da Izidora. Cerca de 30 mil famílias constroem uma linda luta de regularização fundiária, lideradas em sua maioria por mulheres negras, pelo direito à moradia.

O Projeto de Lei 1026/2020, elaborado pelo executivo e em pauta ontem em reunião extraordinária da Câmara Municipal de BH, tratava-se de um pedido de empréstimo para execução do Programa de Redução de Riscos de Inundações e Melhorias Urbanas na região da bacia do Isidoro. O dinheiro tinha uma destinação específica para obras que impactariam a vida dos belorizontinos de Venda Nova e Região Norte e poderia ajudar a acabar com as enchentes na Vilarinho.

Claro que havia contradições no projeto. Minha parceira Bella Gonçalves apresentou duas emendas fundamentais. A primeira era para obrigar o executivo a garantir a gestão democrática com participação popular da aplicação dos recursos, assim como a formulação e execução das obras. Afinal, ninguém melhor que a própria população para fiscalizar e propor um projeto que de fato atenda aos interesses dos atingidos pelo Programa. A segunda emenda também era no sentido de aprofundar a fiscalização: a prefeitura deveria encaminhar os projetos e ações relativas ao programa para apreciação da Câmara e Conselhos Municipais, com prestação de contas e audiências públicas regulares.

Infelizmente, para justificar o voto contrário ao povo de Venda Nova e da Izidora, vereadores usaram diversos recursos argumentativos. A verdade é que alguns têm a convicção de que deixar para seus filhos a “herança” de uma dívida pública é absurda. Eu me pergunto: e a herança para os filhos de Venda Nova? Para os filhos da ocupação Izidora? E a herança do modelo urbanístico excludente da capital? Pior! E a herança escravocrata e de exploração da classe trabalhadora que faz com que alguns morem em condomínios de luxo e outros em área de risco? 

Com a retórica “técnica” dizem que foram contra o empréstimo e não as obras. Mas fato é que quiseram dar um recado ao prefeito, por falta de diálogo, mas o recado foi dado à população: suas vidas não importam. A Câmara Municipal abriu mão de quase R$1 bilhão de reais para a região Norte, Venda Nova e Izidora. Deixamos como herança as enchentes, as inundações, a falta de saneamento básico.  

Eu sou oposição ao governo de Alexandre Kalil. Não é sobre isso. Tenho críticas ao projeto, mas não é verdade o que estão afirmando para justificar a vergonhosa votação. Estou em diversas lutas cobrando da prefeitura. Como é o caso da Maternidade Leonina Leonor, também em Venda Nova. Ou as famílias que perderam tudo pela inundação no bairro Primeiro de Maio. Para os movimentos sociais, aí sim a prefeitura não tem diálogo! Não apoio sua política e seu projeto de cidade. Mas jamais rejeitaria um projeto para marcar minha oposição ao prefeito se ele beneficiar o povo nas periferias. 

É preciso coragem política para inverter prioridades! Essa coragem é das pessoas que lutam todos os dias por direitos básicos, como a população de Venda Nova e os moradores da ocupação Izidora. Regiões periféricas que merecem investimento sim! Seguiremos lutando por outro modelo de cidade que garanta direitos sociais, respeitem o meio-ambiente e o curso das águas.

Gabinetona[email protected]

A Gabinetona é um mandato coletivo construído por quatro parlamentares em três esferas do Legislativo. É representada pelas vereadoras Cida Falabella e Bella Gonçalves na Câmara Municipal de Belo Horizonte, pela deputada estadual Andréia de Jesus na Assembleia Legislativa de Minas Gerais e pela deputada federal Áurea Carolina na Câmara dos Deputados, em Brasília.

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