Libertas quae sera tamen: A contraditória concepção de liberdade da extrema-direita

dia da inconfidência
IMAGEM ILUSTRATIVA (Arquivo EBC + Marcelo Camargo / ABr)
coluna colunista

O dia em que se homenageia Tiradentes presenciou uma nova manifestação em frente ao quartel do 12 BI.

É curioso que o feriado em que se celebra a Conjuração Mineira seja marcado pelos protestos da extrema-direita. Afinal, parece estranho que algumas centenas de pessoas se reúnam para pedir uma nova ditadura justamente na data em que se relembra a morte do mártir que pretendia libertar Minas Gerais do jugo de Portugal.

Um completo desavisado até poderia pensar que os gritos por liberdade das hordas bolsonaristas estariam de acordo com as ideias dos conjurados. Só que não! Esse grupo tem uma concepção muito “peculiar” de liberdade…

Liberdade para quê?

Eles defendem, por exemplo, a liberdade de pilotar uma moto sem capacete, de dirigir sem o cinto de segurança, de adolescentes portarem armas, de se invadir pronto-socorros, de buzinarem diante de hospitais, de discriminar as minorias, de devastar o meio-ambiente, de explorar o trabalho infantil…

Por outro lado, negam a liberdade de imprensa, a de quem quer constituir família com alguém de seu mesmo sexo, de quem deseja usar seu nome social, de quem não desejar conceber, de quem deseja ler certos livros, de quem se exprime contra o governo…

Enfim, defendem a liberdade desde que o seu exercício esteja de acordo com o que eles entendem adequado. É uma liberdade condicionada; não à satisfação do bem-comum, mas à observância de suas próprias concepções pessoais e morais.

Liberdade, mas em seus termos…

O prefeito da cidade não poderia restringir sua liberdade de trabalhar, mesmo que estejamos atravessando a pior pandemia da história, com centenas de milhares de mortos e sem uma perspectiva real de vacinação ainda que a médio prazo.

Não importa que essa medida seja utilizada em vários outros países que tiveram – e têm – um desempenho muito melhor que o nosso no combate ao novo coronavírus e que efetivamente contribui para minimizar os riscos do contágio: Para eles, o fechamento temporário das atividades não essenciais é uma medida que fere de morte a sua liberdade.

Do mesmo modo, admitem que gestores públicos gastem milhões de reais na fabricação e distribuição de fármacos que, na melhor das hipóteses, não causam qualquer efeito: nesse caso, deve-se respeitar a liberdade do profissional de utilizar seus pacientes como cobaias, mesmo que tal prática seja condenada mundo afora.

Mas são esses amantes da liberdade que vociferam por uma intervenção militar, pelo fechamento do Congresso e pela destituição dos integrantes do STF. São eles que apoiam o uso político da Polícia Federal para coibir críticas ao presidente nas redes sociais. E são eles que atacam diariamente a imprensa.

Livres para oprimir

Para eles, a liberdade não é um meio para a emancipação pessoal, não é o instrumento pelo qual a pessoa constrói a sua personalidade e vive de acordo com suas convicções e expectativas.

Nao… Eles não tem essa concepção da liberdade. Paradoxalmente, associam a liberdade à opressão. Querem ser livres para matar, para discriminar, para humilhar, para explorar. Essa é a liberdade que valorizam; essa a liberdade que procuram.

Felizmente, as últimas pesquisas de opinião apontam que o fascínio por essas ideias diminui mês após mês. As bravatas e ameaças, espalhadas por milhares de robôs pelas redes sociais, já não constrangem mais ninguém.

Podem usar o feriado de Tiradentes para instilarem o ódio e atacarem a democracia e a república. Sabemos que isso passará. Como bons mineiros, sabemos que a liberdade vai chegar, ainda que tardia.

Rodolpho Barreto Sampaio Júnior[email protected]

Rodolpho Barreto Sampaio Júnior é doutor em direito civil, professor universitário, Diretor Científico da ABDC – Academia Brasileira de Direito Civil e associado ao IAMG – Instituto dos Advogados de Minas Gerais. Foi presidente da Comissão de Direito Civil da OAB/MG. Apresentador do podcast “O direito ao Avesso”.

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