Ativista afegão prevê matança e aprisionamento de pessoas LGBTQIA+ sob regime do Talibã

Nemat Sadat escritor e ativista afegão
Nemat se refugiou nos Estados Unidos ainda jovem e trabalhou no Afeganistão em 2012 (Elliot O’Donovan/Reprodução/@nematsadat/Instagram)

Nemat Sadat, 41, escritor e ativista afegão, prevê matança e aprisionamento de pessoas LGBTQIA+ no Afeganistão sob o regime do Talibã. O grupo radical tem uma interpretação rígida da doutrina islâmica e voltou ao poder no país depois de quase 20 anos. Afegãos e estrangeiros vêm tentando sair do país desde então, protagonizando cenas caóticas como multidões nos aeroportos e pessoas se pendurando em aeronaves em movimento.

Segundo o escritor, em entrevista à Folha, o regime deve tentar transmitir a imagem de moderados enquanto as atenções ainda estiveram voltadas ao país. Com a mudança de foco no mundo, o grupo seguirá perseguindo aqueles que acreditam que estejam violando os preceitos do islã. “Mesmo que não recorram aos linchamentos públicos dos anos 1990, poderão prender pessoas LGBT+ ou matá-las, e ninguém ficará sabendo”, pontua.

O ativista acredita que o Talibã não mudou “a mentalidade da idade das trevas”. “Houve apenas uma modernização cosmética: têm celulares, tiram selfies, são excelentes em conseguir curtidas nas redes”, complementa Sadat, que se refugiou nos Estados Unidos no contexto do conflito soviético-afegão (1979-1989) e, mais tarde, naturalizou-se estadunidense.

Sadat é gay, ativista em prol dos direitos LGBTQIA+ e pretender ajudar a comunidade afegã neste momento. Para isso, o escritor está ativando a própria rede de contatos no país, onde também morou durante um curto período de tempo na década passada. “Recebi nomes de mais de cem pessoas que querem sair do Afeganistão”, revela.

Casamentos forçados, estupros, assassinatos…

O escritor acredita que os Estados Unidos se tornarão uma vergonha para o mundo caso não ajudem a comunidade LGBTQIA+ afegã e se recusarem a tirar do país todas as pessoas que querem sair de lá. “Ficarão manchados para sempre, serão uma vergonha para o mundo”, opina.

Enquanto ele concorda que houve uma abertura no Afeganistão após a intervenção externa, em 2001, o ativista não acredita que os Estados Unidos promoveram direitos LGBTQIA+ no Afeganistão. “Os LGBT+ afegãos continuam sendo vítimas de crimes de honra, casamentos forçados, espancamentos, estupros, assassinatos. É prática comum das forças de segurança afegãs – treinadas pelo Ocidente para combater o terrorismo – montar perfis falsos em aplicativos de relacionamento a fim de identificar e capturar homens gays e bissexuais”, revela.

O próprio escritor foi alvo de ameaças e retaliações no Afeganistão, quando se mudou ao país em 2012. Sadat era professor da Universidade Americana do Afeganistão, instituição ligada ao Departamento de Estado dos EUA, e ativista em prol dos direitos LGBTQIA+, mas foi demitido da universidade e precisou sair do país no ano seguinte. “Clérigos muçulmanos conservadores emitiram uma fatwa [decreto religioso] contra mim. Nem a universidade nem o governo americano me defenderam”.

Sadat se lembrou de outros países onde ativistas LGBTQIA+ também lutam para ter os direitos reconhecidos. “O país vive hoje o pior cenário imaginável para LGBT+, mas há também a Tchetchênia, o Irã, a Arábia Saudita, a Rússia e vários outros lugares”, destaca. “Há um problema de racismo quando se fala de direitos LGBTQIA+ no Afeganistão, dizem ‘é outra cultura, são muçulmanos, não queremos ser insensíveis'”.

Edição: Vitor Fernandes

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