Prefeitura aumenta impostos no setor de tecnologia em plena pandemia

Prefeitura de Belo Horizonte
A promessa da Prefeitura é enviar um outro projeto para a Câmara (Amanda Dias/BHAZ)

Ao mesmo tempo em que provocou uma forte recessão econômica, a pandemia do coronavírus desencadeou um crescimento intenso do desenvolvimento tecnológico ao redor do mundo. Em Belo Horizonte, vimos uma série de negócios migrarem para o digital, garantindo o sustento de milhares de famílias ao longo de um período tão grave. O problema é que esse crescimento corre o risco de desacelerar, pois a Prefeitura decidiu encarar a evolução desse mercado como uma oportunidade para aumentar impostos na cidade.

Enquanto os belo-horizontinos se esforçam para superar a crise, lidar com os preços exorbitantes do combustível e sobreviver à escalada da inflação, a Prefeitura decidiu aumentar impostos mesmo tendo uma arrecadação normalizada no ano de 2021. Pior ainda, decidiu aumentar a taxação justamente no setor que foi a saída para que muitos negócios pudessem manter suas portas abertas durante a pandemia. 

Durante a tramitação dessa proposta tão polêmica, recuperei um vídeo em que Alexandre Kalil usa a pauta do empreendedorismo e da inovação para fazer campanha eleitoral. Ele diz que, na Belo Horizonte de sua gestão, a cidade vai “passar Santa Catarina, trazer empresário de São Paulo e do Rio, e a Prefeitura vai lucrar com esse negócio”. Chegando à metade do seu segundo mandato, está claro que foi exatamente o oposto disso que aconteceu. 

Além de termos visto o polo empreendedor de Belo Horizonte perder espaço para cidades como Recife, Fortaleza e até Nova Lima, agora estamos diante da decisão política menos inteligente possível de Kalil. Parece que o prefeito está mais preocupado em “lucrar com esse negócio” do que em criar um ambiente favorável para de fato voltarmos a protagonizar o setor da tecnologia e inovação. 

Trata-se de uma medida nada inteligente, pois aumentar impostos em um setor tão fluido e pouco apegado a fronteiras geográficas é a fórmula certeira para expulsar esses negócios da cidade. Com eles, irá embora também gente muito competente, talentosa e apaixonada por Belo Horizonte, que gostaria muito de viver aqui entre as montanhas, mas não está disposta a ver seu trabalho e sua renda sendo corroídos pelo Estado.

O aumento de imposto veio como jabuti de um bom projeto

Recebemos na Câmara Municipal um projeto de lei importante, que pretendia realizar a renegociação das dívidas da população com o município. Um movimento necessário para aliviar as contas de muitas famílias em momento de crise econômica. O PL 97/21, no entanto, chegou com um jabuti: o artigo 10, que insere e amplia atividades relacionadas ao setor de tecnologia na lista de serviços sujeitos à cobrança do ISS (Imposto Sobre Serviços). 

Com a aprovação do projeto, estarão sujeitos ao imposto serviços de armazenamento de dados, criação de jogos eletrônicos (para smartphones, tablets e outras plataformas), disponibilização de conteúdos de áudio, imagem e vídeo (streamings), publicidade e propaganda em meios que não são livros, jornais, periódicos, rádios e TV (ou seja, “publiposts” dos influencers). Sobrou até para os estúdios de tatuagem e piercing.

De acordo com a minha análise, esses negócios poderão pagar alíquotas que vão de 2,5% a 5%. Para uma startup ou um negócio digital que acabou de começar, assumir essa nova taxação de uma hora para outra pode ser fatal. A Prefeitura não avaliou o risco que todo aumento de imposto possui: na tentativa de aumentar as receitas do município, a cidade acaba perdendo empresas que geram emprego e renda. Seja pela fuga para ambientes mais propícios ou a própria falência desses negócios, o tiro sai pela culatra pois, no fim das contas, o risco é de queda de arrecadação também

Nós, do Partido Novo, tentamos colocar o artigo 10 para ser votado separadamente, na esperança de rejeitá-lo e conseguir aprovar o projeto sem este jabuti. Porém, a base da Prefeitura se mobilizou, conseguiu impedir que nosso requerimento fosse aceito pela Mesa e nossas emendas sequer foram votadas. 

Startups e pequenos negócios serão afetados

Na tentativa de justificar o aumento de imposto, o secretário municipal da Fazenda, João Antônio Fleury, justificou dizendo que apenas grandes empresas como Netflix e Spotify serão alvo da nova alíquota, mas isso não é verdade. A redação aprovada não diferencia negócios de pequeno ou grande porte, portanto, todo o mercado de tecnologia em BH corre risco de ter que pagar essa nova alíquota.

A promessa da Prefeitura é enviar um outro projeto para a Câmara, isentando os negócios que se enquadram no Simples Nacional, o que corresponde a cerca de 97% do setor. Mas é difícil de acreditar porque, se a Prefeitura não pretendia prejudicar os pequenos negócios, ela deveria ter mandado o projeto dessa forma inicialmente ou então ter aceitado a votação do jabuti em separado. 

Mas a Prefeitura precisava mesmo aumentar esse imposto?

Não, não precisava. A justificativa da Secretaria da Fazenda é que o aumento é apenas a regulamentação da legislação municipal em relação à Lei Complementar 157/16. Porém, o aumento de impostos, nesse caso, é uma decisão discricionária da Prefeitura e não uma imposição da norma federal.

A Secretaria também usou a Lei de Responsabilidade Fiscal para afirmar que Belo Horizonte deveria adotar todos os impostos de sua competência. No entanto, o entendimento do Tribunal de Contas da União e do Supremo Tribunal Federal é de que essa regra só se aplica a municípios que não conseguirem se autossustentar. Esse não é o caso de Belo Horizonte que, de acordo com as prestações de contas mais recentes da Prefeitura, está com a arrecadação normal e com pleno equilíbrio fiscal.Mas ainda que estivesse com qualquer tipo de desequilíbrio, o fato é que a Prefeitura de Belo Horizonte ainda teria a alternativa de olhar para o problema pela perspectiva da redução de despesas e não do aumento de receitas. Antes de cobrar mais impostos do cidadão, o prefeito Alexandre Kalil deveria enxugar a máquina e reduzir gastos desnecessários. Seria uma estratégia melhor do que comprometer o setor de inovação de Belo Horizonte, que por muitos anos foi referência para todo o Brasil.

Marcela Trópia[email protected]

Marcela Trópia é especialista em políticas públicas formada pela Fundação João Pinheiro (MG) e pós-graduada em Liderança e Gestão Pública pelo Centro de Liderança Pública (SP). Foi responsável por coordenar a campanha vitoriosa do deputado federal Tiago Mitraud (NOVO-MG) e atuou como coordenadora política do gabinete do deputado estadual Guilherme da Cunha (NOVO-MG). Em 2020, foi eleita vereadora pelo partido NOVO em Belo Horizonte com 10.741 votos, sendo a 6ª mais votada da cidade.

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