Roger Waters promove catarse com música e política em Mineirão lotado

Em noite catártica, Roger Waters se despediu dos palcos mineiros (Terence Machado/Divulgação)

O quão lisérgica pode ser uma noite de quarta-feira? No histórico e derradeiro encontro da noite passada (8), no Mineirão, Roger Waters mostrou o potencial alucinante desse dia solto no meio da semana. Pela turnê “This Is Not a Drill”, que marca sua despedida dos palcos – ou, pelo menos, das grandes turnês mundiais –, o artista se apresentou em Belo Horizonte para um público de mais de 60 mil pessoas, revivendo a galeria de clássicos que talharam gerações apaixonadas pela psicodelia progressiva do Pink Floyd.

Em exatas duas horas e meia de show, o cantor, compositor e multi-instrumentista inglês presenteou o público não só com uma curadoria musical impecável, que reuniu a nata do legado construído pelo ex-grupo em pouco mais de duas décadas, mas também com um espetáculo audiovisual indescritível, quase digno de equiparação à sétima arte.

Vaza para o bar!

Marca registrada de Waters, posicionamento político extra-musical também não faltou ao encontro. Antes do início do show, uma mensagem estampava os telões, a contragosto de uma minoria: “Se você é um daqueles fãs de Pink Floyd que não suportam a política do Roger, vaza para o bar!”.

O recado, que parece ter pintado durante toda a turnê, fazia ainda mais sentido num Mineirão, que, anos atrás, ficou dividido entre palmas e vaias diante da reprovação de Roger Waters sobre o nome do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), à época das eleições.

(Thiago Cândido/BHAZ)

Mais do que inclinações políticas borrifadas aqui e acolá, o show construído por Waters e equipe escancarou ao público aquilo que o artista prega também fora dos palcos: “parem as guerras, direitos básicos a todos e liberdade para os povos”. Entre um clamor e outro, a necessidade de denunciar atos criminosos cometidos por ex-presidentes e entidades governamentais dos Estados Unidos contra civis de todo o mundo.

(Thiago Cândido/BHAZ)

Escalada catártica

Sobre a setlist do espetáculo, nada além do esperado para um possível último encontro: o melhor do melhor. Apesar da versão sombria e egoísta de “Comfortably Numb” – apresentada em 2022 por Waters como uma releitura do clássico, sem a presença dos agudos marcantes de David Gilmour – abrindo o show, da segunda faixa em diante o encontro seria marcado por uma fidelidade ímpar na execução das faixas.

Ao lado de “Another Brick in the Wall”, “Wish You Were Here” e “Shine On You Crazy Diamond”, canções menos famosas selaram a primeira etapa do encontro, que também foi o momento saudosista do show, quando Waters homenageou Syd Barrett, ex-guitarrista e fundador do Pink Floyd, que morreu em 2006, aos 60 anos, vítima de câncer.

A segunda metade do espetáculo reservou o que de melhor apresenta o repertório da ex-banda. Com o apoio mais que especial dos guitarristas Dave Kilminster e Jonathan Wilson e do saxofonista Seamus Blake, Waters mergulhou com perícia catártica naquele que figura entre os melhores álbuns da história do rock’n’roll: The Dark Side of The Moon. Em uma sequência que amarrou “Money”, “Us and Them”, “Brain Damage” e “Eclipse”, o artista fez valer ingresso e gasolina, menos o valor exorbitante da cerveja.

“Have a Cigar”, de 1975 (Júlia Molina/Divulgação)

Considerando que Roger Waters não se lançará mais em turnês mundiais, a despedida tem sabor realçado. Mais do que o objetivo de entretenimento que a música, por vezes, se propõe a cumprir, fica registrado o papel social de Waters e do Pink Floyd em um mundo ainda desfigurado. Aos que discordam, o bar é logo ali.

Thiago Cândido[email protected]

Estudante de Jornalismo na Universidade Federal de Minas Gerais. Colunista no programa Agenda da Rede Minas de Televisão. Estagiário do BHAZ desde setembro de 2023.

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