Quem passa pela avenida Augusto de Lima, na região Centro-Sul de BH, não imagina que no número 1.263 funciona um mercadinho diferenciado. É que, apesar de parecer um comércio corriqueiro, a Loja do Preso é especializada em artigos para detentos do sistema prisional de Minas Gerais. O negócio nasceu em 2018, depois que o proprietário Péricles Ribeiro viveu na pele as dificuldades de receber itens básicos na cadeia, em função das regras de segurança sobre embalagens, modelos, conteúdo.
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O espaço vende de tudo: tem rádio, biscoito de maisena e até Bíblia. Só que, por lá, chinelo tem nome de ‘táxi’, pilha é ‘carvão’ e barbeador se chama ‘trator’. Os apelidos são diferentes porque fazem referência às gírias usadas nas prisões.
“Nós trabalhamos com todos os materiais de kit prisional. A gente monta o kit com base nas exigências do que cada presídio faz. Por exemplo: um shampoo precisa ter 200 ml e ter a embalagem transparente ou o barbeador que precisa ter uma lâmina, não pode ser duas, e por aí vai. E cada unidade tem sua exigência, não tem um padrão entre as cadeias”, explica o empresário de 44 anos.
Péricles foi preso por tráfico de drogas em 2016 e cumpriu pena em regime fechado por 83 dias. Nesse período, do outro lado das grades, a esposa Michelle de Almeida precisou se desdobrar para entender as regras do sistema prisional e enviar os kits que ajudariam o marido. Após solto, a complicação foi outra: Péricles não conseguia um emprego por ser ex-presidiário. Foi aí que o casal enxergou uma oportunidade em meio aos obstáculos.
A loja do preso, batizada de PJL (Paz, Justiça e Liberdade, lema dos detentos), nasceu em 2018 com a intenção de ajudar outras pessoas com familiares presos. Hoje, o negócio fica responsável por montar e enviar os kits para as principais unidades prisionais de Minas Gerais. Quem precisa da loja pode fazer o pedido pelo WhatsApp e deixar o resto com os profissionais. O serviço facilita a vida de quem não pode deixar o trabalho e outras responsabilidades, para fazer as compras.
“Todo o dia, os Correios vêm e recolhem para entregar no presídio. Hoje mesmo nós recebemos uma mensagem de uma cliente agradecendo pelo nosso trabalho, falando que é uma comodidade, que gera uma tranquilidade, e isso é muito gratificante, dá até uma carga maior para continuar. Tudo fica a critério do cliente, muitos também pegam e entregam no momento da visita”, descreve o empresário.
As atividades não ficam restritas ao âmbito virtual. Quem chega na loja se depara com prateleiras lotadas de biscoitos, pães, desodorantes, sabonetes e até roupas para visitantes. “A gente não usa ‘Loja do Preso’ na fachada até para não constranger o cliente. Quem vê de fora acha que a pessoa está comprando as coisas em um comércio como qualquer outro”.
Mesmo diante do cenário desafiador, o tema é abordado com bom humor nas postagens de divulgação da loja nas redes sociais. Dessa forma, o empreendedor acredita que consegue levar certa conscientização. Hoje a Loja do Preso já tem mais de 30 mil seguidores no Instagram e mobiliza uma comunidade engajada com os conteúdos.
“Em um primeiro instante, as pessoas acham que é meme, que é brincadeira. Mas depois elas entendem e acabam tendo curiosidade de saber como funciona, mesmo aquelas que não precisam do serviço”.
Para Péricles, a loja representa um passo adiante na luta por dignidade de pessoas que se encontram presas e suas famílias, uma parcela da sociedade muitas vezes negligenciada. “As pessoas julgam muito. A ressocialização hoje no Brasil é um mito. São pessoas que ninguém conhece, ainda existe um estigma sobre o assunto e é necessário falar sobre isso, que são pessoas e famílias ali dentro”, avalia.
PJL – Loja do Preso
Endereço: Avenida Augusto de Lima, 1263 – Loja 5B
Funcionamento: Segunda à sexta-feira, das 9h às 18h
Contato: (31) 98519-2497 ou (31) 98590-5289