Movimentos que ocupam o antigo prédio do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), no Centro de Belo Horizonte, denunciaram uma ação repressiva da Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) na tarde dessa quarta-feira (14). O espaço está ocupado desde 1º de abril deste ano por ativistas que reivindicam a construção de um memorial no local, para preservar a memória dos mortos e desaparecidos durante o governo militar. Em nota, a corporação diz que realiza a guarda do patrimônio público estadual (leia íntegra abaixo).
Ao BHAZ, Luiz Ramos, integrante da União da Juventude Rebelião (UJR), conta que a ação foi a mais intensa desde o início da ocupação. “Os policiais sempre ficaram ali, no entorno. Mas, dessa vez, vieram com tudo, encostaram e empurraram”.
Uma aula pública do curso de Ciências Ambientais da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) seria realizada no local na tarde de quarta-feira (14). No entanto, segundo os manifestantes, os policiais impediram a entrada dos estudantes, da professora e até dos ativistas. “Eles fizeram uma lista de quem consideravam manifestantes e só quem estava nessa lista podia entrar no prédio”, afirma.
De acordo com Luiz, a Polícia Militar teria lacrado o portão dos fundos do prédio com solda — o que configuraria uma violação do patrimônio, já que o edifício é tombado.
Entre os relatos mais graves está a agressão sofrida pela filha de Helena Greco. A mãe, ex-vereadora e militante histórica dos direitos humanos, foi presa e torturada durante a ditadura. Com mais de 70 anos, a filha de Helena foi impedida de entrar no prédio e, segundo Luiz, empurrada por policiais. “Ela foi agredida na porta de um espaço que reivindica a preservação da memória das vítimas da ditadura — exatamente como a mãe dela foi. É um símbolo da violência que estamos enfrentando”, desabafa Luiz.
Liminar suspende reintegração
A ação da PM ocorreu um dia após uma liminar da justiça suspender a reintegração de posse do prédio e garantir o direito de circulação dos manifestantes. Mesmo com a decisão, os policiais afirmaram que iriam permanecer no local “por ordem de superiores”.
Para Luís, a postura da PM revela uma tentativa de silenciar e apagar a mobilização. “A gente sabe a quem eles respondem: ao governador. Não tem outro nome para isso. É repressão política. E o mais simbólico é que isso aconteceu dentro do prédio onde funcionava o Dops, onde muita gente foi presa e torturada. Eles estão repetindo a história que a gente quer justamente denunciar”, ressalta Luiz.
Apesar da violência, o grupo permanece no prédio e reforça a demanda para que o espaço se transforme em um memorial das vítimas da ditadura militar. “Queremos que esse lugar, onde tantas pessoas foram torturadas, vire um memorial para que a história da ditadura não seja esquecida”, conclui ele.
O que diz a Polícia Militar?
Em nota enviada à reportagem, a Polícia Militar disse que tem prerrogativa legal para realizar a guarda do patrimônio público estadual, “razão pela qual deve manter o policiamento no local cumprindo o seu papel constitucional”.
“Nesse sentido, a PMMG permanecerá no local para manter a ordem pública, a segurança de servidores que possam estar presentes e evitar danos ao patrimônio público, até a realização da audiência de conciliação com a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese) que tratará da ocupação indevida do imóvel. A decisão judicial, em questão, é referente a ocupação de pessoas que já se encontram no interior do imóvel. Portanto, não há qualquer descumprimento por parte da instituição”, afirma o comunicado.
Prédio do DOPs
A unidade foi ocupada por membros do MLB (Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas). O grupo cobra do Governo de Minas a criação de um memorial da ditadura no local, projeto já aprovado.
Segundo pesquisadores, o local era usado para receber os novos presos do regime militar, onde ocorriam torturas psicológicas e físicas. Após a redemocratização, o espaço passou a ser ocupado por delegacias da Polícia Civil.
Em 2018, na gestão do então governador Fernando Pimentel (PT), a delegacia foi desativada e, por orientação das Comissões Estadual e Nacional da Verdade, o prédio foi destinado à criação de um memorial em homenagem às vítimas da ditadura. Apesar da destinação, até hoje, o edifício estava vazio.