Sociólogo defende nova Constituição para melhorar a segurança: ‘Modelo policial caótico’

A segurança pública é um dos problemas recorrentes no Brasil. Em Minas Gerais isso tem sido evidenciado com a onda de ataques a ônibus em diversas cidades que iniciaram no começo do mês. Além destes ataques os índices de homicídio continuam altos. O Atlas da Violência 2017 divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra o assassinato da juventude nos períodos entre 2005 e 2015 quando mais de 318 mil jovens foram mortos em todo o país. Para compreender os fatores que auxiliam o aumento da violência pública e a como fazer para reduzir os crimes, o Bhaz conversou com Robson Sávio, professor universitário e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

A que você atribuiu os indicadores de segurança estar sempre altos, não apresentando queda?

O Brasil é um país imenso e, assim, com realidades distintas. Às vezes, observamos o decréscimo em determinados estados, mas o fator que contribui para os números não permanecerem baixos se dá pelo fato do nosso sistema de segurança pública, juntamente com o sistema criminal, não terem passados por uma reforma por ocasião da redemocratização do país. Eles continuam com o viés autoritário, punitivo, e não respondem às demandas das sociedades plurais em um mundo globalizado. O Brasil pode ser dividido como um país onde as pessoas de classe média possuem um aparato de segurança mais rápido e as minorias ficam deixadas de lado. A violência e a justiça são seletivas.

Qual o erro da política pública?

É exatamente não ter passado pela reforma citada anteriormente. A Constituição avançou em reformas estruturais e praticamente manteve a Justiça e a Segurança no seu modelo anterior. As alterações realizadas aconteceram somente no âmbito estadual e isso contribui às vezes para as ações da Polícia Militar. O modelo policial é caótico, pois temos duas instituições que competem entre si: a Militar e Civil. As autoridades deixam de integrar e essa divisão fragiliza ainda mais a segurança do país. A polícia age depois que o crime acontece; não atua de forma preventiva.

Há outros fatores que contribuem para o crescimento da violência?

A falta de gestão do sistema prisional também contribui para isso. Temos cerca de 750 mil presos para 350 mil vagas. Essa falta de gestão faz com que surjam facções criminosas, como o PCC. O sistema prisional precisa negociar constantemente com as organizações. O que temos hoje é uma guerra contra as drogas que entope as unidades prisionais e fortalece estas facções. A Justiça no Brasil é hiperseletiva e isso contribui para o caos na segurança.

Um dos ataques a ônibus ocorreu em Uberaba (Divulgação/Bombeiros)

Você acredita em uma mudança no modelo de segurança?

Há curto prazo, isso não acontecerá, pois os poderes do Estado não se movimentam, visto que eles são reféns das organizações policiais. A gestão policial se dá entre pactos para manter tudo como sempre esteve, atendendo às demandas corporativas. O sistema de Justiça é elitista e está a proteger as classes médias em detrimento dos interesses das populações. A única coisa que aconteceu foi a criação do Conselho Nacional de Justiça. Para termos uma reforma no sistema de segurança seria necessário uma nova Constituição, pois o que temos hoje é a repetição do modelo da Ditadura Militar com uma pequena maquiagem.

Qual sua visão da atuação de facções criminosas, como o Primeiro Comando da Capital (PCC)?

O PCC é uma organização que controla o crime de dentro do sistema prisional e foi ‘exportada’ pelo Brasil. A atuação de facções criminosas se dá pelo fato do Estado não conseguir controlar e gerir o sistema prisional. Por conta disso, é necessário que governos e facções realizem ‘pactos’ para a ordem ser instaurada. Em São Paulo, por exemplo, a diminuição no número de homicídios em longo prazo se deu pela hipótese de um pacto informal entre governo estadual e PCC. Esse ponto é interessante, pois em Minas Gerais, para ilustrarmos, houve uma queda na criminalidade nos últimos 30 anos, porém os indicadores não se mantêm e voltam a subir. Por ano, o custo do sistema prisional em Minas de R$ 2 bilhões. Com isso, o Estado não tem mais dinheiro, pois já está totalmente inviabilizado o sistema. Uma ordem vinda da prisão pode provocar desde a queima de ônibus ao aumento da disputa por pontos de drogas. Assim, para termos o mínimo de estabilidade, é preciso que o Estado negocie com as facções.

Na última semana tivemos a invasão do Palácio da Liberdade, sede do governo de Minas Gerais, por agentes de segurança. Qual a sua opinião sobre o assunto?

Aquilo foi um movimento de viés político-eleitoral. De 2003 a 2015, o segmento com mais investimentos e remuneração foi o da segurança e isso foi condição para a estabilidade no Estado. Estávamos em um período de vacas gordas. Agora o governo não consegue atender de forma rápida as solicitações e o que temos são as chantagens. Como estamos em ano eleitoral, este é o momento para eles aparecerem. As reivindicações são mais por salários do que para manter a ordem em Minas.

Vitor Fórneas[email protected]

Repórter do BHAZ de maio de 2017 a dezembro de 2021. Jornalista graduado pelo UniBH (Centro Universitário de Belo Horizonte) e com atuação focada nas editorias de Cidades e Política. Teve reportagens agraciadas nos prêmios CDL (2018, 2019 e 2020), Sebrae (2021) e Claudio Weber Abramo de Jornalismo de Dados (2021).

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