SP terá toque de recolher, fecha escolas, restringe comércio, proíbe cultos e futebol em fase emergencial de 15 dias

João doria coletiva de imprensa
Doria anuncia lockdown em São Paulo e suspensão de atividades (Governo do Estado de São Paulo/Divulgação)

Por Igor Gielow

Sob risco de colapso em seu sistema de saúde, devido à escalada da transmissão do coronavírus, o governo de São Paulo decretou uma fase emergencial mais dura de seu plano de combate à pandemia a partir da segunda-feira (15). Inicialmente, as restrições valerão por 15 dias. O quadro pintado pelo governador João Doria (PSDB) e outras autoridades foi o mais sombrio, e as medidas, as mais restritivas até aqui na crise sanitária.

Haverá um toque de recolher das 20h às 5h, período em que as pessoas deverão ficar em casa e poderão ser abordadas para orientação. Não haverá multa. Autuações seguirão sendo aplicadas a donos de estabelecimentos que promovam aglomerações, como é hoje. A frequência de praias e parques estará vetada. Haverá blitze de fiscalização pela PM e pela Polícia Civil. Como já ocorre desde o começo da pandemia, quem estiver sem máscara poderá ser multado. “Não estamos fazendo um lockdown”, disse Doria.

Na cidade de São Paulo, a ideia do pacote é reduzir em 4 milhões o número de pessoas circulando diariamente -a capital tem 12 milhões de habitantes. O transporte coletivo segue funcionando, mas é recomendado um escalonamento de entrada no trabalho por categorias ao longo do dia para aliviar a lotação de ônibus e trens.

A fase emergencial, que não altera a escala de cores do Plano SP de manejo econômico da crise, inclui um fechamento de colégios estaduais. Para não atrapalhar o calendário, os recessos de abril e outubro serão adiantados -oficialmente, de 15 a 28 deste mês.

As escolas seguirão parcialmente abertas para atender alunos vulneráveis que precisem de alimentação ou que precisem de equipamento para aulas remotas. Na rede privada, isso será opcional, mas as regras que limitam a 35% de ocupação seguem valendo.

Ao todo, 14 setores econômicos serão afetados pelo endurecimento de regras. Supermercados e farmácias seguirão abertos, mas depois das 20h pessoas são recomendadas a não frequentá-los. Como serviço essencial, eles têm horário liberado na fase vermelha, a mais restritiva, em vigor desde o sábado (6).

Serão excluídas dessas classificação lojas como as de material de construção, que terão de fechar. Cultos religiosos, que haviam sido permitidos na última reclassificação do Plano SP, serão suspensos -fiéis poderão ir rezar individualmente.

Jogos de futebol seguirão o mesmo caminho, à revelia da federação paulista. Escritórios e serviço público não essenciais terão suas atividades presenciais vetadas. Serviços de retirada de alimentos e produtos nos estabelecimentos está vetado, mas o delivery segue permitido.

Em vídeo gravado e distribuído em redes sociais, o governador Doria afirma que as medidas serão impopulares. “Vou honrar o cargo que ocupo, mesmo que isso custe minha popularidade. Vocês me elegeram para cuidar de vocês, não para cuidar de mim”, afirmou. “Nossos hospitais estão chegando no limite máximo de ocupação. Temos de adotar medidas mais duras de distanciamento social”, disse.

“É uma decisão dura, impopular, difícil. Me solidarizo com todos. O Brasil está colapsando, e se nós não frearmos o vírus, não será diferente em São Paulo”, disse o governador. Em entrevista coletiva, se disse “muito triste de ter de anunciar” a nova fase.

Doria divulgou um vídeo mostrando diversos hospitais estaduais lotados, com a retomada do slogan “#FiqueEmCasa”, que já havia voltado ao lugar do “#VacinaJá” no púlpito usado por Doria no Palácio dos Bandeirantes.

“Nesse período [da pandemia], acertamos e erramos. Nenhum governante quer parar as atividades econômicas”, afirmou o tucano. Disse que apenas a vacinação, promovida principalmente pelo esforço paulista em fabricar a Coronavac, e o isolamento superarão a crise.

Doria voltou a criticar a gestão do governo Jair Bolsonaro na pandemia. “Estamos fazendo o máximo que podemos, mas precisamos de mais vacinas”, disse.

Também deverá ser criado um Comitê de Emergência da crise, liderado pelo atual secretário-executivo do Centro de Contingência da Covid-19, João Gabbardo. Ele terá poderes de coordenação sobre o sistema de saúde, em conjunto com o secretário da área, Jean Gorinchteyn.

O titular da Saúde vem sendo criticado internamente no governo por declarações consideradas apressadas, como a defesa do fechamento de escolas na semana passada. Já Gabbardo, egresso da equipe de Luiz Henrique Mandetta no Ministério da Saúde, é estrela em ascensão.

“Não vai ter leito para todo mundo. Muita gente vai morrer se não implementarmos essas medidas. Empreendedores de sucesso morrerão com muito dinheiro na conta. Não temos vacina para todo mundo, não há milagre. Nada nos resta, só o distanciamento”, disse Gabbardo.

“Quem tem plano de saúde bom não terá leitos em hospitais privados”, afirmou, num grau de crueza antes não visto no manejo da pandemia.

Hoje o centro, com 21 especialistas e autoridades, tem caráter consultivo. Há sempre divisão no colegiado, com médicos pedindo medidas mais duras, como lockdown, que sofre grande resistência da área política do governo.

O endurecimento das medidas é consequência do colapso em curso no sistema de saúde paulista, um dos mais avançados do país, sob o peso do aumento de casos e óbitos relacionados à circulação de variantes mais transmissíveis e talvez letais do Sars-CoV-2.

“Hoje, um em cada três dos nossos pacientes em UTI vai morrer. Se interrompermos o vírus, salvaremos talvez 40 vidas por dias nas próximas semanas”, afirmou Paulo Menezes, coordenador do Centro de Contingência.

O avanço da doença ocorreu mesmo com a implantação da fase vermelha, a mais restritiva e que só permite a abertura de serviços essenciais, que teve pouco efeito sobre o isolamento social no estado.

Na terça (9), apenas 43% dos paulistas estavam isolados, segundo o rastreamento por dados celulares do governo. A nova fase emergencial não terá uma classificação por cor.

Para epidemiologistas, 60% é um índice desejável para coibir a circulação do vírus -índice que nunca foi atingido, fora em alguns dias, desde o começo da pandemia no estado. O Palácio dos Bandeirantes se diz satisfeito se conseguir chegar a 50%.

A Covid-19 galopa pelo país, onde ceifou mais de 2.300 vidas, recorde na pandemia, na quarta (10). Em São Paulo, foram 469 óbitos no dia, após o topo de 517 mortos registrados na véspera. “Nunca foi visto isso no país”, disse Gorinchteyn.

Ao todo, o estado já teve 63.010 mortes desde o começo da pandemia, declarada como tal há exato um ano pela Organização Mundial da Saúde.

A situação foi definida por Doria como “dramática”. Em duas semanas, o número de pessoas internadas em terapia intensiva saltou de 6.657 para 9.184, apontando para uma saturação da rede. Hoje há uma fila de 2.046 pessoas para atendimento, 35% delas esperando vaga em UTI.

O tucano determinou a abertura de novos leitos em regime de urgência, mas o temor é de que eles não cheguem a tempo.

A ocupação de UTIs no estado todo está em 87%, segundo dados do governo. A situação é semelhante na Grande São Paulo.

A tragédia sanitária atingiu o país de forma uniforme em 2021, diferentemente de 2020, quando as ondas se sucediam de forma diferente em cada região. São Paulo, como “hub” do país, centro de circulação de pessoas e mercadorias, vinha segurando o risco de um colapso até aqui.

Mas a velocidade maior de transmissão de variantes como a P.1, originária de Manaus, mudou o quadro. São 20 dias de aumentos de índices.

Além disso, a evidência empírica é a de que pessoas mais jovens são afetadas, e demoram mais para sair de UTIs, congestionando o sistema. “Mais jovens estão comprometidos”, disse o secretário de Saúde.

“Na segunda-feira tínhamos 32 municípios com 100% de ocupação, hoje temos 53. Estamos aumentando leitos, mas não é tão célere quanto a pandemia. Precisamos da ajuda de todos, é uma pandemia diferente da do ano passado”, disse Gorinchteyn.

A falta de comprometimento da população com medidas restritivas em épocas de festas recentes, como Natal e Carnaval, piorou a situação. Há também resistência por parte do comércio não essencial, que tenta driblar as restrições.

Concorre para piorar a situação a lentidão da vacinação, cortesia da falta de iniciativa e coordenação por parte do governo Bolsonaro, ao menos até agora -o presidente prega como convertido, ciente do dano eleitoral que seu negacionismo trouxe, e diz estar atrás de imunizantes.

O problema é que isso deveria ter sido feito há meses, quando laboratórios como o Butantan e a Pfizer ofertaram vacinas ao Brasil. Agora, o mercado vive escassez dos produtos e de seus insumos.

Folhapress

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