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Estudantes da UFMG enfrentam falta de estrutura e de apoio financeiro para atividades de campo

12/12/2024 às 19h01 - Atualizado em 13/12/2024 às 08h05
'Descaso': estudantes do IGC da UFMG fazem paralisação após outro cancelamento de atividade de campo
Trabalhos de campo são obrigatórios nos cursos oferecidos no Instituto de Geociências (Redes Sociais/Reprodução)

Estudantes de alguns cursos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) estão enfrentando, há meses, uma série de problemas relacionados às atividades de campo, que são obrigatoriamente cobradas na carga horária de algumas disciplinas e são consideradas “essenciais” para a formação dos alunos. Os relatos dão conta da falta de infraestrutura, de apoio financeiro e até de risco à saúde. Em nota enviada ao BHAZ, a UFMG declara que lamenta o cancelamento da atividade de campo desta semana no Instituto de Geociência e que tem trabalhado para minimizar os impactos do envelhecimento da frota de veículos do IGC.

“O IGC tem, hoje, seis veículos, com idade média de dez anos, e que são usados em cerca de 350 atividades de campo, anualmente. A UFMG esclarece que tem trabalhado para minimizar os impactos do envelhecimento de uma frota com intensa demanda de uso. Foi adquirido, recentemente, para o IGC, um micro-ônibus novo com capacidade para 32 pessoas A expectativa é de que o veículo comece a ser utilizado no início de 2025, quando deve ser concluído o processo de seguro, uma exigência legal para que ele possa ser utilizado”, diz a instituição em nota enviada ao BHAZ.

Os estudantes da Geologia, Geografia e Turismo realizaram uma paralisação na portaria do prédio do Instituto de Geociências (IGC) nesta quinta-feira (12), após mais uma atividade de campo ser cancelada.Os alunos alegam “descaso” da universidade e a “falta de ferramentas necessárias” em relação aos trabalhos externos. Alunos de outras áreas, como Biologia e Medicina Veterinária, também se queixam dos problemas.

De acordo com Raquel Abood, vice-presidente do diretório acadêmico do IGC e estudante de geologia, os alunos matriculados na disciplina de geomorfologia haviam se organizado, há meses, para realizar uma atividade no Parque Nacional Cavernas do Peruaçu, em Januária, na região do Médio São Francisco, em Minas Gerais, há 645 km de BH. A saída estava marcada para essa quarta-feira (11), porém, precisou ser cancelada após o ônibus, que os levariam até o destino, quebrar.

“Nesta segunda, fomos informados que o campo não poderia acontecer, porque não teríamos o transporte necessário para fazer a viagem. Para chegar até o Parque, precisávamos de um ônibus menor, já que apenas ele conseguiria passar por uma parte do trajeto. Por isso, decidimos usar um veículo maior até onde seria possível e, depois, pegaríamos outra condução, que seria custeada pelo professor. Foi confirmado que poderíamos usar esse ônibus maior, mas, na terça, ele teve um problema com a mangueira e a atividade precisou ser cancelada”, explicou.

Essa situação, ainda conforme Raquel, não é um fato isolado, pois, constantemente, os estudantes têm trabalho externos cancelados, precisam lidar com a falta de infraestrutura dos ônibus e veículos quebrados durante o percusso – colocando em risco a segurança e saúde de todos em campo. “Estamos exaustos. Nós percebemos que uma atividade essencial para a nossa formação não estava sendo valorizada pela universidade, assim como o trabalho do professor”, disse.

Para lidar com a situação, os discentes dos cursos ofertados pelo IGC organizaram uma mobilização e ergueram as barracas, que seriam usadas durante os dias no Parque do Peruaçu, na porta e dentro do prédio.

“Durante a nossa primeira reunião, ainda que tenha partido de uma turma de geologia, tivemos a participação de estudantes de outras áreas que também necessitam das atividades de campo, como Biologia, Aquacultura e Medicina Veterinária. Assim, conseguimos notar que essa pauta não é só nossa, é um problema coletivo, porque eles também passam pelos mesmos problemas”, disse.

A intenção, conforme a estudante, é conseguir respostas da Reitoria, e que os trabalhos fora da UFMG possam ser realizados de uma maneira que preserve a integridade de todos. “Não temos a quantidade de ônibus suficiente para o número de alunos, os que nós temos não têm a manutenção adequada, não há motoristas e o auxílio estudantil para as viagens tem o valor baixo para arcar com os nossos cursos. Temos que debater o repasse de verbas da reitoria, quais são as prioridades e entender como estão sendo disputados o próprio orçamento federal para educação”, explicou.

‘Morosidade nos processos’

Ao BHAZ, o vice-diretor do IGC, Thiago Novo, explicou que o problema maior não está relacionado à verba disponibilizada pela reitoria, mas sim a morosidade que envolve os processos de aplicação do dinheiro. “Tudo que envolve dinheiro público tem a benesse de ter toda a transparência necessária para evitar transtornos na licitação, mas há uma lentidão para conseguir aplicá-lo. A reitoria nos auxilia muito e mantém um diálogo, mas os trâmites e a burocracia são gigantescas”, informou.

Entre os problemas, ainda segundo Novo, está as condições dos veículos, já que o último transporte da frota foi adquirido em 2017. Atualmente o IGC tem dois micro-ônibus, com capacidade de 32 pessoas cada, um ônibus, com 48 lugares, e duas vans, com 20 lugares cada. Em média mil alunos estudam no IGC, sendo realizados, anualmente, entre 300 a 350 trabalhos de campo.

“Este ano, conseguimos comprar, junto à reitoria, um ônibus novo, mas ele está em processo de emplacamento e de contratação do seguro. Acreditamos que, até o início de 2025, ele já pode ser utilizado. Mas, não é suficiente, porque os outros estão sim muito antigos e sucateados para o uso diário e, querendo ou não, há possibilidade de manutenção emergencial inesperada”, afirma.

Outro impasse é o número de motoristas, pois o cargo foi extinto por uma lei federal, o que impede novas contratações. “Temos apenas três trabalhadores e todos estão na idade de aposentar. Dessa forma, muitas vezes, não temos profissionais para dirigi-los e precisamos, às vezes, pedir motorista para a divisão externa de transporte da UFMG. Toda essa morosidade em processos licitatórios causam esses transtornos, como o cancelamento do trabalho dos estudantes de geomorfologia”, explicou.

Novo também destaca a questão envolvendo o auxilio que a universidade disponibiliza aos estudantes para custear os valores envolvendo hospedagem e alimentação. Desde o fim do ano passado, alunos de geologia nível 1 da Fundação Mendes Pimentel (Fump), recebem R$ 90 por dia, enquanto os demais, que não necessitam de auxilio estudantil, o valor é de R$ 50. Antes disso, o recurso para todos era R$ 30.

“Estávamos entre as universidades que ofereciam o menor auxílio do país, porque o valor ficou congelado durante 12 anos. No fim do ano passado, fiz um levantamento para avaliar os recursos proporcionados por outras universidades e estávamos aquém. Conversei com a reitora na época, conseguimos aumentar e ficar na média nacional. Porém, ainda é insuficiente e o intuito é fazer com que o auxílio cresça”, ressalta.

O vice-diretor afirma que não há um parâmetro nacional que defina o valor e, por isso, cada instituição define. “Tem algumas faculdades que conseguem oferecer um auxílio maior, porque tem o dinheiro complementar de fundações, como a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFGRS), que, até o final de 2023, oferecia R$ 180”, disse.

O objetivo é que, no início do próximo ano, um edital licitatório seja lançado, o que permitirá a parceria com órgãos privados, “A ideia é conseguir um pacote completo, com motorista e ônibus incluído. Será uma prestação de serviço que acontecerá até o fim da atividade de campo. Essa contratação irá zerar os nossos problemas, mas, até ele sair, continuamos com essa restrição. Como citei anteriormente, as morosidades da burocracia dificultam, porque a previsão pode ser adiada”, explica Novo.

Atividades essenciais

O vice-diretor também disse que compreende a frustração dos estudantes, tendo em vista que as atividades de campo são essenciais para a formação dos profissionais. No curso de geologia, o Ministério da Educação (MEC) exige uma carga horária de 360h destas atividades.

“É algo ímpar e indispensável para o aprendizado dos alunos de graduação e pós-graduação, porque, na sala de aula, eles têm acesso à teoria, enquanto no trabalho de campo, eles conseguem aplicá-lo na prática e fazer a ponte do desenvolvimento pedagógico. Os estudantes conseguem transformar as informações em conhecimento significativo e solidificar o conceito com embasamento crítico. Fazendo um paralelo, todo mundo prefere fazer uma cirurgia com um médico que já teve aulas práticas de como executá-la”, conta.

Raquel explica que o trabalho de campo começa na sala de aula, quando todo o conhecimento teórico é passado, além do processo de organização e planejamento da atividade realizada no local que será estudado. “Também temos aulas em laboratório, mas, a maioria, é fora da UFMG. Por isso, vamos até a área e estudamos, observamos e entendemos não somente os fenômenos que acontecem ali, mas também o porquê deles acontecerem. É imprescindível”.

Ainda que todos os cursos do IGC tenham nota cinco no MEC, Novo entende que a universidade têm algumas prioridades na destinação dos recursos subsidiados pelo Governo Federal, como o Hospital Universitário. “Entendo que o IGC é uma parte muito pequena em comparação ao todo da UFMG. Então, conseguir recurso não é tão simples, porque há um ranqueamento de necessidade que é prioritário, e compreendo perfeitamente. Por isso, tentamos buscar outras soluções”, afirma o vice-reitor.

Em nota enviada ao BHAZ, a UFMG destacou a redução do orçamento destinado às universidades públicas no país, mas reafirmou o compromisso de buscar soluções.

“Apesar da inviabilidade para a substituição integral da frota, devido à redução do orçamento das universidades públicas brasileiras, que sistematicamente tem sido deteriorado há mais de uma década, a UFMG tem adotado outras medidas para evitar adiamentos futuros de atividades de campo, como, por exemplo, um processo para a contratação de um serviço completo de transporte para os trabalhos de campo, que inclui ônibus e motorista, cujo edital de licitação está em fase de publicação. Além disso, em 2023, houve um aumento no auxílio discente para a realização de trabalhos de campo que envolvem pernoite”, diz a nota..

Nota da UFMG na íntergra

A Universidade Federal de Minas Gerais lamenta o cancelamento da atividade de campo desta semana no Instituto de Geociências (IGC). O IGC tem, hoje, seis veículos, com idade média de dez anos, e que são usados em cerca de 350 atividades de campo, anualmente. A UFMG esclarece que tem trabalhado para minimizar os impactos do envelhecimento de uma frota com intensa demanda de uso. Foi adquirido, recentemente, para o IGC, um micro-ônibus novo com capacidade para 32 pessoas A expectativa é de que o veículo comece a ser utilizado no início de 2025, quando deve ser concluído o processo de seguro, uma exigência legal para que ele possa ser utilizado.

Apesar da inviabilidade para a substituição integral da frota, devido à redução do orçamento das universidades públicas brasileiras, que sistematicamente tem sido deteriorado há mais de uma década, a UFMG tem adotado outras medidas para evitar adiamentos futuros de atividades de campo, como, por exemplo, um processo para a contratação de um serviço completo de transporte para os trabalhos de campo, que inclui ônibus e motorista, cujo edital de licitação está em fase de publicação. Além disso, em 2023, houve um aumento no auxílio discente para a realização de trabalhos de campo que envolvem pernoite.

A UFMG garante o seu compromisso com o ensino, a pesquisa e a extensão, bem como com a preservação de sua comunidade acadêmica e não mede esforços na busca de soluções para as suas mais variadas demandas institucionais.

Ana Magalhães

Estudante de Jornalismo na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Foi estagiária do Jornal Estado de Minas e do programa Agenda da Rede Minas de Televisão. Estagiária do BHAZ desde agosto de 2024.
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Ana Magalhães

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Estudante de Jornalismo na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Foi estagiária do Jornal Estado de Minas e do programa Agenda da Rede Minas de Televisão. Estagiária do BHAZ desde agosto de 2024.

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