Mulheres que acusaram Marcius Melhem de assédio sexual quebram silêncio em entrevista conjunta

vítimas e testemunhas
Dani Calabresa, Georgiana Góes, Renata Ricci e Veronica Debom e suas testemunhas falaram sobre assédio de Marcius Melhem (Reprodução/YouTube)

Quatro mulheres que acusam o humorista Marcius Melhem de assédio sexual quebraram o silêncio sobre o caso, pela primeira vez. Em uma reportagem especial, divulgada nesta sexta-feira (24), o colunista Guilherme Amado, do Metrópoles, entrevistou as vítimas e outras sete testemunhas do caso.

Dani Calabresa, Georgiana Góes, Renata Ricci e Veronica Debom acusam Melhem de assédio sexual. Na primeira parte da reportagem, as vítimas deram uma entrevista conjunta com as testemunhas Maria Clara Gueiros, Eduardo Sterblicht, Marcelo Adnet, Cininha de Paula, Mauro Farias, Warchavsky e Luciana Fregolente.

“Quando saiu na imprensa a notícia sobre o assédio sofrido pela Dani, eu entendi todos os comportamentos típicos de assédio que estavam acontecendo, tudo o que eu tinha ouvido falar quando comecei na TV Globo. Eu entendi que era verdade, que eu tentei bloquear um tempo como se não fosse”, disse Carolina Warchavsky.

‘Caso Marcius Melhem: elas falam’

O vídeo com o relato das vítimas, intitulado “Caso Marcius Melhem: elas falam” tem 1 hora e 20 minutos de duração. Nele, o grupo contou que Marcius Melhem costumava manter as atrizes sob seu domínio, impedindo que elas participassem de novelas.

Além disso, Melhem, que era diretor do Núcleo de Humor da Globo, tinha o costume de contracenar encostando o pênis ereto em atrizes ou tentando usar a língua durante as cenas de beijo.

“Estava insustentável trabalhar em um ambiente em que eu comecei a perceber que eu era barrada dos convites; que eu não era liberada para as coisas; que eu estava trabalhando com tremedeira; que ele se aproveita das brincadeiras para brincar ereto; que ele pega de verdade; ele tenta enfiar a língua de verdade”, disse Dani Calabresa.

“Não é selinho, não é piada, não é brincadeira”, acrescentou a humorista. Os entrevistados relataram que Marcius Melhem fazia com que outros funcionários sentissem que eles deveriam ter um permanente sentimento de dívida e de gratidão com ele.

Falta de limite e relação tóxica

Segundo as testemunhas, o ambiente de trabalho era tóxico, e os assédios eram sempre confundidos com brincadeiras, numa mistura em que a linha entre chefe e funcionários acabava sendo fluida.

“O que me chamava mais atenção era uma certa falta de vida pessoal. Ele queria transformar aquela coisa do trabalho, a espontaneidade das relações profissionais, para a vida dele”, declarou o ator Marcelo Adnet.

‘Momentos de constrangimento’

O grupo contou que Melhem tinha certo poder nas mãos por ser o único diretor de humor da Globo. Hoje, olhando para a relação de trabalho que eles tinham com Melhem, todos definem como uma convivência marcada por assédios morais.

“Para mim o ambiente do Núcleo de Humor da Globo era muito divertido, mas tinham momentos de constrangimento, que eu demorei para entender que não eram normais e tinham o nome de assédio”, disse a atriz Georgiana Góes.

‘Marcius Melhem: ele fala’

No segundo vídeo da série, intitulado “Caso Marcius Melhem: ele fala”, o colunista do Metrópoles deu o direito de resposta ao ex-diretor sobre os assédios. Ele se isentou das acusações, porém, admtiu que pode ter errado com algumas das mulheres.

“Tem gente que publica essa carta do compliance dizendo que a TV Globo comprovou um assédio que não existe. A carta da emissora não fala em assédio. Eu cometi erros — eu assumo que cometi — eu nunca disse que eu não cometi erros”, disse o humorista.

Na entrevista, Melhem declarou que pode “ter passado do ponto” com Dani Calabresa, mas disse não ver assédio na relação que tinha com a humorista. Guilherme Amado, o colunista, questionou se Marcius não percebia que as repetidas tentativas frustradas em relação à Dani não são assédio.

Melhem via sinal de Calabresa para prosseguir

O humorista respondeu que entedia as brincadeiras e mensagens carinhosas mandadas no WhatsApp por Dani Calabresa como um sinal para que ele prosseguisse. “Ela [Dani Calabresa] nunca me disse ‘não’. Só disse ‘sim’. Você não pode desdizer que você tinha uma intimidade, que você brincava”.

“Se a Dani Calabresa tivesse me dito em qualquer momento: ‘Não, não quero’, ou dado a entender isso, eu teria parado imediatamente. Ela me dava sinais repetidos de que existia uma intimidade entre nós”, disse Marcius Melhem.

Dani Calabresa explica mensagens

A humorista, por sua vez, explicou em sua entrevista o motivo de agir assim com Melhem. “Não tem um manual de instrução para lidar com uma situação que te deixa constrangido. Cada uma lida de um jeito, né?”.

“Eu lidava com brincadeira, sabe? Ele falava: ‘Tá gata’. Eu respondia: ‘Deus te pague’, ‘É porque você não viu o buço’, ‘Sai tudo no banho, a maquiagem sai’, ‘Ai Deus te pague. Obrigada pelo elogio, mas é um amigão’”, adicionou Dani.

“Mas tenta se colocar no meu lugar. Eu amava trabalhar nesse ambiente e para não criar uma briga com o meu chefe, eu fingia que achava engraçado. Eu cortava ele pessoalmente e compensava na mensagem”, completou.

Mensagens como defesa de Melhem

Marcius Melhem usa mensagens de WhatsApp amistosas entre ele e as denunciantes como ponto principal de sua estratégia de defesa. Para ele, isso prova que as mulheres não sofreram assédio.

No entanto, as vítimas contaram que a insistência do ex-diretor as traumatizou a ponto de quererem sair da Globo. “Eu também não queria comprar briga com o chefe, porque eu amo trabalhar. Então, comprar briga com ele, sabe?”, pontuou Calabresa.

“Custaria mesmo a minha carreira. Só que chegou um ponto que eu queria sair. Para mim, eu não tinha medo de sair. Eu tinha medo de ficar”, relatou. A TV Globo rescindiu o contrato com o humorista em agosto de 2020.

“Quando eu perguntei para a TV Globo na época qual é a prova que eu tenho então que não houve assédio?. Eles responderam: ‘A prova que você tem é a sua saída com todos os direitos e com a sua carteira de trabalho limpo’”, disse Marcius.

O que diz a TV Globo?

A respeito disso, a TV Globo enviou uma nota à coluna dizendo que “sempre que solicitada, forneceu às autoridades todas as informações sobre o caso, que refletem precisamente o que ocorreu à época no processo de compliance e no desligamento de Marcius Melhem”.

Sobre outros momentos em que foi citada na entrevista, a emissora afirmou que “mantém um Código de Ética em linha com as melhores práticas atualmente adotadas, que proíbe terminantemente o assédio e deve ser cumprido por todos os colaboradores”.

“Nesse mesmo Código, assumimos o compromisso de sigilo em relação a todos os relatos de Compliance, razão pela qual não fazemos comentários sobre as apurações”, declarou a TV Globo em outro trecho da nota.

Reportagem especial na íntegra

O colunista Guilherme Amado publicará outras reportagens em texto com trechos das entrevistas das denunciantes, de suas testemunhas, de Marcius Melhem e também de pessoas favoráveis a ele: Nelito Fernandes, Gabriela Amaral e Alice Demier.

As demais partes da reportagem especial serão divulgadas ao longo desta sexta-feira e no fim de semana. Confira a entrevista completa com as mulheres e suas testemunhas neste link, e a entrevista com Marcius Melhem aqui.

Edição: Giovanna Fávero
Andreza Miranda[email protected]

Graduada em Jornalismo pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e repórter do BHAZ desde 2020. Participou de duas reportagens premiadas pela CDL/BH (2021 e 2022); de reportagem do projeto MonitorA, vencedor do Prêmio Cláudio Weber Abramo (2021); e de duas reportagens premiadas pelo Sebrae Minas (2021 e 2023).

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