Uma recém-nascida era torturada pelos pais em Jaboticatubas, na região metropolitana de Belo Horizonte. A bebê, que hoje tem 11 meses, sofria com as agressões desde o primeiro mês de vida. O caso foi investigado pela Polícia Civil, e as conclusões do inquérito foram divulgadas nesta quinta-feira (13).
As investigações começaram em março deste ano. De acordo com o delegado Victor Vasconcelos de Mattos, a polícia foi acionada pelo MPMG (Ministério Público de Minas Gerais) para que apurasse uma denúncia de maus-tratos contra a bebê. O MP, por sua vez, tinha sido comunicado pelo Conselho Tutelar municipal, que acompanhava o caso da criança desde que ela foi internada, pela primeira vez, em um hospital da cidade, depois de uma fratura no fêmur.
Fratura no fêmur
Quando a criança tinha apenas um mês, foi levada para a Fundação Hospitalar Santo Antônio por causa de uma fratura no fêmur. “O fêmur é um osso muito forte, resistente, e isso chamou a atenção dos médicos”, conta o delegado. Ela permaneceu um tempo internada, e isso chegou ao conhecimento do Conselho Tutelar, que começou a fazer visitas periódicas depois que a criança voltou pra residência de seus pais.
Em uma das visitas desavisadas dos conselheiros, a menina, já com 4 meses, foi encontrada com febre alta e chorando muito. Ela foi novamente encaminhada para atendimento médico na cidade, mas, como o quadro de saúde era grave, precisou ser transferida para o Hospital João XXIII, na região Leste da capital mineira.
A criança ficou internada por cerca de um mês, sendo mais de uma semana na UTI, correndo risco. Foram duas internações graves no intervalo de apenas três meses. A partir do episódio, houve a comunicação ao Ministério Púbico, que informou à polícia civil, e as investigações tiveram início.
16 costelas
A partir do inquérito, a polícia concluiu que os pais estavam efetivamente torturando a criança. “Não era uma caso de agressões pontuais, mas de tortura”, explica o delegado. Além da fratura do fêmur consolidada, o bebê tinha 10 costelas da esquerda fraturadas consolidadas, e 6 costelas da direita também fraturadas recentemente.
“O fato de você ter 16 costelas quebradas, em períodos distintos, mostra que isso não é um acidente, como narrado pelos pais, que relataram que a criança tinha caído. Na verdade, as versões dos pais foram fantasiosas e combatidas pelos elementos do inquérito policial e a perícia médica. O perito disse expressamente que essas lesões foram causadas por meio de um trauma de alto impacto, gerando contusão pulmonar, com prejuízo das costelas. A criança quase morreu”, conta.
Até a versão apresentada pelos dois era conflituosa, mesmo compartilhando o advogado. “Eles acabaram apresentando versões diferentes. Ela afirmou que foram quedas, que a criança teria caído tomando banho, e aliado a isso a mãe teria sentado na criança, o que gerou a fratura de fêmur. Já o pai alega que todas as fraturas – costela e fêmur – foram causada em razão de uma queda durante um banho, o que foi fortemente afastado pelo laudo”, afirma.
“A perícia afirma que foi gerado um trauma de alto impacto. O laudo expressamente diz que foi usado um meio cruel, que afasta a possibilidade de uma queda”, explica o delegado.
Crime de tortura
O pai, de 21 anos, que é auxiliar de pedreiro, foi indiciado pelo crime de tortura, com uma qualificadora que aumenta a pena, por ter gerado lesão corporal grave que quase matou a criança, e uma causa de aumento de pena, pelo fato de ter sido causada em uma pessoa menor de 12 anos.
Já a mãe, de 22, que é dona de casa, vai responder pelo crime de tortura por omissão. “Concluímos que ela não praticou os atos de agressão, mas como mãe, detentora do poder familiar, tinha o dever de agir, comunicar os fatos para as autoridades”, diz o delegado.
De acordo com Mattos, o casal não tinha passagens pela polícia, mas foi verificado que o homem faz uso de drogas. Ambos foram indiciados por crimes distintos, apesar de estar na modalidade de tortura. Ainda de acordo com o delegado, o pai está sujeito a uma pena de 8 a 10 anos, enquanto a mãe uma pena menor, de 1 a 4 anos, a depender da avaliação do juiz.
O casal não tem outros filhos e morava sozinho com o bebê. Há cerca de 4 meses, a criança foi retirada do convívio dos pais, que tiveram o poder familiar suspenso, e foi encaminhada a uma instituição de acolhimento, um procedimento padrão.
“Nós acreditamos que, pela idade, com 11 meses, ela será adotada logo e terá um recomeço. Para que no âmbito de uma família substituta ela possa ser amada, possa aproveitar a convivência familiar longe desse ambiente trágico em que ela estava inserida”.
“O que a gente percebe é que, infelizmente, esses casos não são de todo excepcionais, então se as pessoas tomarem conhecimento eventualmente de maus tratos, de agressão, informem as autoridades para que a gente possa investigar”, finaliza o delegado.