‘Patamares de 2006’: UFMG sofre cortes no orçamento e teme pelo futuro

Campus UFMG
Orçamento de 2021 pode ser até 36,5% inferior ao do ano passado (Amanda Dias/BHAZ)

Com a aprovação da Lei Orçamentária Anual (LOA) pelo Congresso Nacional em março deste ano, seguida do veto presidencial e de um bloqueio de recursos que afetou vários ministérios, a UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) sofre com cortes de orçamento que podem impactar negativamente o futuro da instituição. Os cortes podem resultar em uma redução de até 36,5% dos recursos discricionários destinados à UFMG neste ano, em comparação com 2020, o que compromete a capacidade de funcionamento adequado da universidade.

O veto presidencial reduziu em R$1,1 bilhão o orçamento do Ministério da Educação e afetou de modo não linear as universidades, atingindo principalmente os recursos de capital. Em seguida, houve um bloqueio orçamentário no MEC no valor R$2,7 bilhões, que resultou em perda linear de 13,8% no orçamento das Ifes (Instituições Federais de Ensino Superior).

Considerando o veto, a UFMG conta, em 2021, com R$157,72 milhões de recursos discricionários do tesouro, o que representa diminuição de R$50,57 milhões. Esse montante representa perda global de 26,72% em relação a 2020. O veto somado ao bloqueio poderá resultar na redução de até 36,5% dos recursos discricionários destinados à UFMG quando comparado ao ano passado. “É um dado assustador”, afirma a reitora Sandra Regina Goulart Almeida.

Se esse cenário se mantiver, a UFMG contará com apenas R$132,27 milhões para fechar suas contas em 2021, uma redução de R$ 76 milhões em relação ao ano passado. “Com esse orçamento, voltaremos aos patamares de 2006, ou seja, situação anterior à implantação do Reuni, o programa de expansão das universidades federais”, completa.

Como evitar?

A UFMG ressalta que bloqueios e vetos presidenciais são modalidades diferentes de restrição orçamentária: enquanto os vetos representam um corte que somente poderá ser recomposto por meio de projetos de lei do congresso (PLN), os bloqueios podem ser desfeitos, ao longo do ano, pelo Ministério da Economia, de acordo com a disponibilidade orçamentária.

“Teremos, portanto, que atuar ativamente em duas frentes: fazer um movimento para tentar desbloquear os 13,8% e, ao mesmo tempo, trabalhar com os parlamentares com vistas à recomposição do orçamento por meio de projetos de lei”, explica a reitora. Além disso, segundo ela, o limite de arrecadação de recursos próprios decorrentes de convênios celebrados com órgãos públicos e outras entidades foi reduzido em 52,17% na comparação com 2020. “Isso decorre dos limites orçamentários impostos pela lei do teto dos gastos públicos”, acrescenta.

Outra variável que agrava esse cenário é a nova forma de distribuição dos recursos, adotada no ano passado, quando a Lei Orçamentária Anual (LOA) passou a ser dividida em duas unidades: órgãos 26238 (no âmbito do orçamento geral do MEC) e 93217 (as chamadas Programações Condicionadas à Aprovação Legislativa, em que a liberação de recursos depende de autorização do Congresso).

Segundo a reitora, em 2020, 40% dos recursos da LOA foram alocados como programações condicionadas e desbloqueados ao longo do ano; os outros 60% foram liberados para empenho pelo MEC. Em 2021, a estratégia foi mantida, mas os percentuais se inverteram: 40% foram liberados por empenho via MEC e 60% foram condicionados e liberados na semana passada, com exceção do bloqueio de 13,8%, que na UFMG corresponde a 25 milhões.

A importância da universidade

Na avaliação de Sandra Goulart Almeida, o cenário atual, com essa sucessão de cortes, pode comprometer o futuro da UFMG e impactar também a economia local, regional e nacional. “Nossas universidades, além de desenvolverem atividades de ensino, pesquisa e extensão, influenciam a vida econômica e social dos municípios onde estão instaladas. Só a UFMG movimenta cerca de 60 mil pessoas na realização rotineira de suas atividades”, defende.

Em entrevista ao Portal UFMG, a reitora descreve como “contraditório” o contexto vivido pelas universidades federais, que enfrentam profundas dificuldades no momento em que desempenham papel decisivo no combate à pandemia de Covid-19 e conseguem, com todas as adversidades, se manter como instituições de excelência – a UFMG, por exemplo, foi a universidade federal mais bem avaliada pelo Inep.

“Para manter-se como instituição de excelência, preservando e aprimorando seus resultados, a UFMG precisa contar com orçamento compatível com sua capacidade e investimento sustentado em educação, ciência e tecnologia como política de Estado. Esses cortes não comprometem apenas o futuro da Universidade, mas também o futuro do país. A UFMG não pode parar e precisa continuar a atender às demandas da sociedade, sobretudo às de enfrentamento da Covid-19”, defende.

“São cortes incompatíveis com a situação que a universidade pública vive no momento. Somos responsáveis por 95% das pesquisas realizadas no Brasil. Além das atividades de formação, a UFMG mantém dois hospitais em funcionamento, atendendo pacientes com Covid-19, responsabiliza-se por cerca de 30% dos testes realizados para identificação do novo coronavírus em Minas, desenvolve sete projetos de candidatas vacinais – uma delas entre as três mais adiantadas no Brasil – e mantém mais de 200 pesquisas dedicadas ao enfrentamento dessa crise sanitária, que é também econômica e social”, completa.

Sobre o risco de fechamento da universidade, a reitora finaliza: “a UFMG não só é necessária, mas essencial e imprescindível, sobretudo no atual contexto de pandemia. Não existe essa opção [a do fechamento]. A sociedade depende muito da UFMG, ainda mais neste momento tão desolador e desafiador. Temos prioridades e vamos cumpri-las: bolsas, assistência, ensino, pesquisa e extensão. Mas todo o resto está ameaçado. Somos necessários para o país”.

Cortes prejudicam outras universidades

Não é só a UFMG que está sofrendo com os impactos dos cortes orçamentários: também em Minas Gerais, a UFSJ (Universidade Federal de São João del-Rei) corre riscos com a falta de repasses e, de acordo com o reitor Marcelo Andrade, a instituição pode só conseguir se manter até outubro. A declaração foi feita em coletiva de imprensa realizada na última semana, em que o responsável falou sobre os desafios que a universidade enfrenta com os novos cortes.

“A atual situação na qual nos encontramos é muito preocupante, por isso estamos fazendo todo o esforço de tentar recompor esses recursos e mostrar à população essa realidade, uma vez que a universidade é um patrimônio do povo brasileiro. É essencial que a sociedade seja envolvida neste contexto”, reforçou. “No nosso caso, precisamos recompor R$ 10 milhões e desbloquear os outros R$ 6 milhões. Caso contrário, na nossa instituição, na melhor das hipóteses, a gente chega até outubro”, detalhou.

A UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) também sinalizou que pode ter que encerrar as atividades a partir de julho. As informações foram divulgadas por meio de artigo enviado pela reitoria ao jornal O Globo. O documento relata o atual cenário de dificuldades financeiras por conta dos cortes de orçamento feitos pelo governo federal. O texto foi escrito pela reitora da UFRJ, Denise Pires de Carvalho, e pelo vice-reitor, Carlos Frederico Leão Rocha.

“É uma situação muito temerária para o nosso funcionamento. Nós temos poucos meses de fôlego, cerca de dois ou três, com base no orçamento livre. E mesmo com o orçamento condicionado vindo a ser aprovado, diante desse bloqueio a gente tem orçamento, no máximo, até o mês de agosto ou setembro. É uma situação muito crítica”, disse o pró-reitor de Planejamento, Desenvolvimento e Finanças da UFRJ, Eduardo Raupp.

Com UFMG

Edição: Giovanna Fávero
Sofia Leão[email protected]

Repórter do BHAZ desde 2019 e graduada em jornalismo pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). Participou de reportagens premiadas pelo Prêmio Cláudio Weber Abramo de Jornalismo de Dados, pela CDL/BH e pelo Prêmio Sebrae de Jornalismo em 2021.

SIGA O BHAZ NO INSTAGRAM!

O BHAZ está com uma conta nova no Instagram.

Vem seguir a gente e saber tudo o que rola em BH!