Professora do Cefet faz exigências ‘absurdas’ e alunos denunciam assédio

Cefet MG Campus 1
Entre as demandas da professora está a determinação de que a câmera fique ligada todo o tempo da aula (Reprodução/Cefet-MG)

Atualização às 13h15 do dia 26/08/2020: Esta reportagem foi atualizada para incluir o posicionamento enviado pela defesa da professora.

Uma professora do curso de engenharia de materiais do Cefet-MG está sendo acusada de praticar assédio moral contra alunos da instituição. Com o retorno das atividades, por meio de ensino remoto, a docente tem feito exigências consideradas “absurdas” pelos estudantes, além de intimidá-los. O Cefet-MG afirmou que a docente foi orientada e a decisão não reflete a posição da instituição. A professora, por sua vez, negou que tenha cometido excessos ou mesmo atuado em desacordo com as diretrizes da instituição.

Em email enviado para os estudantes, a educadora explicou como será feita a avaliação da disciplina. “TODOS os alunos deverão permanecer conectados e com a câmera ligada para que a presença seja confirmada a partir da aula de segunda”, exigiu.

No entanto, o próprio Cefet orientou os alunos, em uma publicação no site, sobre a não obrigatoriedade de câmera e microfone nas atividades. “[O aluno] pode participar das aulas síncronas sem ter um microfone ou câmera ligados ao seu computador”, definiu.

Por nota enviada por um escritório de advocacia, a professora alegou que, dos oito alunos matriculados, “seis enviaram emails concordando com a ligação da câmera”. “Os estudantes que demostraram problemas com suas câmeras, foram prontamente respondidos pela professora, que os acalmou com relação à exigência, direcionando-os para busca de recursos tecnológicos junto ao Cefet-MG e até emprestando um notebook a um deles”, afirmou, em trecho da nota (leia na íntegra abaixo).

Conexão

Na mensagem enviada aos estudantes, a professora ainda se mostrou intolerante com problemas técnicos na conexão. “Caso o aluno fique sem conexão, wi-fi, cabo, celular, etc. deverá comprovar via operadora que presta o serviço a falha no horário da aula para ter atividades repostas”, acrescentou.

O Dama (Diretório Acadêmico da Engenharia de Materiais do Cefet-MG) se pronunciou sobre a demanda da professora, por meio de nota no Instagram (leia na íntegra abaixo). O Dama relembrou a própria resolução publicada pela instituição. “As atividades avaliativas síncronas, que dependam de conectividade, devem prever possibilidades de substituição, a fim de atender estudantes que tenham algum problema de conexão”, citou.

Mais exigências

Na mesma mensagem, a professora demonstrou estranhamento com a quantidade de alunos matriculados. Por isso, ela ordenou que os discentes façam uma justificativa de próprio punho sobre a escolha da disciplina. “Justificativa pressupõe que vocês me convençam de algo”, escreveu.

O diretório acadêmico também repudiou esse requerimento. “Todo aluno tem o direito de se matricular na disciplina que quiser, caso tenha os pré-requisitos para cursá-la e número de créditos disponíveis, sem a necessidade de convencer o professor dos seus motivos”, declarou.

A responsável pela disciplina ainda acrescentou que as provas serão orais e aplicadas sem agendamento prévio. No entanto, isso também não vai ao encontro com a resolução do Cefet, que determina sobre os processos do Ensino Remoto Emergencial. “Deve-se priorizar a realização de atividades avaliativas no formato assíncrono”, orientou. “Os planos didáticos deverão prever datas e instrumentos avaliativos”, acrescentou.

Sobre esse tema, a defesa da professora afirmou o seguinte: “Tal solicitação se dá em razão de a disciplina lecionada pela professora ser optativa. O teor da justificativa serve para direcionar os estudos. Não se trata, pois, de qualquer arbitrariedade, mas, sim, de ser diretriz para as questões pedagógicas”.

Intimidação

Um dos alunos da disciplina com quem o BHAZ conversou relatou a sensação de insegurança dos estudantes. O discente preferiu não ser identificado, por medo de represálias na instituição. “A gente está em choque. A situação é lamentável”, desabafou.

Por meio do Diretório Acadêmico, a coordenação do curso foi acionada para apurar a situação. Após essa demanda dos estudantes, a professora voltou a contatá-los. Dessa vez, a docente abordou direito de imagem. “É terminantemente PROIBIDO gravar as aulas, áudio, fotos, etc. sem autorização. NÃO AUTORIZO qualquer tipo de publicação relacionada a minha pessoa”, escreveu.

“Caso isso aconteça, o aluno responderá legalmente por isso. Informo que é possível solicitar a quebra de sigilo telefônico de qualquer pessoa para comprovar a exposição da imagem de outrem”, acrescentou.

No texto do email, a professora afirma que não é uma ameaça. No entanto, esse não foi o entendimento dos estudantes que receberam a mensagem. “Os alunos ficam mais intimidados ainda com um email desses, porque parece que a gente não tem para onde correr. A gente fica desanimado de cursar, porque não era pra ser assim”, comentou.

A educadora, por meio de nota, afirmou que a exigência teve como objetivo “resguardar seu direito de imagem e eventual utilização das aulas em questão não afeta ao ensino em si, cujo direito é protegido pela Constituição Federal”.

‘Não é um caso isolado’

Nas redes sociais, a manifestação do Cefet de que este seria um “caso isolado” não foi bem recebida pelos estudantes. Muitos acusaram a instituição de ter um histórico de assédio moral por parte de professores. Um outro aluno, que também preferiu não se identificar, relatou ao BHAZ que sente um ambiente de incerteza e falta de proteção ao aluno.

“Minha extrema preocupação com tudo que aconteceu nesse caso é que ele não foi isolado, não foi o primeiro e nem vai ser o último. O Cefet-MG, onde eu estudo desde o ensino médio, tem diversos casos que nunca deram em nada. Não se toma providências e deixa um ambiente que demonstra para o aluno que ele é obrigado a se submeter a certas atitudes impostas por professores”, desabafou.

“As resoluções foram feitas para criar um ambiente harmonioso entre docente e discentes, sem conflitos e divergências do padrão de ensino. O que acabou acontecendo é exatamente o contrário: alunos que fogem ao máximo, alunos que desistem da instituição e ficam com traumas psicológicos”, acrescentou.

O que diz a instituição

Por meio de nota enviada ao BHAZ, o Cefet-MG afirmou que esse foi um caso pontual e isolado. “O docente foi orientado que esta postura não reflete a posição do Cefet-MG em relação à proposta de ensino remoto que se adotou, não havendo respaldo e nem previsão em quaisquer resoluções ou portarias exaradas pela Instituição no que tange a essa forma de ensino”, escreveu em trecho do posicionamento (leia na íntegra abaixo).

“A Direção Geral enfatiza que o processo de implementação do ensino remoto emergencial está sendo avaliado positivamente pela comunidade acadêmica, sobretudo levando em conta a expressiva participação dos estudantes”, concluiu.

E a professora?

O BHAZ optou por preservar o nome da professora porque não conseguiu falar com ela até esta publicação. A reportagem tentou contato com a educadora 12 vezes, entre 8h e 9h desta sexta-feira, em números diferentes atribuídos a ela.

Após a publicação deste material, a educadora entrou em contato com o BHAZ na mesma sexta-feira (21), mas não autorizou que nenhuma justificativa apresentada fosse publicada ao sinalizar que se manifestaria, posteriormente, por nota.

Na terça-feira (25) seguinte, foi enviado um posicionamento por um escritório de advocacia. A própria equipe de defesa da educadora preferiu que tal nota fosse publicada no dia seguinte. A professora, apesar de conversar com a reportagem em seguidas ocasiões, não autorizou que suas justificativas fossem publicadas.

Além dos trechos já reproduzidos nesta reportagem, a defesa alegou também que “causou estranheza o fato de o Cefet-MG ter encaminhado nota a este veículo de comunicação, sem sequer ter contatado a professora para tomar ciência da dinâmica de avaliação, que, reitera-se: foi referendada por aquela instituição”.

“Desse modo, concluiu que a Professora do Cefet NÃO fez exigências ‘absurdas’, muito menos causou assédio aos alunos, consignando que ela possui um número acima da média de encargos acadêmicos, projetos de iniciação científica e extensão aprovados, feitos em parcerias com empresas diversas”, finalizou.

Nota do Diretório Acadêmico da Engenharia de Materiais do Cefet-MG:

Nota do Cefet-MG

“Diante dos acontecimentos recentes relacionados à postura de docente da Instituição na condução do ensino remoto de disciplina ministrada em curso de graduação do campus Nova Suíça (BH), a Direção Geral do CEFET-MG informa que a chefia de departamento pertinente já se reuniu com docente e coordenação do curso para que o fato possa ser esclarecido, bem como as eventuais dúvidas sobre as resoluções relativas ao Ensino Remoto Emergencial (ERE) na Instituição. Ademais, destaca que o docente foi orientado que esta postura não reflete a posição do CEFET-MG em relação à proposta de ensino remoto que se adotou, não havendo respaldo e nem previsão em quaisquer resoluções ou portarias exaradas pela Instituição no que tange a essa forma de ensino.

A Direção Geral ressalta ainda que este é um caso pontual e isolado e, de nenhuma maneira, reflete a proposta de ERE que vem sendo elaborada, implementada e avaliada desde o dia 2 de julho, quando o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe) do CEFET-MG, por meio da Resolução CEPE-02-20, aprovou, em caráter excepcional e temporário, a implementação de ERE para os cursos da Educação Profissional e Tecnológica de Nível Médio, para os cursos de Graduação e para os cursos de Pós-Graduação, em todos os campi da Instituição. Desde, então, a Comissão Geral e as comissões formadas em cada campus do CEFET-MG – com ampla representatividade de todos os segmentos da comunidade acadêmica – têm debatido a maneira mais adequada de construir, coletivamente, o ERE.

Em consonância com essa construção coletiva e sensível à necessidade de capacitar seus docentes para os desafios do ensino remoto, estão sendo realizados webnários e cursos direcionados a segmentos específicos da comunidade para tratar dos diferentes aspectos relacionados ao ensino remoto. Nesse sentido, vale ressaltar que, aos docentes, várias têm sido as ações de capacitação e orientação, como bate-papo com professores de outras instituições onde o ensino remoto já fora adotado; elaboração de “Trilhas do Conhecimento”, com roteiros sobre modelos de ensino híbrido, desafios e possibilidades do ensino remoto, ferramentas de auxílio aos docentes; palestra, curso e até um e-book sobre metodologias de aprendizado para o ensino remoto. Tudo isso com o intuito de contribuir para o planejamento das aulas, apresentar plataformas colaborativas, debater o papel do professor e da sala de aula nesse novo modelo, o planejamento de aulas síncronas e a avaliação do aprendizado.

Por fim, a Direção Geral enfatiza que o processo de implementação do ensino remoto emergencial está sendo avaliado positivamente pela comunidade acadêmica, sobretudo levando em conta a expressiva participação dos estudantes“.

Nota enviada pela defesa da professora

“Considerando a notícia publicada por este meio de comunicação no dia 21/08/2020, em página mantida na rede mundial de computadores, intitulada de: Professora do Cefet faz exigências ‘absurdas’ e alunos denunciam assédio, a professora objeto das supostas absurdas exigências, denunciadas na reportagem, pediu, com amparo na Lei nº 13.188/15, o direito de resposta.

O pedido do direito de resposta é feito porque, de acordo com notificação recebida, juntamente com uma ata – elaborada pelo próprio CEFET, diversamente do que consta do teor da notícia anterior, as exigências feitas pela professora aos discentes, através de e-mail, relacionada ao Ensino Remoto Emergencial – ERE, não possuem qualquer ilegalidade, não sendo absurdas, tampouco de assédio.

É reconhecido na notificação que a questão das mensagens publicadas nas redes sociais por alunos envolvendo a professora, causou repercussão na instituição e fora dela, e por tal motivo, já foi objeto de apuração pelo CEFET. Aliás, no dia 24/07/2020, houve reunião com a finalidade de que fossem apuradas a procedência e a veracidade das informações circuladas e, ainda, fosse garantida à professora, a devida orientação em relação às diretrizes pedagógicas institucionais do ERE.

Naquela ocasião da reunião, como consta da ata enviada, o subchefe do Departamento de Engenharia de Materiais – DEMAT, e, portanto, superior hierárquico da professora, já havia endossado sua conduta, apontando não haver qualquer ilegalidade no procedimento, que tem amparo nos arts. 8º e 9º, da Resolução CGRAD Nº 08/2020, Resolução CEPE-012/07, de 15/03/07 – alteradas pela Res. CEPE – 032/19, de 16/12/2019, e Resolução CGRAD – 22/20 (Ata anexa).

No que se refere às questões veiculadas na notícia, cabe anotar, quanto ao pedido de o aluno apresentar uma justificativa escrita, tal solicitação se dá em razão de a disciplina lecionada pela professora ser optativa. O teor da justificativa serve para direcionar os estudos. Não se trata, pois, de qualquer arbitrariedade, mas, sim, de ser diretriz para as questões pedagógicas.

Conforme postagem feita na página do Instagram denominada engmat_cefet, datada de 25/06/2020, verificou-se que a professora, não de hoje, pede aos alunos para justificarem a razão de ter escolhido a participação no curso, repise-se: para o norte das questões lecionadas.

Ponderou a professora que na disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso 1 (TCC1), a justificativa da escolha do tema com o orientador tem valoração no semestre, conforme cronograma postado na turma do Microsoft Teams referente ao 2º semestre de 2020, e, nas aulas presenciais, a justificativa é avaliada também com uma apresentação na disciplina. No Curso de Extensão – Materiais Não Metálicos (em que a professora é coordenadora), a justificativa fez parte do processo seletivo, que contou com mais de 200 inscritos.

Registrou a professora não possuir qualquer controle ou gestão para matricular alunos e/ou definir quem vai matricular-se.

Relativamente ao suposto rigor exigido em relação às regras das disciplinas que a professora leciona, informou que ele é o mesmo para o ensino presencial, proporcional às diretrizes pedagógicas, não configurando nenhum interesse ou necessidade de desmerecer, ou até mesmo questionar o ERE, e muito menos trazer problemas para os estudantes nesse momento complicado.

Referente às regras das disciplinas (câmera ligada), anotou que, dos 8 (oito) alunos matriculados, 6 (seis) enviaram e-mails concordando com a ligação da câmera. E os que tiveram problemas, enviaram e-mail para a professora e foram respondidos. Três estudantes, concordaram com as regras e não expuseram nenhuma situação problemática.

Ressaltou-se que os estudantes que demostraram problemas com suas câmeras, foram prontamente respondidos pela professora, que os acalmou com relação à exigência, direcionando-os para busca de recursos tecnológicos junto ao CEFET e até emprestando um notebook a um deles.

Delineou que esses e-mails foram respondidos antes do fato ocorrido nas redes sociais e a divulgação deles na presente matéria foi autorizada pelos envolvidos, que, por serem adolescentes, não terão os nomes divulgados.

Ademais, quanto à vedação de gravação das aulas, a professora relatou ter adotado a postura nesse sentido a fim de resguardar seu direito de imagem e eventual utilização das aulas em questão não afeta ao ensino em si, cujo direito é protegido pela Constituição Federal.

Registrou que após a divulgação da notícia, a vida da professora tornou-se um verdadeiro calvário, passando ela a sofrer intimidação sistemática no meio virtual, onde foi depreciada e difamada, tendo até mesmo sua intimidade invadida, com o envio de mensagens, e-mails, entre outros.

Asseverou que causou estranheza o fato de o CEFET ter encaminhado nota a este veículo de comunicação, sem sequer ter contatado a professora para tomar ciência da dinâmica de avaliação, que, reitera-se: foi referendada por aquela instituição.

Desse modo, concluiu que a Professora do Cefet NÃO fez exigências ‘absurdas’, muito menos causou assédio aos alunos, consignando que ela possui um número acima da média de encargos acadêmicos, projetos de iniciação científica e extensão aprovados, feitos em parcerias com empresas diversas.

Tostes & De Paula Advocacia Empresarial”

Edição: Aline Diniz
Guilherme Gurgel[email protected]

Estudante de Jornalismo na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Escreve com foco nas editorias de Cidades e Variedades no BHAZ.

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