Nenhum programa é de índio

indígenas
(Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Por Wallace Carrieri*

Simplificar continua sendo a melhor maneira de se comunicar. Na educação, a simplificação de conceitos também encontra sucesso na difusão de informações e consolidação de visões de mundo.

Imaginar o povo brasileiro como uma mistura perfeita e equitativa entre brancos, negros e indígenas teve seu papel na conformação de uma ideia nacional, mas o próprio país foi mostrando ao seu povo que, no dia a dia, cada um tem seu lugar e enterrando, assim, as esperanças de mobilidade.

O processo de folclorização do indígena, aliado ao rápido processo de urbanização do Brasil, foi impondo um afastamento cada vez maior dessa população, mesmo que a urbanização tenha avançado justamente pra cima deles.

Mas aí era tarde: entendê-los exóticos não permitiu nem mesmo que eles se beneficiassem dos próprios hábitos da urbanização.

Calça jeans? Telefone celular? Tudo começou com os famosos espelhinhos dos invasores, objetos de trocas duvidosas.

O fato é que, atualmente, a emergência das questões climáticas joga novo foco nos indígenas pelos seus modos de vida mais sustentáveis. Porém, mais uma vez, corremos o risco de encarar a questão por meio da segregação.

Não existem dois mundos, de modo que avanços precisarão contar com tecnologias atuais, assim como tecnologias ancestrais.

E daí o preconceito.

A contribuição do indígena não é simples ou primitiva, mas inventiva, intencional e sofisticada. A visão única que imperou até recentemente deve dar espaço a uma abordagem diversa e cooperativa, não com diferentes lugares para um povo tripartido, mas com a soma de saberes que permitirão ações, mais que sustentáveis: regenerativas.

O mito da natureza intocada também gerou equívocos do ponto de vista da governança ambiental. Hoje se sabe que muitas das nossas florestas são produtos da interação, experimentação e domesticação realizadas pelos indígenas, que delas tiravam seu sustento, sua própria existência.

A diferença está na agressividade dos métodos. O avanço das técnicas, por muito tempo, criou uma ideia de que manejos ancestrais seriam obsoletos e que o indígena estaria um passo atrás na evolução.

O indígena expulso, precarizado, espremido entre faixas de frágeis demarcações, foi virando um subproduto do próprio desenvolvimento.

Transformá-lo em folclore contribuiu para sua desumanização e aceleração desse processo injusto.

Mas a falência do desenvolvimento, até mesmo o dito sustentável, vem reabilitar o indígena como exemplo de convivência com a Terra.

Virá o dia em que a terra, que se revira, vai se regenerar e sobreviver, nela, terá que ser um projeto verdadeiramente coletivo.

*Wallace Carrieri é Gestor de Projetos de Sustentabilidade do BH-TEC, mestre em Bens Culturais, Tecnologia e Território pela UFMG e possui bacharelado e licenciatura em Geografia

SIGA O BHAZ NO INSTAGRAM!

O BHAZ está com uma conta nova no Instagram.

Vem seguir a gente e saber tudo o que rola em BH!