Vereador de BH diz que Lula buscou ‘forças ocultas africanas’ e é alvo de críticas por racismo religioso

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Lula recebeu uma benção umbandista e vereador de BH atacou o ato (Reprodução/@CamiloSantanaCE/Twitter)

O vereador de Belo Horizonte Ciro Pereira (PTB) virou alvo de críticas após fazer uma publicação que propaga racismo religioso em seu Twitter, nesta terça-feira (24). Na postagem, ele compartilhou uma foto do ex-presidente Lula (PT) recebendo a benção umbandista em um ritual religioso, e disse que o petista estaria buscando “forças ocultas africanas”. A vereadora Iza Lourença (PSOL) acusou Ciro Pereira de racismo religioso.

No último sábado (21), o ex-presidente da República participou de um encontro com movimentos sociais e culturais em Fortaleza, no Ceará, e recebeu a benção de uma representante umbandista que estava presente. Ciro Pereira comentou o encontro e afirmou que Lula estaria travando uma guerra espiritual ao participar do ritual da religião africana.

“Engana-se quem pensa que não existe uma guerra espiritual acontecendo! Lula busca as forças ocultas africanas, foi ungido e benzido por várias entidades. Para ele vale tudo, sede de poder. A guerra começou e eu lutarei pela minha família e pelo futuro da minha pátria”, escreveu o vereador em seu Twitter. Horas depois, ele apagou o post. Confira:

Tuíte do vereador Ciro Pereira (BHAZ)

‘Respeite a religião dos outros’

Nos comentários da publicação, vários internautas criticaram a fala do vereador, apontando o preconceito e pedindo respeito pela umbanda. “Lamentável o que uma pessoa fala e faz pelo poder. Respeite a religião dos outros”, comentou um usuário. “Se você quer respeito pela sua crença, começa respeitando a dos outros”, disse outra pessoa.

Respostas de internautas ao tuíte de Ciro Pereira (BHAZ)

A vereadora Iza Lourença (PSOL) também fez uma postagem sobre as falas do vereador, acusando-o de racismo religioso. “Racismo religioso é crime! O racismo religioso é uma das faces do racismo estrutural que demoniza os ritos sagrados do candomblé e da umbanda”, escreveu a mandatária.

“As religiões de matriz africana e afro-brasileiras exigem respeito ao seu sagrado. Assim como as demais crenças presentes no país, os povos tradicionais fazem parte da formação nacional e devem ter seu espaço respeitado”, completou. Confira a publicação completa de Iza:

Falas do vereador são discriminatórias

Gilberto Silva, advogado especialista em crimes contra a honra, explica ao BHAZ que a liberdade de expressão não deve ser confundida com discurso de ódio, de acordo com a Constituição. Segundo ele, mesmo que o vereador justificasse as falas com sua própria religião, elas acabam tendo sentido discriminatório contra as pessoas que são de religiões de matrizes africanas.

Ele também afirma que o crime de racismo religioso deve ser investigado pela Polícia Civil para se ter uma tipificação. “Mas, inicialmente, ao ver e analisar essa conduta, ela extrapola os preceitos da liberdade de expressão e torna-se um discurso carregado de preconceito. Discurso esse que nega os direitos fundamentais dos cidadãos”, diz. 

Silva pontua ainda que as falas do vereador Ciro Pereira podem ser consideradas discurso de ódio de cunho racista e religioso. Em casos em que há a criminalização, o condenado pode pagar pena e multa. “O crime de racismo, seja ele racismo em relação à etnia, seja ele racismo em relação à religião, ele tem pena de 1 a 3 anos, mais multa”, informa Gilberto.

Religiosos podem mover uma ação contra vereador

“O crime de racismo é uma ação que pode ser movida pelo Ministério Público, e as associações, os terreiros, e os grupos de pessoas de matrizes africanas que tenham legitimidade para isso podem acionar o Ministério Público para requerer um inquérito para verificar se houve de fato, dentro da legislação, e não dessa concepção da expressão, o crime de racismo”, explica o advogado.

Sobre a diferença entre intolerância religiosa e racismo religioso, Gilberto explica que, para ele, não trata-se de uma intolerância, e sim uma das variadas formas de racismo. “Para mim, quando há essas expressões, é o racismo religioso mesmo, quando você tem a intenção de induzir e incitar a descriminação em relação a uma religião”.

“É obvio que existem aí algumas imunidades eclesiásticas, em que as pessoas expressam isso porque faz parte da crença delas, de uma religião em relação a outra, mas nunca pode ofender a honra subjetiva ou objetiva daqueles que professam a fé diferenciada da outra”, esclarece Gilberto Silva.

Racismo religioso é reforçado por outras religiões

Com base no histórico da religião evangélica de condenar as práticas religiosas de outras vertentes, é possível notar, segundo o especialista, que o racismo religioso acaba sendo reforçado em determinado ponto por essas instituições. “A instituição evangélica, com a prática de intolerâncias com as religiões africanas, influencia”, afirma.

“A gente passa a entender que são as instituições que mantêm esse tipo de pensamento, o pensamento de diminuição do outro por conta da sua religião. É óbvio que a questão da demonização das religiões de matriz africana se trata de racismo religioso quando ela extrapola e quando ela está na intenção de ofender o praticante”, completa Gilberto. 

O BHAZ entrou em contato com o vereador por meio de sua assessoria de imprensa, mas, até a publicação desta matéria, não obteve resposta. Tão logo o mandatário se manifeste, esta reportagem será atualizada.

Edição: Giovanna Fávero
Andreza Miranda[email protected]

Graduada em Jornalismo pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e repórter do BHAZ desde 2020. Participou de duas reportagens premiadas pela CDL/BH (2021 e 2022); de reportagem do projeto MonitorA, vencedor do Prêmio Cláudio Weber Abramo (2021); e de duas reportagens premiadas pelo Sebrae Minas (2021 e 2023).

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