[Bhaz em série] Sofia Feldman: reconhecimento internacional e abandono – Saúde: o grande desafio (parte 1)

Por ano, 11 mil mulheres dão a luz no Sofia Feldman vindas do Brasil inteiro

“Era o único hospital em que eu não queria, pois já tinha ouvido falar muito mal, em virtude do parto humanizado. Eu queria parto normal, com anestesia. Mas, sem plano e sem poder escolher outro lugar, a vaga da central de leitos saiu para lá. E lá fui eu”,  relata a representante de cerveja artesanal Juliana Fonseca, 37 anos, o drama que viveu em 27 de fevereiro de 2009, quando se viu “obrigada” a ir para a Maternidade Sofia Feldman, para trazer ao mundo seu filho Bernardo Muzzi, hoje com 9 anos de idade e muita energia.

No local, já contrariada, Juliana assustou-se ainda mais quando foi informada que ali, grande parte dos partos, quando não tinham intercorrências, eram realizados por enfermeiras obstetras. Daquele dia, ela ainda se recorda do momento em que entrou na sala dividida por cortinas, onde aproximadamente 10 mulheres ganhavam suas crianças ao mesmo tempo. Desde que começou a sentir as primeiras contrações, foram 12 horas de trabalho de parto, até que Bernardo nasceu a fórceps, pesando 2,9 quilos e com 49 centímetros.

Após as dores, veio o alívio – o filho no colo e uma grande surpresa. “O atendimento foi incrível do início ao fim. Um cuidado super especial com a mãe e com a criança, que não saiu, em nenhum momento do meu lado e com a doula me apoiando emocionalmente o tempo todo. além de meu marido. Eu senti muito carinho e amor daquelas pessoas que me ajudaram a colocar o Bernardo no mundo”, afirma Marcela ao relatar, ainda emocionada, sua experiência na maternidade pública em que  100% do atendimento é pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Um ano depois da experiência no SUS, veio Theo Muzzi, seu segundo filho. Diferente do primogênito, a situação da família estava estabilizada e eles tinham o plano de saúde. Por isso, Juliana optou por tê-lo de parto normal, com anestesia. “O parto foi na maternidade Otaviano Neves. Mas foi fraco. Eu ganhei o Theo às 19h10 e só fui vê-lo as 23h40, isso porque perguntei onde estava meu filho. Quero saber quem é ele? Como ele é? Ele foi levado para o berçário? Foi um contato rápido demais”, relembra ela fazendo um paralelo entre os dois partos – no sistema público e no privado. Na maternidade Sofia Feldman, não há berçário. A criança vai direto do útero para o colo da mãe caso ele não precise de cuidados especiais.

Assim como Juliana, centenas de mães passam pela maternidade que é referência mundial em partos. Por ano, são 11 mil mulheres que dão a luz na Maternidade Sofia Feldman vindas de todos os cantos da capital e de cidades do interior do Estado e do Brasil inteiro. Segundo a direção, a maternidade é destino de mulheres de 300 municípios mineiros que não têm condições de realizar partos de risco, além daquelas que a escolhem por opção.

A empresária Natália Gabriela Sampaio Davi, 31 anos, é um desses casos. Mesmo sendo usuária de um plano de saúde, por onde fez o pré-natal, ela escolheu a Sofia Feldman. “Hoje eu sei que o médico não é necessário quando o parto não tem complicação. Mas, se pelo meu plano eu quisesse que minha médica, que fez o pré-natal, fizesse o parto, teria que desembolsar algo em torno de R$ 4 mil”. Mais do que economizar, Natália queria ter a experiência do parto natural. Assim, depois de muita conversa, horas na web pesquisando e conversando com outras mulheres, tomou a decisão.

“Não foi uma escolha fácil. Oitenta por cento das pessoas com quem conversei me desencorajaram. Queriam, a todo custo, me tirar essa ideia da cabeça”, conta Natália, que foi chamada até de louca por escolher a maternidade pública em vez da que era oferecida pelo plano de saúde privado.

“Como você terá coragem de ir para lá, ter seu filho no SUS, deixar o plano de saúde?”, indagavam a ela. Natália conta que, diante de tanta resistência, preferiu não discutir, mas, ao contrário, manter sua decisão de ir para a maternidade pública. Tudo saiu como ela previa com relação ao atendimento e à assistência dos profissionais da saúde. Natália queria ter o filho de forma natural. Mas, por conta de um inchaço no colo do útero, foi aconselhada a ter Vittorio Sampaio Mendes,  já com 41 semanas, de parto normal.

“Eu tinha até tinha preconceito com o SUS e com o Sofia quando comecei a pesquisar. Mas, minha experiência me mostrou que eu estava equivocada. Hoje sou uma militante do parto humanizado e defensora do Sofia Feldman”, comenta ela, que pretende ter seu segundo filho também lá, agora, mais do que nunca, validada pela própria experiência. “Sei que o SUS pode dar certo”, afirma. Hoje, cheio de saúde, o pequeno Vittorio vai periodicamente ao posto de saúde tomar as vacinas. “Eu, de fato, não tenho nada a reclamar seja do Sofia ou do posto onde ele toma as vacinas periodicamente”, completa.

“O Sofia Feldman era tudo que eu queria”, comentou Ana Bratriz, ao lado do marido, após dar a luz ao filho (Fotos: Jefferson Lorentz)

Moradora da cidade de Ouro Preto, a restauradora Ana Beatriz de Araújo Silva, 29 anos, e o marido, José Luiz Santana, 34 anos, também escolheram juntos onde teriam o primeiro filho, João Pedro. “Quando fiquei grávida, passei a pesquisar sobre parto humanizado e o Sofia Feldman apareceu como referência. Eu fiquei enlouquecida. Era tudo que eu queria”, conta ela, que tem plano de saúde mas saiu decepcionada da consulta com o médico.

“Essa consulta foi extremamente desmotivadora, pois o médico foi logo dizendo que eu não conseguiria ter meu filho por parto normal ou natural, por eu ser magra. Que o ideal para mim seria uma cesárea. Mas eu já tinha lido e sabia que o que ele falava não tinha lógica. Eu tenho pavor de faca, cesariana, de costura. Eu não queria aquilo. Fiquei assustada com aquele médico. Ele disse que eu teria que fazer o exame de toque com 21 semanas.  Fiquei muito desconfiada. Sai de lá apavorada. A verdade é que eu tinha ido fazer aquela consulta por pressão da família, mas, quando terminou, decidi que não voltaria mais”, relata Ana Beatriz, que decidiu fazer o pré-natal  pelo SUS.

Ela ainda lembra que chegou a ouvir de uma médica se queria mesmo ganhar o bebê no “Sofria Feldman”. “Sinto que as pessoas têm grande preconceito com o SUS, por ser de graça. Minha família achava um absurdo eu não ter o acompanhamento de um médico obstetra”, comenta. Mas, uma semana antes do nascimento dele, Ana Beatriz e o marido foram conhecer a maternidade e saíram de lá apaixonados pela estrutura e pela forma de trabalho.

“Sai chorando daqui e voltei para realizar meu sonho. Estou aqui com meu filho nos braços”, comemora ela. “A gente está tão acostumados com a ideia de que tudo que é gratuito é ruim, que você chega a pensar que isso aqui não existe. Com qualidade, simplicidade, sem luxo, mas com dedicação, o Sofia foi e tem sido uma experiência incrível para nós”, comenta o marido, Santana.

A ajudante de serviço, Michelle Gonçalves da Silva,27 anos, mora em Via Cafundão, distrito de Mariana. Com uma gravidez gemelar, a bolsa dela se rompeu e, na pequena comunidade, não há Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) e Unidade de Cuidados Intermediários (UCI) neonatais, o que levou o hospital público da cidade a encaminhá-la à maternidade Sofia Feldman.

Michelle veio do interior do Estado sem nunca ter ouvido falar da Maternidade Sofia Feldman”

‘Eu nem sabia que o Sofia existia’

“Eu nem sabia que existia o Sofia. Minha gravidez foi de risco, pois os meus bebês estavam sentados”, conta ela, que passou por uma cesárea ao lado dos pequenos Aristides Gonçalves Pereira e Pedro Gonçalves Pereira, que, ao nascer prematuros, foram levados para a UCI do Sofia. Hospedada há mais de um mês na Casa da Gestante, espaço que funciona próximo à unidade hospitalar e acolhe as mães que tiveram problemas no parto ou que estão com seus filhos e filhas ainda sob cuidados do hospital maternidade.

“Eu agradeço a Deus por estar aqui. Já tem pouco mais de mês que eles nasceram e precisaram ficar na incubadora. Eu não sabia que o Sofia existia e quando eles disseram que as crianças precisariam ficar internadas, eu não sabia o que iria fazer, já que não conheço ninguém e não tenho condições financeiras. Aí, me informaram que eu ficaria aqui. Foi uma alegria. É uma estrutura maravilhosa, um acolhimento”, conta ela.

Moradora de Santa Luzia, a manicure Ana Marta Gonçalves, 30 anos, também foi encaminhada do posto de saúde para a maternidade. Como estava com fortes dores e a pressão elevada, foi encaminhada para Sofia Feldman, onde ganhou Juliana de Sousa Gonçalves. “Eu estava com dores. Já tinha ouvido várias coisas ruins sobre o Sofia. Diziam, maldosamente, que era um lugar onde as crianças faleciam”.

Porém, sua visão sobre a maternidade mudou durante a gestação. “Eu vim aqui em momentos de dor e sempre fui bem tratada, com respeito e atenção. É um hospital onde a mãe se sente protagonista no momento do parto. Por isso, aqui é referência”, comenta ela, segurando Juliana, que ainda não havia tomado o primeiro banho, mas já estava toda vestida de vermelho. A pequena nasceu por fórceps. A mãe, já sentindo-se exaurida, pediu à equipe que lhe fosse dada anestesia peridural. “Aqui, eu percebi que eles atendem ao que pedimos. E isso é muito bom”, finaliza.

Seguindo as práticas do parto humanizado, para que se acostumem com a temperatura de fora do útero, na maternidade Sofia Feldman, os bebês tomam banho depois de seis dias de nascidos, e no colo da mãe, explica a enfermeira obstetra, Bruna Marques.

“É um hospital onde a mãe se sente protagonista no momento do parto”, afirma ela com a filha nascida há poucas horas

Um centro de excelência tratado com descaso

O ambulatório da Maternidade Sofia Feldman foi inaugurado em 1978 e o hospital em 1982, com apenas seis leitos em sistema de alojamento conjunto (portanto, sem berçário) e seis leitos de clínica pediátrica, também com internação conjunta – mãe e filho.  Quase quatro décadas depois,  a unidade possui 185 leitos: 87 obstétricos,  41 em Unidade de Tratamento Intensivo Neonatal (UTI), 45 em Unidade de Cuidados Intermediários Neonatais (UCI) e 12 de outras clínicas. Ao todo, são 1.100 pessoas trabalhando na equipe de assistência. Por mês, cerca de 900 partos são realizados, dos quais 34% de alto risco. Números que impressionam e a colocam como a maior maternidade pública do Brasil, reconhecida  internacionalmente.

Segundo dados da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte (SMS), a maternidade é responsável por 6% dos partos realizados em Minas Gerais e por 20% dos partos da macrorregião Centro. Em relação à neonatologia, quando o recém-nascido necessita de cuidados específicos, devido a parto prematuro ou a doença, seu atendimento corresponde a 15% da produção de diária neonatais do Estado e 32% da macrorregião Centro. A unidade chega a atender a 55% das gestante não residentes em BH, enquanto na atenção neonatal, o índice alcança 73%.   

Graças ao trabalho de excelência desenvolvido ao longo dos quase 40 anos de funcionamento, a Sofia Feldman tornou-se referência internacional. Desde 2013, é centro nacional matriciador ou seja  serve de apoio matricial a um novo modo de fazer saúde. Dessa forma duas ou mais equipes, num processo de construção compartilhada, criam uma proposta de intervenção pedagógico-terapêutica para a implantação do programa Rede Cegonha do governo Federal, por meio de cooperação técnica firmado com o Ministério da Saúde (MS) para promover espaços de qualificação da saúde materna e infantil, tomando como alvo as práticas desenvolvidas na unidade.  

Além disso, a maternidade tem projetos institucionais de cooperação técnica junto a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), ao Hospital Israelista Albert Einstein, ao Institute for Healthcare Improvement e ao Japanese International Cooperation Agency.

Apesar da excelência, Sofia Feldman opera com déficit mensal de R$ 2,1 milhão. Suas contas não fecham, porque faltam aportes por parte do poder público

Crise financeira é crônica

Mesmo diante da importância que tem no cenário local e nacional, a maternidade vive uma crise financeira. Com déficit mensal de R$ 2,1 milhão, as contas não fecham. Por ser uma instituição de caráter filantrópico custeada 100% pelo SUS, seu financiamento, de acordo com a Constituição de 1988, deveria ser dividido entre União (50%), Estado (25%) e município (25%), o que segundo, um dos diretores fundadores, o pediatra , José Carlos da Silveira, não é cumprido na prática. “A prefeitura tem feito aportes. Se não fosse isso, já teríamos até fechado, mas o fato é que a situação continua critica sem perspectiva de melhoras”, conta ele, referindo-se aos R$ 5 milhões adiantados pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) em forma de empréstimo, em maio deste ano, e  mais R$ 1,5 milhão, em outubro. Os valores já estão sendo pagos, segundo a administração da maternidade.

“O fato é que não temos ainda respostas definitivas para o financiamento. A prefeitura apenas repassa o que o Estado e União destinam, mas não coloca de fato nada do tesouro municipal aqui”, afirmou, em entrevista ao Bhaz. Em número atualizados de novembro deste ano, a unidade tem um custo mensal de R$ 7,2 milhões. Silveira diz que o desafio para 2018 é sobreviver à maior crise pela qual a instituição já passou. “Não estamos recolhendo tributos, parte do salário dos funcionários está atrasada. Não temos previsão de quando vamos colocar tudo em dia”, desenha ele a dramática situação financeira da unidade.

Para tentar reverter a situação de calamidade, o secretário municipal de Saúde, Jackson Machado, em oficio enviado ao então secretário adjunto de Saúde do Estado de Minas, Nalton Sebastião Moreira da Cruz, hoje secretário estadual de saúde propôs que a maternidade cortasse 200 partos por mês e fechasse 20 leitos de UTI neonatal. “Agora, me diga como vou dizer para uma gestante que nos procura que volte para casa ou vá para outra unidade porque não temos condições de atendê-la porque  estamos reduzindo os serviços?”, indaga Silveira, explicando que a maternidade funciona de porta aberta, sem agendamento, recebendo quem chega.

Em documento enviado ao Bhaz, a direção da maternidade explica que a receita atual, de R$ 5,1 milhões, é proveniente, unicamente, de recursos públicos, dos governos estadual e federal, não havendo aportes financeiros da PBH, que apenas realiza o repasse dos recursos.

O que dizem a Prefeitura de BH e a Secretaria de Estado da Saúde

Por meio de nota, a assessoria de imprensa da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte (SMS) informou que a PBH vai assumir o banco de leite da maternidade, com recursos provenientes do Tesouro Municipal a um custo de aproximadamente R$ 720 mil ao ano. A nota ainda nega que a administração municipal tenha defendido o fechamento de leitos na maternidade.

Para tentar salvar as finanças da Sofia Feldman, a PBH negociou com a instituição um prazo maior, com parcelas menores, para a restituição do valor recebido como adiantamento, em março e outubro deste ano. Com o novo acordo, a maternidade irá pagar 18 parcelas de R$ 250 mil referentes ao repasse total de R$ 4,5 milhões, visto que 1,5 milhão já foi abatido no repasse mensal que é feito à instituição.

Já a Secretaria Estadual de Saúde (SES-MG) enviou a nota esclarecendo que a maternidade Sofia Feldman é contemplada com repasses estaduais referentes aos programas Rede Cegonha e Pro-Hosp. A SES informa também que tem realizado um grande esforço no sentido de cumprir os repasses, reconhecendo a importância da maternidade, não apenas no âmbito assistencial, mas também como formadora dentro do modelo de parto humanizado.

A nota informa, ainda, que em outubro de 2017, foi repassado à Sofia Feldman o valor de R$ 1.048.517,34, correspondente à segunda parcela quadrimestral de 2017 do programa Pro-Hosp Incentivo (período de maio a agosto), previsto pela Resolução SES/MG nº 5.737, de 17 de maio de 2017, e referente ao cumprimento de 100% das metas pelo Hospital. Ainda com relação ao Pro-Hosp, segundo a Secretaria de Saúde, a maternidade tem um saldo referente ao último quadrimestre de 2016 (setembro/dezembro), apurado após terem sido apresentados os ajustes nas metas assistenciais prestadas, quando a unidade passou de 57% para 100% do pactuado. Mas, segundo a Secretaria de Saúde, o repasse aguarda a disponibilidade financeira do Estado para ser efetuado.

A SES-MG também informou que com relação à Rede Cegonha, ainda em outubro, repassou ao Fundo Municipal de Saúde de Belo Horizonte R$ 1.37 milhão, para o período de maio a agosto de 2017. Os valores referentes às parcelas de setembro e outubro foram apurados e validados em novembro, aguardando também disponibilidade financeira para serem repassados.

Sobre o ofício que a Secretaria Municipal de Saúde de BH encaminhou a  SES-MG, esta esclarece que não há norma no SUS que torne obrigatório o co-financiamento dos prestadores hospitalares de 25%, seja do Estado ou Município. Os valores do contrato da Maternidade Sophia Feldman, são prioritariamente federais. As portarias do co-financiamento hoje existentes são para os hospitais que cumprem os requisitos das mesmas, como os hospitais regionais. As portarias imputam, nesse sentido, o financiamento tripartite, sendo 50% do Ministério da Saúde, 25% do Estado e 25% do Município, mas exigem habilitação específica. A Maternidade Sophia Feldman, no entanto, não se enquadraria, segundo o Estado neste contexto.

Na crise, Sofia é a filha feia que não tem pai

“Estamos bastante atentos  à situação do Sofia. Uma maternidade que trabalha na linha da humanização do parto é importante para a mulher e para o bebê. Até agora, temos nos mobilizado para liberar os aportes e impedir o fechamento dos leitos. Mas entendemos que a solução definitiva ainda não saiu. Ela passa pelo financiamento da PBH que não coloca dinheiro do tesouro municipal na unidade, somente repassando as verbas do governo Federal e Estadual. E também por um melhor rateio, já que, de acordo com a Constituição, 50% dos recursos devem vir da União e o restante ser dividido igualmente entre Estado e Município”, afirmou o presidente do Conselho Municipal de Saúde, Bruno Abreu Gomes.

O fato é que uma maternidade com excelência no trabalho prestado à comunidade vive a incerteza diária dos poder público, que prefere utilizar de soluções paliativas, desrespeitando quem trabalha e quem necessita dos serviços da unidade. Afinal, histórias como as relatadas aqui por Juliana, Natália, Ana Beatriz, Michelle, Ana Marta e tantas outras que não têm plano de saúde, ou que têm, mas, mesmo assim, escolheram a maternidade, correm o risco de deixarem de existir, de serem contadas.

Diante do descaso, a saída extrema: a greve 

Com o pagamento do 13º e salários atrasados, atraso no recolhimento  do FGTS,  a falta de insumos e medicamentos, enfermeiros da unidade entraram em greve por tempo indeterminado no último dia 2 de fevereiro. Com o movimento a equipe da instituição trabalha em escala mínima de 30% do efetivo. Apesar da redução na escala, a direção da unidade afirma que a paralisação não afetou o atendimento por enquanto.  A greve é por tempo indeterminado. Segundo dados do Sofia 70% dos enfermeiros( que inclui assistenciais e técnicos) estão parados. Entre os técnicos a greve teve adesão de 50%.

Por causa da greve desde o dia 15 de fevereiro na UTI nove leitos foram desativados e na UCI, sete leitos . Mesmo diante da agonia, a maternidade não tem recusado quem chega até suas portas.

Segundo o  médico Ivo Lopes, diretor técnico e administrativo do hospital Sofia Feldman “há um subfinanciamento crônico e estamos em colapso. O trabalhador tem todo o direito de paralisar as atividades quando ocorrem atrasos nos pagamentos. A direção não é grevista, não vamos fazer greve contra as mulheres e as crianças, desrespeitando os seus direitos; estamos dialogando com os órgãos competentes”.

Segundo Lopes  em uma reunião da Comissão Intergestores Bipartite (CIB) realizada no dia de 22 de dezembro de 2017,  entre as secretarias municipais e Secretaria Estadual de Saúde, levantou-se a necessidade da incorporação de recursos no valor de R$ 1,5 milhão por mês, totalizando R$ 18 milhões de reais por ano, o que garantiria a sobrevivência do Hospital Sofia Feldman, preservando os serviços à comunidade.

A assessoria da  Secretaria Municipal de Saúde (SMSA) afirma que até o momento, a paralisação no Hospital Sofia Feldman não impactou nos pedidos de liberação de leitos da Central de Internação (CINT). A Secretaria de Estado da Saúde afirma que “o estado enfrenta um crescente déficit financeiro decorrente do aumento de despesas pela insuficiência de receita, refletindo em todos os seus órgãos, bem como a SES-MG. O Estado vem se esforçando para honrar os compromissos pactuados, manter as ações e dar os melhores encaminhamentos possíveis, ante o contexto mencionado”, divulgou por nota.

Já o Ministério da Saúde disse que não repassa recursos diretamente a nenhuma instituição. Cabe, segundo a pasta, às secretarias de Estado e Municipal de Saúde, o gerenciamento dos fundos estaduais e municipais de saúde. “Nesse sentido, é importante esclarecer que os recursos federais estão em dia, de acordo com as pactuações com os estados e municípios”, destacou em nota o MS.

Ainda na nota o Ministério informa que “é importante esclarecer  que, especificamente para o Hospital Sofia Feldman, o município de Belo Horizonte/MG recebe R$ 14,5 milhões/ano de Incentivo à Contratualização com o SUS (IAC) e R$ 12 milhões/ano de incentivos da Rede Cegonha. Esse dinheiro é destinado à qualificação de 16 leitos de Gestação de Alto Risco, 36 leitos UCINCO, 41 leitos de UTI neonatal Tipo II e à abertura e reclassificação de 45 leitos UCINCO e UCINCA. Além disso, foi registrado e aprovado no sistema de informação R$ 25,4 milhões em 2016 para o custeio de 99,2 mil atendimentos ambulatoriais e 17,1 mil autorizações de internações realizadas pelo hospital. Em 2017 (até outubro), foram aprovados R$ 14,6 milhões para 9,8 mil atendimentos ambulatoriais e 55,5 mil internações. Cabe destacar ainda que o Hospital Sofia Feldman foi contemplado, em 2016, com a liberação de mais R$ 246,9 mil anuais para habilitação do serviço de terapia nutricional e parenteral”.

Finalmente, uma luz no fim do túnel

Em matéria divulgada no site da Prefeitura de Belo Horizonte (www.pbh.gov.br), na última segunda-feira (19), o prefeito Alexandre Kalil e os secretários municipais de Saúde, Jackson Machado, e de Fazenda, Fuad Noman, apresentaram aos representantes da Maternidade Sofia Feldman uma proposta para transferir ao município de Belo Horizonte a direção administrativa e financeira da instituição. A medida já começaria a valer no princípio de março deste ano.

 “Reconhecemos que o Sofia Feldman é muito importante para a nossa cidade e para Minas Gerais. Mas temos lidado, a cada dois, três meses, com o pedido de socorro que o hospital nos faz. Então essa reunião foi para ofertar à maternidade uma proposta que vai resolver, de uma vez por todas, um problema que já vem se prolongando por tempo demais”, afirmou Jackson Machado.

Para que a transferência seja efetuada é necessário a aprovação da proposta, por parte do colegiado do hospital maternidade, segundo informou o médico Ivo Lopes, diretor técnico-administrativo da instituição. A reunião para discutir a proposta será realizada no dia 27 de fevereiro. “Com esse déficit de, no mínimo, R$ 1,5 milhão ao mês que tem a maternidade, a proposta da Prefeitura é muito bem vinda. O mais importante é que vamos continuar mantendo o atendimento à população”, afirmou.

Outras maternidades públicas e privadas da capital

Atualmente, Belo Horizonte possui 14 maternidades, entre públicas e privadas. Sete delas atendem pelo SUS: Odilon Behrens, Risoleta Tolentino Neves, Sofia Feldman, Santa Casa, Hospital das Clínicas,  Odete Valadares e Júlia Kubitschek. Ao todo, a capital conta com 410 leitos neonatais totais na rede SUS-BH e 144 leitos neonatais de UTI. Considerando a rede pública e privada são 484 leitos obstétricos na capital.

Jefferson Lorentz

Jeff Lorentz é jornalista e trabalhou como repórter de pautas especiais para o portal Bhaz.

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