Repleta de referências do samba, axé e hip–hop, a artista Ohana sintetizou o repertório musical e familiar que carrega consigo no lançamento de seu primeiro EP: Telas & Tracks. Aos 33 anos, cantora e compositora de Belo Horizonte tem muito para falar, a começar pelo amor lésbico preto, pouco pautado na cultura de massa.
Nascida em Belo Horizonte, cria de Contagem, região metropolitana da capital, e com raízes em Santo Antônio do Monte, região Centro–Oeste de Minas Gerais. Por onde passou, Ohana colheu e criou seu repertório artístico, a começar pelas referências deixadas pela bisavó, Maria Rosa Cabral.
“Ela foi uma pessoa tão importante para a cultura e para a sociedade da cidade dela, Santo Antônio do Monte, que o legado dela é extremamente forte até hoje. Ela fundou uma escola de samba em que toda a família integrava, a ‘Unidos do Nacional’, criou um forró comunitário na cidade e lutou pelo reinado (congado)”, diz.
A infância e adolescência de Ohana consistiu em assistir às mulheres de sua família perpetuarem as referências da bisavó no samba e na dança. Ao mesmo tempo, uma tia, irmã de seu pai, a apresentou o rock e o hard rock, que caiu no gosto de Ohana.
“Então era o samba, o pagode, o axé, o rock e o hip–hop. Foi uma mistura de influências familiares até chegar no hip–hop”, conta Ohana.
Identificação com a cultura negra
O encontro com o hip–hop aconteceu quando a artista já estava mais velha, na cidade de Contagem. Para ela, foi o momento de identificação “com os seus iguais”, com a negritude, com a expressão artística corporal, com a poesia e com a rima.
“Eu já exercia a escrita na escola, mas quando eu encontro o movimento hip–hop eu encontro uma forma muito potente de exercer essa veia artística minha, e aí eu começo a atuar enquanto militante do movimento negro e a me entender como mulher preta do feminismo negro”, narra.
Com isso, Ohana construiu um extenso currículo participando de ações sociais, trabalhando como articuladora cultural e integrando coletivos. A primeira apresentação musical da artista aconteceu em 2011, no Duelo de MCs nacional, em Belo Horizonte, à convite de Brisa Flow.
“Comecei a escrever e outras pessoas começaram a me convidar para participar de pocket shows para rimar, para cantar e assim fui seguindo. Em 2015, o Clebin Quirino, do selo Produto Novo, fez uma coletânea feminina de rap, ‘Desconstrução’ e me convida para participar”, conta.
No mesmo ano, Ohana lançou seu primeiro single na plataforma SounCloud, intitulado “Assim Seja”. Depois, passou a trabalhar com a DJ e produtora Pat Manoese, de quem é amiga e parceira na produção do EP Telas & Tracks.
Um outro grande marco na carreira de Ohana é a composição e gravação da música “Azul”, que foi trilha sonora do filme “Marte Um”.
EP Telas e Tracks
O processo para fazer o EP Telas e Tracks durou quatro anos. Alguns percalços, como falta de edital, pouca grana e o distanciamento social atrasaram o lançamento do projeto, que chegou às plataformas de streaming no dia 20 de janeiro de 2024.
“Nós tentamos aprovar editais, primeiramente, para ter condições de fazer da melhor maneira possível e aí, infelizmente, a recusa. Em 2020, com a pandemia, eu fui demitida e aí fiquei mais sem dinheiro para conseguir viabilizar esse trabalho”, relembra a artista.
Paciência foi a principal aliada de Ohana e Pat Manoese para a construção desse trabalho. Aos poucos, as artistas foram retomando o processo com o dinheiro do próprio bolso que entrava por causa de alguns projetos.
“Esse EP é uma collab minha e da Pat Manoese, ela é cantora e idealizadora também da sonoridade, então enquanto não chegou no som que a gente queria e entendemos que a gente estava prontas para poder fazer, a gente não lançou esse trabalho”, comenta.
Telas e Tracks mescla R&B, pagodão baiano, house, melodias que lembram Erykah Badu, referências a Jorge Ben Jor e inspirações na rapper Tássia Reis. “Nas letras, eu falo muito de amor. Eu encontro uma mulher preta sapatão e falar desse amor é revolucionário e necessário”, pontua.
“Precisa ser dito e colocado em voga porque nós existimos, o nosso amor é válido e verdadeiro. São faixas dançantes, a gente mistura trap com boom bap e com funk. É uma música para ser dançada e vivida. Quero que as pessoas ouçam e saibam que é um trabalho feito com muito amor”, conclui.
Ouça o EP de estreia de Ohana, feito em colaboração com Pat Manoese:
Acompanhe Ohana no Instagram e saiba quando serão os próximos shows da artista na Grande BH (clique aqui).