MG perde para 8 estados em ritmo de aplicação de 1ª dose, mas avança na 2ª; entenda

Aplicação de vacina em Minas
Por outro lado, estado é o quinto com maior porcentagem de pessoas imunizadas com a segunda dose (Pedro Gontijo/Imprensa MG)

Em meio à “rinha de vacinas” que tem feito com que os estados antecipem seus calendários de imunização contra a Covid-19, Minas Gerais está atrás de oito estados brasileiros no ritmo de aplicação da primeira dose. Quando o número de vacinas recebidas pelo estado é comparado ao que já foi aplicado como primeira dose, o estado cai para a 19ª posição no país.

Por outro lado, Minas é o quinto estado com maior porcentagem de pessoas imunizadas com a segunda dose. O BHAZ ouviu especialistas e a SES-MG (Secretaria de Estado de Saúde) para entender de onde vêm essas diferenças entre os estados. Os dados são de levantamento feito com base nas informações divulgadas até o início da tarde desta quarta-feira (23) pelas secretarias estaduais de saúde, pelo Ministério da Saúde e pela estimativa de população em cada estado em 2020, conforme o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

De acordo com a SES-MG, Minas já recebeu 12.663.304 doses de vacinas, e já aplicou 6.609.738 como primeiras doses e 2.652.751 como segundas doses. Com isso, 31,04% da população mineira já recebeu pelo menos uma dose da vacina, e 12,46% estão completamente imunizados. O estado perde para Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul, Espírito Santo, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Sergipe quando comparadas as proporções das populações estaduais que já receberam alguma dose.

Segunda dose

Quem tem a maior porcentagem da população já imunizada com a segunda dose é o Rio Grande do Sul, com 15,26%, e o Mato Grosso do Sul vem logo atrás com 14,11%. Neste quesito, Minas não está mal: 12,46% da população do estado já recebeu as duas doses de alguma vacina. A epidemiologista Ethel Maciel, professora da UFES (Universidade Federal do Espírito Santo) e uma das especialistas consultadas pelo Ministério da Saúde para a elaboração do primeiro plano de vacinação, defende a importância da avaliação do desempenho dos estados por esse critério.

“Ter mais segunda dose aplicada é excelente. Significa que os serviços estão perdendo poucas pessoas, vocês estão conseguindo aplicar a segunda dose. O que é fundamental, principalmente, para termos mais proteção contra as novas variantes que estão surgindo. O que conta, afinal, é o esquema vacinal completo”, pontua.

Para explicar a diferença entre os desempenhos na aplicação de primeiras e segundas doses, o virologista Flávio Guimarães da Fonseca, pesquisador do CT Vacinas da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e presidente da Sociedade Brasileira de Virologia, lembra que alguns estados e municípios decidiram reservar parte das remessas para garantir a segunda dose. Outros locais preferiram destinar todas as doses recebidas para as primeiras aplicações.

“Muitas cidades, em algum momento, fizeram essa opção [de guardar as doses], principalmente para Coronavac, que tem um período mais curto até a segunda dose. No caso das outras, que chegam em maior quantidade, um atraso de um mês ou dois não é tão problemático, há mais flexibilidade”, explica.

O Governo de Minas defende que é justamente a reserva de vacinas para a garantia da segunda dose que faz com que o estado esteja atrás na aplicação da primeira dose, mas à frente na segunda. “A SES-MG não orienta o uso das doses que seriam necessárias para a segunda dose, como primeira. Essa medida tem o objetivo de garantir que a pessoa que recebeu a primeira dose, tenha acesso à segunda dose para completar o esquema de vacinação sem atrasos”, diz em nota (leia na íntegra abaixo).

“O motivo de outros estados ‘demonstrarem’ um maior avanço em relação à vacinação pode estar relacionado à utilização da dose em discordância com as recomendações do Ministério da Saúde, o que acarreta risco de não ter a segunda dose para completar o esquema de vacina das pessoas”, completa a SES-MG.

O que causa as diferenças?

Alguns motivos podem explicar a discrepância entre o Amapá, que tem apenas 19,71% da população vacinada com a primeira dose, e São Paulo, que já chegou à marca de 34,83% imunizados com pelo menos uma dose. Flávio Guimarães da Fonseca explica que o ritmo com que cada estado consegue distribuir as doses depende de diferentes fatores.

“Além de cada estado ter uma população muito diferente, a capilarização depende da infraestrutura de cada um. Em Minas, há uma dificuldade óbvia quando subimos para o Norte e o Nordeste do estado, onde há mais bolsões de pobreza, uma condição climática diferente, etc. São Paulo, por exemplo, tem uma malha rodoviária muito mais desenvolvida, um número menor de bolsões de pobreza e miséria”, detalha.

A pesquisadora Elize Massard, mestre e doutora em Saúde Pública e professora da FGV (Fundação Getulio Vargas), também cita outros fatores para explicar a discrepância entre os ritmos de vacinação no Brasil. “Temos estados que definiram populações prioritárias diferentes do Ministério da Saúde. Cada um, por causa da falta de coordenação do governo federal, assumiu para si a responsabilidade de estabelecer uma resposta à pandemia e uma campanha de vacinação”, começa.

A especialista, uma das autoras de uma pesquisa que listou, entre outros fatores, os conflitos políticos e a falta de coordenação como empecilhos para a estratégia de vacinação no Brasil, também citou as dificuldades estruturais de cada estado. “Temos regiões com comunidades que estão cercadas por rios, que precisam ser acessadas por barcos, temos populações indígenas que precisam ser alcançadas”, completa Elize Massard.

O grande problema

Além de detalharem os motivos que podem provocar a diferença no desempenho dos estados, os especialistas não deixam de reforçar o principal impedimento para o avanço na vacinação contra a Covid-19 no Brasil: a falta de imunizantes em primeiro lugar.

“O grande limitador é a oferta [de vacinas]. Todos os estados estão se virando com o que dá, estão se comportando de forma similar. O principal fator que limita isso é a própria quantidade de doses que eles recebem”, defende Flávio Guimarães da Fonseca. “Existe um gargalo lá atrás, na produção, não tem vacina para todo mundo. Este é o problema hoje, e não só no Brasil”, reforça Elize Massard.

Critérios sem definição

Enquanto não há vacinas para todos, é necessário que o país siga critérios bem definidos para imunizar o público. A professora da FGV, no entanto, ainda aponta que a desorganização dos critérios de prioridade ao redor do país é motivada por forças políticas. Para ela, as prioridades adotadas no Brasil “são muito menos epidemiológicas e morais do que econômicas e políticas”.

“Recebemos diretrizes iniciais da OMS [Organização Mundial de Saúde], mas depois disso não teve organização. Muitas categorias entraram na prioridade como profissionais de saúde, sem atuar em combate à pandemia. Os caminhoneiros, por exemplo, que são organizados e têm voz política, conseguiram se vacinar”, pontua. Já a epidemiologista Ethel Maciel defende que o critério de faixa etária é a melhor forma de avançar na vacinação.

“Como as cidades fizeram a opção de fazer a vacinação por comorbidade, essa parte ficou muito lenta. Como precisava de comprovação, e grande parte das pessoas tinha dificuldade de acesso aos serviços de saúde para conseguir os laudos ou declarações, tivemos uma lentidão nesse grupo. Por isso eu tenho defendido que a melhor forma de avançar é por faixa etária, porque a pessoa só precisa apresentar o documento de identidade. É muito mais fácil, você tira todas as barreiras”, argumenta.

Nota da SES-MG

“A Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) recomenda que a administração das doses da vacina contra a covid-19, seja a primeira ou segunda dose, ocorra conforme as orientações do Ministério da Saúde por meio do Programa Nacional de Imunizações (PNI).

Em Minas Gerais, por uma recomendação técnica, atualmente, a SES-MG não orienta o uso das doses que seriam necessárias para a segunda dose 2, como primeira. Essa medida tem o objetivo de garantir que a pessoa que recebeu a primeira dose, tenha acesso à segunda dose para completar o esquema de vacinação sem atrasos.

O motivo de outros estados “demonstrarem” um maior avanço em relação à vacinação pode estar relacionado à utilização da dose em discordância com as recomendações do Ministério da Saúde, o que acarreta risco de não ter a segunda dose para completar o esquema de vacina das pessoas.

Para uma análise comparativa realizada entre os estados de cobertura vacinal, também é importante considerar os números absolutos de pessoas imunizadas. Os 30% em Minas Gerais da primeira dose aplicada significam 6.6 milhões de doses, que é 50% a mais que o número de pessoas que receberam a primeira dose na região Norte com 4.1 milhões e na região Centro-Oeste, com 4.7 milhões, segundo dados do Ministério da Saúde (https://qsprod.saude.gov.br/extensions/DEMAS_C19Vacina/DEMAS_C19Vacina.html).

Importante ressaltar que, dentre as competências do município, está a operacionalização da campanha de vacinação, bem como de traçar estratégias que contemplem grupos prioritários, seguindo as recomendações do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a covid-19″.

Edição: Roberth Costa
Sofia Leão[email protected]

Repórter do BHAZ desde 2019 e graduada em jornalismo pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). Participou de reportagens premiadas pelo Prêmio Cláudio Weber Abramo de Jornalismo de Dados, pela CDL/BH e pelo Prêmio Sebrae de Jornalismo em 2021.

SIGA O BHAZ NO INSTAGRAM!

O BHAZ está com uma conta nova no Instagram.

Vem seguir a gente e saber tudo o que rola em BH!