Cine Pathé: Portas fechadas para a cultura na Savassi

Reprodução/Facebook

1948. Quase 70 anos atrás, bastava atravessar a avenida Cristovão Colombo, na região da Savassi, em Belo Horizonte, para se ver grandes títulos hollywoodianos projetados em uma das telas mais sofisticadas da época. Além da novidade tecnológica, mil lugares e poltronas confortáveis faziam do Cine Pathé, possivelmente, o cinema de rua mais prestigiado da capital: nomeado em homenagem ao magnata francês da sétima arte, Charles Pathé, o espaço se tornou point para famílias inteiras e jovens apaixonados por filmes. 2016, letreiro apagado; portas fechadas; nada de espetáculo. Restou nostalgia.

Quem passa em frente ao Cine Pathé, atualmente, ainda encontra a bela fachada do imóvel preservada. Tombado pelo Patrimônio Histórico Municipal, ele deixou de exibir clássicos europeus e longas independentes, além de películas norte-americanas, para abrigar parcialmente um estacionamento. Desde de que teve suas últimas exibições, em 1999, o local também já serviu de sede para uma igreja evangélica e para um shopping popular, mas por pouco tempo. Os empreendimentos enfrentaram resistência por parte da população, de urbanistas e de outros interessados em ocupar o prédio.

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Quem passa pela região da Savassi encontra o Pathé de portas fechadas
Reprodução/Facebook

Diante das distintas ocupações do Pathé, um movimento criado nas redes sociais fez coro para pedir que o cinema fosse reaberto ao público. Entre os argumentos dos participantes da iniciativa, que se mobilizam por meio de uma página no Facebook, está a importância histórica do local para a cidade. Fora da internet, cartazes foram colados e perguntas escritas na entrada do imóvel em atos de protesto pelo funcionamento da sala de exibição, cuja história já virou livro pelas memórias e mãos da socióloga mineira Maria Celina Pinto Albano, nascida na capital e antiga frequentadora do lugar. “Cadê meu Pathé?” e “Cadê o cinema que estava aqui?” foram algumas das expressões estampadas no local.

Em 2013, a Fundação Municipal de Cultura (FMC) chegou a anunciar a reativação do cinema, dando esperança aos belo-horizontinos mais saudosistas. A promessa do órgão, ligado à Prefeitura de BH (PBH), era de que o espaço seria revitalizado e inaugurado no fim do último ano.

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Estacionamento particular ocupa galeria do Cine Pathé
Foto: Bhaz

O projeto previa a criação de um complexo cultural com direito a um café e a uma galeria de arte. A novidade seria concretizada graças à uma parceria com a iniciativa privada: o Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município aprovou planos da Farkasvölgyi Arquitetura e da PHV Engenharia para a construção de um edifício de nove andares no local. Com entrada pela rua Alagoas, o comercial ainda teria dois níveis subterrâneos como garagem. Em troca, o cinema seria doado ao município. Mas…

Depois de meses, as negociações com os proprietários do prédio não evoluíram. Segundo a Fundação Municipal de Cultura, os responsáveis pelo imóvel fizeram novas exigências para cedê-lo e as partes se desentenderam.

Cine pathé
Experimente Savassi propõe reabertura do Cine Pathé
Reprodução/Vimeo

Um projeto do arquiteto Marcos Franchini também discute as possibilidades de reativação do Cine Pathé. Chamado de Experimento Savassi, ele foi lançado em 2012 em uma apresentação visual animada. No ensaio, o profissional propõe transformar o espaço a fim de integrar a sala de exibição de filmes com uma área para shows, uma galeria para exposições e uma cafeteria, assim como anunciado pela Fundação Municipal de Parques. Clique aqui para ver o vídeo.

Os donos do espaço são filhos do já falecido Antônio Luciano Pereira Filho, controverso médico comprador de dezenas de imóveis na capital. Apontado como “dono da metade de BH”, na década de 1950, muito se especulava sobre a vida dele: sexo com virgens, envolvimentos amorosos com as próprias filhas e uma fortuna avaliada em 3 bilhões de dólares. Ele morreu aos 76 anos, em 1990, e a herança foi dividida entre os três filhos do casamento oficial. No entanto, ele seria pai de pelo menos outros 30 homens e mulheres não registrados. Vários processos de reconhecimento de paternidade foram registrados pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais nos últimos anos.

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Doutor Antônio Luciano era conhecido como “dono da metade de BH”
Arquivo Pessoal / Reprodução Época

Sem perspectiva

Procurada pelo Bhaz, a assessoria da fundação de cultura se limitou a informar que “as negociações em relação ao Pathé travaram”, mas que sempre foi interesse do poder público reativar o cinema. A FMC cita o Cine Santa Tereza, recentemente reaberto, para reafirmar que pretende continuar trabalhando na tentativa de reativar o espaço. No entanto, não há nenhuma novidade ou ação prevista. Anteriormente, o órgão havia anunciado a reinauguração do espaço para o segundo semestre de 2015. Já o Grupo Vila Rica, empresa dos herdeiros de Antônio Luciano – que detém o controle do espaço e de outros negócios -, apenas confirmou o entrave nas negociações, sem dar mais detalhes sobre o caso. Os filhos do médico, cuja fama os precede, não foram localizados para comentar o assunto.

Até o fechamento desta matéria, a única certeza que se tem é de que as portas do Pathé vão continuar fechadas para a cultura na Savassi por tempo indeterminado.

Cine Santa Tereza 

O Cine Santa Tereza foi reaberto em abril deste ano, após passar 12 anos fechado. O prédio, que é da década de 1940, começou a ser restaurado em 2013, mas sofreu dois atrasos no cronograma de entrega. As obras foram concluídas em agosto de 2014. Outras melhorias foram feitas no local, entre elas isolamento acústico, instalação de portas corta-fogo, ar-condicionado e finalização do espaço multiuso que recebe exposições, oficinas e palestras.

Considerado o primeiro cinema público de Belo Horizonte, o cine passou a se chamar MIS Santa Tereza por estar vinculado ao Museu da Imagem e do Som (MIS), da Prefeitura de BH. As exibições acontecem de quarta-feira a domingo, contemplando filmes de arte, produções independentes e autorais, mostras especiais e filmes nacionais e mineiros, entre longas, curtas e documentários.

Além da sala de exibição, o espaço conta com biblioteca pública, salão multiuso e cafeteria.

O cinema fica na rua Estrela do Sul, 89, no bairro Santa Teresa, em Belo Horizonte.

Cine Santa Tereza
Foto: Daniel Iglesias/Universo Produção

Mapa interativo mostra salas e cinemas de rua em BH

Um mapa interativo disponível na internet mostra as localizações dos cinemas de rua em Belo Horizonte. Por meio da plataforma é possível ver um pequeno histórico das salas, além de escrever relatos próprios a respeito das experiências vividas em cada endereço. Ao todo, a capital mineira conta com mais de 40 espaços dedicados à sétima arte, embora a maioria deles esteja desativada.

O projeto foi idealizado pelas publicitárias Luiza Therezo, Maria Fernanda Chicre e Natália Meira e o mapa tem como objetivo ser um espaço de memória e afeto dos usuários das antigas salas de cinema de rua da cidade. “Espaço de casos, lembranças, sentimentos e reflexões sobre as permanências e as transformações de Belo Horizonte e dos modos de se assistir cinema”, diz um trecho da descrição publicada no site. Clique aqui para acessar.

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Reprodução/Cinema de Rua BH
Roberth Costa[email protected]

De estagiário a redator, produtor, repórter e, desde 2021, coordenador da equipe de redação do BHAZ. Participou do processo de criação do portal em 2012; são 11 anos de aprendizado contínuo. Formado em Publicidade e Propaganda e aventureiro do ‘DDJ’ (Data Driven Journalism). Junto da equipe acumula 10 premiações por reportagens com o ‘DNA’ do BHAZ.

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