Faculdade de Ciências Médicas vai retomar aulas práticas presenciais; decisão revolta alunos

fcmmg retoma atividades presenciais
Falta de esclarecimentos é um dos motivos que deixa os estudantes indignados (Divulgação/FCMMG)

O diretor da FCMMG (Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais) anunciou, nesta quinta-feira (4), que a instituição vai retomar as aulas práticas presencialmente. O comunicado, feito por José Celso Guerra por meio do Twitter pessoal dele, deixou os alunos em polvorosa e rendeu inúmeras críticas. Muitos se queixam da falta de esclarecimentos e classificam a retomada das atividades como irresponsabilidade.

De acordo com a publicação do diretor, o retorno das aulas presenciais faz parte de uma negociação entre a FCMMG, a Secretaria Municipal de Saúde, o Sindicato dos Professores e o Ministério Público de Fundações – o que foi confirmado oficialmente pela faculdade horas mais tarde. Alunos ouvidos pelo BHAZ contam que, mesmo sem uma data oficial, coordenadores e outros funcionários falam em uma retomada ainda neste semestre – idealmente, nos próximos 10 dias.

Comunicado do diretor da faculdade, publicado nesta quinta (4), confirma retomada das atividades (Reprodução/Twitter)

A decisão gerou revolta entre os estudantes, que se mobilizaram imediatamente, publicando notas de repúdio e críticas nas redes sociais da faculdade. Em um dia, 1,5 mil alunos já assinaram uma petição online a favor do cancelamento das aulas. Ansiosos com as circunstâncias atuais, eles temem pela saúde de colegas, funcionários e familiares que serão afetados indiretamente caso precisem frequentar aulas presenciais.

Ansiedade e estresse

Uma estudante de medicina na faculdade, que pediu para ter a identidade preservada, não gostou de como a situação foi conduzida. “A gente já está num momento de ansiedade extrema, de estresse. Quando a gente lê uma coisa dessas – que a faculdade vai voltar, só que a gente não sabe quando e como – e vai ser a única do país a funcionar, a gente fica ansioso, aflito, angustiado. Então eu acho que já começou errado”, conta.

A ansiedade gerada pela falta de esclarecimentos é compartilhada por outra estudante, que também preferiu manter o anonimato. Para ela, apesar de haver diálogo com professores e coordenadores, os alunos continuam no escuro: “O diretor falou que vai voltar, o coordenador falou que era só uma possibilidade, a gente está bem confuso”. A situação se agrava com mensagens que viralizam em grupos de WhatsApp e com “os avisos importantes da CMMG que não avisam nada”, como dizem os próprios alunos.

Alunos compartilharam nota de repúdio à decisão da faculdade (Reprodução/Whatsapp)

Além disso, os estudantes acreditam que a faculdade não está considerando a segurança de todos os envolvidos na retomada das aulas. “E os alunos que voltaram para suas cidades no interior e precisam voltar para BH de ônibus? Eles vão ter que se arriscar? Pessoas que vão para a faculdade de ônibus todos os dias vão ter que se arriscar? E as pessoas que têm parentes no grupo de risco? E as pessoas que são do grupo de risco? Os funcionários da faculdade vão poder escolher? Eles vão poder dizer ‘hoje eu não vou trabalhar, porque não quero por minha família em risco’?”, questiona uma das estudantes que conversou com o BHAZ.

‘Irresponsabilidade’

É por causa de todas essas questões que os alunos acreditam que a retomada das atividades neste momento seria irresponsável. “Eu particularmente não tenho ninguém em casa no grupo de risco, mas, sabendo da situação do Brasil eu acho que seria uma irresponsabilidade, mesmo com todas as precauções, voltarem as aulas agora”, pontua uma das universitárias.

Muitos acreditam que agora seria o momento de esperar e observar como a curva de contágio do novo coronavírus vai se comportar em BH para, depois, tomar uma decisão. “O comércio de BH abriu tem poucas semanas, a circulação está aumentando, as pessoas estão começando a sair de casa, a se contaminar”, argumenta a outra estudante que conversou com a reportagem.

A jovem destaca ainda outro ponto importante no caso dos estudantes da saúde: “Grande parte dos nosso professores são médicos e estão atuando em hospitais. A CMMG está na área hospitalar, que é uma grande área de circulação e com os principais hospitais de BH. A circulação do vírus aumenta muito, a gente estará exposto a inúmeros fatores de contaminação”, diz.

Nas redes sociais, também não faltam críticas à decisão da faculdade. No Twitter, alunos desabafam sua frustração. “Cadê a empatia e o cuidado com a vida do próximo nessa faculdade? Mortes só aumentando a cada dia e decidem que a hora de voltar é agora? Parece piada”, publicou uma estudante. “Voltar a ter aulas a troco da saúde de pessoas próximas a mim, é isso? Uma atitude dessas vinda de uma faculdade da área da saúde é simplesmente absurda”, disse uma segunda. No geral, são poucos os que concordam com a decisão da faculdade.

‘Minimização dos riscos’

Para entender quais perigos estão implicados da retomada das aulas práticas, o BHAZ procurou o médico infectologista Leandro Curi. Segundo ele, é de se esperar que os alunos estejam revoltados, mas, caso sejam observadas todas as medidas de precaução, é possível retomar as atividades.

“O que a gente sempre fala para qualquer instituição é: ter ventilação, atentar-se para as medidas sanitárias, disponibilizar álcool gel, torneira com água e sabão para que essa contaminação seja a menor possível”, explica.

Curi reforça ainda que é indispensável a obrigatoriedade do uso de máscaras e a limpeza frequente das superfícies. Ele explica que o fato de ser uma faculdade da área da saúde não traz riscos que não existem também em outras situações: “Quando você fala na reabertura de qualquer estabelecimento, você está falando de formas de minimizar a exposição. Se a instituição garante uma biossegurança para as pessoas que estão ali, é mais tranquilo”.

Sobre a preocupação com a progressão do contágio, Curi diz que esse não deve ser um fator definidor das decisões. “A gente ainda não sabe quando vai ser esse pico que todo mundo almeja, o que a gente sabe é que ainda não chegamos lá. A curva no Brasil ainda está ascendente, então é difícil prever o pico e, consequentemente, difícil saber se será mais seguro em julho, agosto ou outros meses”, explica.

No entanto, o infectologista reforça: os riscos continuam existindo e as medidas de prevenção são apenas uma forma de minimizá-los. Por isso, é importante que o planejamento seja feito de modo mais seguro possível para alunos e funcionários. E alerta: “Vai ser completamente seguro? Não, não vai ser. Completamente seguro é ficar dentro de casa”. 

O que diz a FCMMG?

Procurado pelo BHAZ, José Celso Guerra, diretor da faculdade, se limitou a informar que ainda não há datas definidas e que a FCMMG está reorganizando toda a estrutura e a logística para dentro das normas sanitárias previstas na legislação. 

Ele também reforçou o que já havia sido comunicado pela faculdade anteriormente: “os alunos que, por quaisquer motivos, não quiserem retornar continuarão recebendo conteúdos em formato remoto, ficando para o futuro o cumprimento da carga horária às práticas laboratoriais, que deve, por exigência do MEC, ser realizada em forma presencial”.

O que diz a Secretaria Municipal de Saúde?

O médico infectologista Carlos Starling, que integra o Comitê de Combate à Covid-19, da PBH, diz que a Faculdade de Ciências Médicas elaborou um planejamento de retomada das atividades para ser apresentado junto à prefeitura.

Segundo ele, o processo está sendo realizado de forma responsável e criteriosa, de modo a garantir uma possibilidade de retorno seguro.

O BHAZ também procurou o Diretório Acadêmico Lucas Machado, representação estudantil da FCMMG, e o Sindicato dos Professores, mas, até o fechamento desta reportagem, não obteve resposta.

Giovanna Fávero[email protected]

Editora no BHAZ desde março de 2023, cargo ocupado também em 2021. Antes, foi repórter também no portal. Foi subeditora no jornal Estado de Minas e participou de reportagens premiadas pela CDL/BH e pelo Sebrae. É formada em Jornalismo pela PUC Minas e pós-graduanda em Comunicação Digital e Redes Sociais pela Una.

SIGA O BHAZ NO INSTAGRAM!

O BHAZ está com uma conta nova no Instagram.

Vem seguir a gente e saber tudo o que rola em BH!