Flagrante de feminicídio em porta de escola reforça fragilidade na proteção à mulher

Reprodução/RecordTV + StreetView

O noticiário policial mais uma vez veiculou um caso de feminicídio em Belo Horizonte. O mais recente foi o da enfermeira Josiane Joyce Loffi, de 35 anos, que foi morta a tiros pelo ex-namorado em frente à escola onde as filhas estudam na Pampulha. A razão para o crime? O homem não teria se conformado com o término do relacionamento.

A discussão entre o casal pode ser vista em um vídeo que começou a circular nas redes sociais. As cenas foram registradas por câmeras de segurança e mostram os momentos que antecederam a morte da mulher e a tentativa de suicídio do homem, que atirou na própria cabeça.

Josiane entrou para a triste estatística de mulheres mortas em Minas Gerais. Em conversa com especialistas de segurança pública, o BHAZ buscou entender a razão de os números continuarem, infelizmente, altos.

De janeiro a julho deste ano, Minas já registrou 77 mortes de mulheres, sendo 7 em BH. O Anuário de Segurança Pública 2018 aponta que o Estado anotou o maior número de vítimas por feminicídio: 145 casos dos 1.133 do país.

O sociólogo e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Robson Sávio, explica que os crimes podem ser explicados pelo fato de o Brasil ter uma sociedade culturalmente machista. O caso, segundo ele, se agrava em Minas.

“Lamentavelmente, do ponto de vista político, vivemos no Brasil uma onda reacionária e que está atrelada ao machismo, onde pensa-se que o homem tem mais direito que a mulher. Isso se agrava em Minas, onde a sociedade é muito conservadora e reacionária”.

O discurso de alguns políticos, segundo Sávio, reforça o machismo, pois muitos deles colocam as mulheres como uma “segunda categoria”. “O presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), tem um discurso que incentiva a justiça com as próprias mãos. Outros parlamentares desdenham das mulheres, tratando-as como segunda categoria e indo contra os direitos humanos. Tudo isso favorece”, disse.

‘Ponta do iceberg’

Os assassinatos de mulheres pelos mãos de ex-companheiros, ou atuais, são vistos pelo professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pesquisador do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública (Crisp), Bráulio Alves, como a “ponta do iceberg”.

“Quando se registra um caso de feminicídio certamente já tivemos outros episódios de violência. Podemos dizer que a morte é o ponto final da ação violenta. Precisamos combater a continuidade desses casos”, afirma.

Entre as propostas apresentadas pelo pesquisador para reverter o atual cenário destaca-se a promoção de políticas públicas. “É fundamental termos políticas públicas de caráter educativo, com foco nas mulheres. A violência de gênero não pode ser considerada algo normal. Por anos acreditou-se que os problemas de dentro de casa tinham que ser resolvidos lá mesmo”, opina.

‘Menos repressão e mais investigação’

O aparato frágil para investigações e outros pontos, como a lentidão da Justiça, são apontadas por Robson Sávio como fatores que contribuem para a continuidade dos números altos de ocorrências em Minas.

“Nosso sistema de Justiça é moroso e reproduz o machismo estrutural, temos uma deficiência na polícia de investigação, pois o governo estadual optou ao longo das últimas duas décadas por reforçar a Polícia Militar (PM). Com isso temos mais repressão do que investigação, sendo que o que deveria acontecer era o contrário”.

Ainda falando da lentidão da Justiça, em casos de feminicídio, o especialista aponta que no país os crimes contra a vida não são temas de preocupação. “É preciso investigar mais do que reprimir. A Justiça está mais preocupada em crimes contra o patrimônio do que contra a vida”, sugere.

Apesar de Josiane ter sido morta pelo ex-namorado, a Polícia Civil informou que não havia nenhuma medida protetiva, nem boletins de ocorrências registrados pela vítima.

Vitor Fórneas[email protected]

Repórter do BHAZ de maio de 2017 a dezembro de 2021. Jornalista graduado pelo UniBH (Centro Universitário de Belo Horizonte) e com atuação focada nas editorias de Cidades e Política. Teve reportagens agraciadas nos prêmios CDL (2018, 2019 e 2020), Sebrae (2021) e Claudio Weber Abramo de Jornalismo de Dados (2021).

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