Jovem cadeirante chora ao relatar falta de acessibilidade em igreja de BH: ‘Um absurdo’

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Rayssa Guimarães chorou ao ver que outras pessoas com deficiência não conseguiram assistir ao culto (Reprodução/@rayssamotogirl/Instagram + Lagoinha/Divulgação)

Uma enfermeira de Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, relata com tristeza as dificuldades vivenciadas por ela para assistir a um culto na matriz da Igreja Batista da Lagoinha, na noite dessa terça-feira (26). Rayssa Guimarães, 24, perdeu as duas pernas em um grave acidente há dois anos e, desde então, se locomove com a ajuda de uma cadeira de rodas.

Pelo Instagram, a jovem disse ter tido que reivindicar por seu direito de sentar nas fileiras mais próximas ao altar e, assim, conseguir assistir à celebração. Em nota, a igreja lamentou pelo ocorrido e disse que vai investigar o tratamento recebido pela fiel (veja abaixo).

“Eu passei o culto inteiro chorando, mas não foi por causa de mim não, sabe? Eu não deixo de sair de casa, não deixo de fazer nada, eu luto pra sentar na frente, porque é direito meu. Mas o tanto de mensagem que eu recebi, as pessoas falando que deixam de sair de casa, que sentem que não cabem nos lugares… é um absurdo”, disse ela, sem segurar as lágrimas.

Trajetória de luta

Ao BHAZ, a jovem de 24 anos relatou que essa está longe de ser a primeira vez que ela precisa “brigar” para ter seus direitos garantidos. Apesar de ter conseguido sentar na frente, como exigiu, Rayssa não pôde ficar em sua cadeira de rodas, o que a impediu de se locomover durante o culto.

Além disso, seus familiares não puderam ficar na frente junto dela. “A partir de agora, todo local que eu for e não tiver acessibilidade eu vou filmar. Em show, qualquer evento que você vai, é tudo organizado, na igreja não vai ser?”, desabafa a enfermeira.

Rayssa Guimarães sofreu um grave acidente de moto em agosto de 2020 e precisou amputar as duas pernas. Com a ajuda de amigos e familiares, a enfermeira conseguiu comprar duas próteses, além de uma cadeira de rodas.

Além da cadeira de rodas, Rayssa Guimarães também tem duas próteses para se locomover (Arquivo pessoal)

‘Cadê o respeito?’

Pelos Stories do Instagram, Rayssa não conteve as lágrimas ao contar o que passou. À reportagem, ela disse ter se sensibilizado não apenas por suas próprias dificuldades, mas sim, ao ver que outras PCDs (Pessoas Com Deficiência) que também estavam na igreja, localizada na região Noroeste de BH, não conseguiram aproveitar a celebração como os demais.

“Os bancos da frente são todos reservados para pastores. Eu penso: cadê o respeito com a pessoa que é deficiente? Lá são fileiras de quatro bancos em cada, mais ou menos. Eles poderiam deixar algumas fileiras com banco removível, caso algum cadeirante queira assistir o culto. A gente tem o direito de participar igual todas as outras pessoas”, conta ela.

Ela disse que os outros dois andares são de escada e não têm elevador. Além disso, a entrada não tem rampa, o que também dificultou seu acesso ao local. Apesar disso, a jovem garante que não vai deixar de frequentar a igreja. “Eu vou lá em quantos cultos forem precisos, até que eles mudem a logística e tornem o lugar mais acessível”, afirma.

O que diz a igreja?

Procurada pelo BHAZ, a Igreja Batista da Lagoinha informou, em nota, que as queixas feitas por Rayssa serão investigadas internamente. “Pedimos públicas desculpas e informamos que as orientações recebidas pela mesma durante a celebração não são direcionamentos oficiais da instituição”, diz a instituição (leia na íntegra abaixo).

A igreja ainda classifica como “inadmissível” o tratamento recebido pela enfermeira e ressalta que deseja “continuar recebendo-a em nossa casa”. “O prédio em que a igreja está localizada é uma construção de mais de 30 anos e, desde o início, cada nova determinação constitucional quanto aos critérios de acessibilidade é implementada”, garante, ainda, a administração do centro religioso.

Nota da Igreja Batista da Lagoinha na íntegra

A Igreja Batista da Lagoinha lamenta profundamente o ocorrido na última terça-feira (26) com Rayssa Guimarães durante o Culto Fé. Pedimos públicas desculpas e informamos que as orientações recebidas pela mesma durante a celebração não são direcionamentos oficiais da instituição. Iniciamos o processo de apuração do caso para que o episódio não se repita. Não é essa a nossa diretriz e desconhecemos esse tipo de atitude entre nossos voluntários e obreiros.

O prédio em que a igreja está localizada é uma construção de mais de 30 anos e, desde o início, cada nova determinação constitucional quanto aos critérios de acessibilidade é implementada.

A Igreja Batista da Lagoinha preza pelo acesso global à palavra de Deus, seja presencialmente ou virtualmente. Para tanto, fomos uma das primeiras igrejas do Brasil a instituir a tradução simultânea em libras durante os cultos. Há 12 anos, temos em funcionamento o ministério Obra Prima, que é um centro de apoio a famílias com filhos que possuem algum tipo de deficiência, dando suporte irrestrito, acompanhamento psicológico e atividades de lazer. O mesmo acontece com dezenas de outras ações de acordo com cada necessidade de nossos membros e de toda a sociedade. Em todas as reuniões ou eventos da igreja temos equipes treinadas para atendimentos específicos, como para idosos ou pessoas com distúrbios mentais e/ou emocionais, por exemplo. Nos importamos e valorizamos cada membro ou visitante, de forma a nos adequarmos constantemente para que todos sejam recebidos da melhor maneira possível.

Como igreja, estamos diariamente, durante 24h, em ininterrupto funcionamento para atendermos a todos. Dessa forma, consideramos inadmissível o tratamento relatado por Rayssa e reiteramos nosso pedido de desculpas à ela e sua família. Desejamos continuar recebendo-a em nossa casa, prezando pelo real motivo da nossa existência: o amor por pessoas.

Edição: Roberth Costa
Larissa Reis[email protected]

Graduada em jornalismo pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e repórter do BHAZ desde 2021. Vencedora do 13° Prêmio Jovem Jornalista Fernando Pacheco Jordão, idealizado pelo Instituto Vladimir Herzog. Também participou de reportagem premiada pela CDL/BH em 2022.

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