Reportagem da Folha de S. Paulo, divulgada na noite desta terça-feira (29), aponta que integrantes do governo Bolsonaro tentaram negociar propina em cima do valor de doses da vacina AstraZeneca. A informação partiu de Luiz Paulo Dominguetti Pereira, que seria representante da empresa Davati Medical Supply. Ele falou sobre a tentativa em entrevista à jornalista Constança Rezende. “Ai eu olhei aquilo, era surreal, né, o que estava acontecendo”, disse Luiz Paulo em um trecho da entrevista.
De acordo com Luiz Paulo, que representa a Davati desde janeiro, o diretor de logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias, e ele encontraram-se em um shopping de Brasília, em 25 de fevereiro, para discutir o assunto. Segundo o vendedor de vacinas, pela oferta daquele momento, cada dose da vacina sairia a 3,5 dólares.
Roberto Dias teria sido o responsável por iniciar a tentativa de propina.”Eu falei que nós tínhamos a vacina, que a empresa era uma empresa forte, a Davati. E aí ele falou: ‘Olha, para trabalhar dentro do ministério, tem que compor com o grupo’. E eu falei: ‘Mas como compor com o grupo? Que composição que seria essa?'”, contou.
“Aí ele me disse que não avançava dentro do ministério se a gente não compusesse com o grupo, que existe um grupo que só trabalhava dentro do ministério, se a gente conseguisse algo a mais tinha que majorar o valor da vacina, que a vacina teria que ter um valor diferente do que a proposta que a gente estava propondo”, afirmou.
“A eu falei que não tinha como, não fazia, mesmo porque a vacina vinha lá de fora e que eles não faziam, não operavam daquela forma [acrescentando 1 dólar a cada dose]. Ele me disse: ‘Pensa direitinho, se você quiser vender vacina no ministério tem que ser dessa forma”. “E, olha, foi uma coisa estranha porque não estava só eu, estavam ele [Dias] e mais dois. Era um militar do Exército e um empresário lá de Brasília”, ressaltou Dominguetti.
Em outro momento da entrevista, Luiz Paulo ressaltou o tom de estranhamento diante da sugestão. “Ele [Dias] ainda pegou uma taça de chope e falou: ‘Vamos aos negócios’. Desse jeito. Aí eu olhei aquilo, era surreal, né, o que estava acontecendo”, disse.
Segundo Luiz Paulo, ele chegou a ir, em outro momento, ao encontro de Roberto Dias para discutir novamente a compra das vacinas. No entanto, a negociação não foi para frente. “Aí depois nós tentamos por outras vias, tentamos conversar com o Élcio Franco [ex-secretário-executivo da Saúde], explicamos para ele a situação também, não adiantou nada. Ninguém queria vacina”.
Roberto Dias ainda não se pronunciou a respeito da informação, assim como o Ministério da Saúde.