Tragédia em Janaúba: um ano marcado pela dor, pelo desamparo e pela esperança

Polícia Civil/Divulgação

“É a dor, o sofrimento, a solidão, a tristeza, a saudade, que está estampada no rosto de cada família, inclusive na minha. Ao mesmo tempo, é também um sentimento de revolta. Quero saber o que ocorreu, porquê ocorreu, a culpa, a responsabilidade. E o pior é saber que quem poderia tentar amenizar está fazendo muito pouco diante da necessidade.” As palavras são de Luiz Carlos Batista, marido da professora Helley de Abreu, morta durante o incêndio na Creche Gente Inocente, em Janaúba, no Norte de Minas, há exatamente um ano. Dizeres esses que refletem o sentimento de toda uma cidade que ficou marcada e hoje se recupera de uma tragédia sem precedentes.

Na manhã de 5 de outubro de 2017, o vigia Damião Soares dos Santos ateou fogo em si próprio e nas dependências da creche, interrompendo precoce e covardemente a vida de 10 crianças e quatro adultos – entre eles, a professora Helley, que se sacrificou para evitar uma tragédia ainda maior. Hoje, um ano após o ocorrido, o momento ainda é de recuperação e de revolta com a falta de amparo. Foi celebrada uma missa em homenagem às vítimas e realizado um dia de lazer para as crianças.

Pelo menos 20 pessoas ainda se recuperam das graves queimaduras graças a medicamentos e a atendimentos médicos especializados, que, segundo Luiz Carlos, só são possíveis em função da iniciativa popular. “O poder público, infelizmente, é muito precário, devagar. Eu não sei por qual motivo, mas praticamente nos deixou de lado. Dizem que são consultas e medicamentos que não constam na rede pública ou que precisamos ir para outras cidades, quando, às vezes, nem precisamos. Mas, em situações como essa, se não tem, tem que dar um jeito”, desabafa o viúvo da professora Helley ao Bhaz.

O principal apoio às vítimas da tragédia hoje se dá pela Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia da Creche Gente Inocente de Janaúba (AVTJana), criada e presidida por Luiz Carlos. “Recebemos doações e usamos em prol dos tratamentos. Outros movimentos também foram feitos, de doadores e empresas. Conseguimos fazer não cair no esquecimento”, relata. A associação hoje atende cerca de 14 crianças vítimas da tragédia, com o intuito de reestabelecer a saúde física e mental delas.

 

Antiga fachada da Creche Gente Inocente (Reprodução/Google Street View)

 

A assistência pública

A Prefeitura de Janaúba esclareceu que todas as doações foram repassadas para as vítimas, seja para cobrir custos de atendimentos não disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS), para assistência às famílias e até para a própria associação.

Dos cofres públicos, verbas foram destinadas para assistência social, reforma da casa das vítimas, atendimento médico etc. Somente com serviços e insumos especiais de saúde voltados para o tratamento foram desembolsados cerca de R$ 80 mil – incluindo médicos, psicólogos, medicamentos e procedimentos.

 

Fachada e dependências da nova creche (Prefeitura de Janaúba/Divulgação)

Homenagem merecida

Após a destruição da creche, a prefeitura ainda se dedicou à reconstrução do local – agora, recebendo o nome da professora Helley de Abreu. Ao lado de um grupo de empresários e do Ministério Público, a nova creche passou por um trabalho de readaptação, com inclusão de atividades lúdicas e assistência psicológica, possibilitando o fim de possíveis traumas.

O Centro Municipal de Educação Infantil (Cemei) Helley de Abreu foi inaugurado em março e hoje tem 45 crianças matriculadas e 31 funcionários, sendo oito professoras. A construção atende a todas as normas de segurança e proteção contra incêndio. “Essa readaptação foi muito importante para as crianças e os pais, e foi conquistada a cada encontro, com o auxílio de todas as equipes que contribuíram para que o momento fosse mágico e cheio de encanto”, salienta o secretário Municipal de Educação de Janaúba, Júlio César Tolentino Barbosa.

Dia de lembrar, mas de ter sorriso no rosto

Apesar da saudade, o objetivo da celebração realizada nesta sexta-feira (5) foi o de tentar devolver o sorriso no rosto das crianças vítimas do atentado. Além das missas e cultos de homenagem, a AVTJana ainda proporcionou um lindo dia de brincadeira e distração para todos os pequenos.

“Foi uma tarde de lazer com crianças em um clube. Animação, cânticos, brincadeiras: tudo que as crianças precisam para se alegrar. Teve doação de roupas, alimentos, muita coisa. Um momento importante que restaurou o psicológico e devolveu o sorriso delas. Vai ficar marcado”, conta Luiz Carlos Batista ao Bhaz.

O evento foi realizado em parceria com empresas amigas do Cemei Helley de Abreu e a Defensoria Pública. “São voluntários que se dispuseram a nos ajudar, sem receber nada em troca. É como um trabalho de formiguinha que se constrói uma coisa grande”, completa.

O viúvo da professora Helley tem duas filhas adolescentes e uma criança e, hoje, dedica seu tempo a superar a dor insuperável da perda da mulher e a ajudar na recuperação coletivamente. “Mudou tudo na minha vida. Minha família se desestruturou completamente. A tristeza, o sofrimento, a ausência da mãe, um plano familiar destruído. A gente planeja e, por um descuido, uma falha gera isso tudo. Mas a gente tem fé em Deus. A gente sabe que a vida continua, mesmo que seja muito pesado”, diz, emocionado.

Rodrigo Salgado

Repórter do Portal Bhaz.

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