Presos gravam vídeos e pedem ajuda para frear o novo coronavírus: ‘Estamos jogados aqui à míngua’

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Presos pedem ajuda para combater o novo coronavírus (WhatsApp/ Reprodução)

O sistema prisional de Minas Gerais tem 75 mil detentos que ocupam cadeias construídas para abrigar, no máximo, 39.672 pessoas. Aglomeração é o que não falta em várias unidades prisionais espalhadas pelo Estado. Nesse cenário, a disseminação do novo coronavírus pode ocorrer de maneira rápida e, talvez, catastrófica.

Especialistas ouvidos pelo BHAZ analisam a situação como complicada. “O Estado não tem pessoal de saúde para atender quem está do lado de fora, imagina como será nas cadeias”, ponderou o analista criminal Guaracy Mingardi, que também é membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Os detentos de Minas já reivindicam melhores condições dentro das cadeias. O BHAZ recebeu, nos últimos dias, ao menos três vídeos gravados dentro de presídios do Estado. Organizados, vários detentos aparecem ao lado de um líder que lê as solicitações para afastar o novo coronavírus.

Conforme os relatos, os kits de higiene disponibilizados pelas famílias dos internos não podem mais entrar dentro das cadeias. Sem o material que vinha de casa, os presos precisam se virar com os produtos fornecidos pelo Estado. “Como iremos dividir três pastas de dente para mais de 25 presos? Como vamos dividir três sabonetes para 24 presos? Não temos condição nenhuma de higiene dentro das celas”, informou um dos líderes do movimento.

Na terça-feira (24), um ônibus da linha 715 (Monte Azul/São Gabriel) foi incendiado em BH. Ao saírem do veículo, os criminosos deixaram um bilhete no qual supostos detentos da penitenciária Nelson Hungria, em Contagem, na região metropolitana da capital, reclamavam da ausência dos produtos de higiene e do fim das visitas.

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Rebeliões não estão descartadas

O analista criminal Guaracy Mingardi acredita que será quase impossível isolar detentos que contraírem o coronavírus. “O que a gente sabe é que os presídios estão superlotados e só daria para isolar um ou outro na solitária”, explica. Em Minas, a Sejusp (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública) suspendeu as visitas e a entrada de materiais de higiene e comida de familiares para os presos.

O problema é que restrições podem causar rebeliões dentro do sistema carcerário. Mas, ao mesmo tempo, não há como manter as visitas em tempos de pandemia. “Acabar com o banho de sol e com as visitas são medidas que podem ‘virar as cadeias”, explica o especialista.

Mingardi não vê saída fácil para que o Estado mantenha a ordem nos presídios. No entanto, ele considera primordial que os policiais penais tenham os equipamentos de segurança e que o isolamento dos detentos com sintomas ocorra rapidamente. “Se os agentes não estiverem seguros, eles vão deixar de entrar em algumas alas. Nesse caso, os presos vão tomar conta. É uma sinuca de bico”, alertou.

Os agentes estão protegidos?

O presidente da Amasp (Associação Mineira dos Policiais Penais e Servidores Prisionais) Diemerson Souza informou ao BHAZ que há escassez de máscaras, luvas e outros equipamentos de segurança em algumas unidades prisionais. “Alguns agentes estão reclamando da falta de coisas básicas como o álcool em gel”, contou.

Outro problema, segundo Souza, não há um protocolo bem estruturado do que fazer quando um preso apresentar sintomas do novo coronavírus. Agentes que integram o grupo de risco também não foram liberados. “Não sabemos o que fazer. Não sabemos se isolamos, transferirmos. E os agentes com diabetes e outras doenças estão trabalhando”, explicou.

O que diz a Sejusp?

“A Sejusp confirmou que as visitas foram suspensas, assim como a entrega de kits de higiene. A pasta justificou que, em um cenário de isolamento social, as visitas não são justificáveis. Conforme o órgão não há casos do novo coronavírus no sistema e todas as medidas de precaução estão sendo tomadas.

Sobre os vídeos, a Sejusp informou que ainda não é possível identificar a quais unidades prisionais os custodiados pertencem e, se, realmente, foi gravado no interior de um estabelecimento prisional. Veja a nota na íntegra:

“A Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) tem adotado diversas medidas de prevenção ao Coronavírus no ambiente prisional, voltadas para a preservação da saúde e da vida dos profissionais de Segurança Pública e dos detentos que estão sob a custódia do Estado.

Vale ressaltar que não há, até o momento, nenhum caso confirmado de Covid-19 em unidades prisionais do Estado. Qualquer detento que, porventura, apresentar sintomas de Coronavírus será isolado, realizará exames e, caso confirmado, será encaminhado para a rede pública de saúde, com escolta.

Quatro principais frentes de atuação estão sendo adotadas para evitar o contágio pelo Covid-19:

Para evitar a disseminação do vírus por meio de contato com o público externo: As visitas foram suspensas, para evitar a circulação de pessoas externas, assim como a entrega, até então opcional, de kits suplementares contendo alimentos, remédios entre outros itens, para evitar a circulação de materiais contaminados. Destaca-se que esses itens continuam sendo fornecidos pelas unidades prisionais.

Evitar a contaminação por novos presos: Foram criadas 30 unidades de referência, distribuídas em todo o território mineiro, que vão funcionar como centros de triagem e portas de entrada para novos detentos do sistema prisional. Todas as pessoas que forem presas em Minas Gerais irão para uma unidade específica em cada região e ficarão por um período de 15 dias, em quarentena e observação, evitando possível contágio caso fossem encaminhadas de imediato para outras unidades. Após a observação e atestada a sua saúde, serão encaminhadas a novas unidades prisionais.

Reiteramos que o objetivo dessas unidades será o de estabelecer um período para a triagem dos novos custodiados e não o de receber custodiados infectados.

Cuidados com quem já está preso: No caso de presos que já se encontram no sistema prisional, caso apresentem sintomas do Covid-19, o protocolo é o seguinte: isolamento imediato, realização de exames e, em caso de confirmação, tratamento em hospital, com escolta do sistema prisional.

As unidades prisionais têm recebido material de assepsia e higiene, além de equipamentos de EPI, como máscaras. Os servidores têm sido orientados sobre o uso dos materiais e os riscos de contágio do Coronavírus.

Evitar o contágio via profissionais de segurança: As escalas de trabalho estão sendo dilatadas, de forma a diminuir a circulação desses profissionais intra e extramuros e equipamentos de EPI estão sendo distribuídos nas estruturas prisionais“.

Aline Diniz[email protected]

Editora do BHAZ desde janeiro de 2020. Jornalista diplomada pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) há 10 anos e com experiência focada principalmente na editoria de Cidades, incluindo atuação nas coberturas das tragédias da Vale em Brumadinho e Mariana. Já teve passagens por assessorias de imprensa, rádio e portais.

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