Lula questiona transparência dos valores empenhados pela Renova durante assinatura do novo acordo de Mariana

25/10/2024 às 13h35
mariana mineradoras acordo reparação
Tragédia matou 19 pessoas. (Antonio Cruz/Agência Brasil)

Durante a assinatura do novo acordo de reparação da Tragédia de Mariana, na manhã desta sexta-feira (25), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criticou a atuação da Fundação Renova, entidade até então responsável por administrar todas as medidas compensatórias.

Um dos pontos questionados pelo presidente é a transparência quanto aos valores empenhados desde que a barragem de Fundão se rompeu, em novembro de 2015.

“É importante lembrar que a gente não sabe o que foi feito com o gasto da Fundação criada para cuidar disso. São 37 bilhões gastos que a gente não sabe o destino que tiveram e é importante a gente saber”, cobrou.

A fundação, criada pelas mineradoras e em acordo com o poder público, ficou como a responsável por medidas como pagamento de indenizações, reconstrução das comunidades destruídas e recuperação ambiental. Todas as ações são feitas com o dinheiro da Samarco e suas proprietárias, Vale e BHP.

A reportagem procurou a Renova para comentar sobre as críticas e aguarda retorno.

Minas ficará com R$ 81 bi do acordo

O acordo firmado hoje em Brasília aumenta o valor que as empresas devem empenhar na reparação. Foram acrescentados mais R$ 132 bilhões, totalizado quase R$ 170 bilhões. Do total, R$ 100 bilhões serão administrados pelo poder público e R$ 32 bilhões pelas mineradoras. Cerca de R$ 100 bilhões serão investidos no prazo de 20 anos. O Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES) vai acompanhar o uso do dinheiro.

“Cada ministro envolvido em uma área tem que apresentar projetos. Não é o discurso que faz a obra acontecer. É a qualidade do projeto. Se a gente não der conta do recado, daqui a 20 meses, o que hoje é celebrado como a maior acordo já feito, vão começar a cobrar do governo como a pior coisa que já aconteceu”, alertou Lula à equipe da União.

O termo foi assinado pelo Advogado-geral da União, Jorge Messias; o governo de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB); Paulo Gonet, procurador-geral da república; o desembargador Ricardo Machado Rabelo; o presidente da Vale, Gustavo Pimenta; o presidente da Samarco, Rodrigo Vilela; e o presidente da BHP, Mike Henry.

A expectativa é que cerca de R$ 81 bilhões sejam aplicados em projetos em Minas Gerais e destinados à população atingida no estado. Veja a estimativa feita pelo Governo Estadual:

  • Parte dos valores irá para a duplicação da BR 356, que liga a BR-040 até o município de Mariana. Estão previstos cerca de R$ 2 bilhões para estas obras, incluindo, ainda, melhoria de pavimentação na estrada até o município de Rio Casca.
  • Os atingidos em Mariana terão prioridade no novo acordo, com a criação de um programa específico de transferência de renda só para a cidade. O benefício terá o valor de R$ 15 mil por pessoa, a ser pago a 29 mil beneficiários com renda mais baixa. Outras 5 mil pessoas com danos já comprovados receberão benefícios de no mínimo R$ 60 mil por pessoa.
  • Será também criado um novo programa de indenizações individuais para a população dos 38 municípios mineiros impactados, inclusive Mariana, dando oportunidade para aqueles que, por anos, não conseguiram ser reparados pela Fundação Renova. O valor por indivíduo será de R$ 35 mil, beneficiando mais de 200 mil pessoas em território mineiro e com valores estimados em R$ 10 bilhões para este novo sistema indenizatório.
  • Ainda nos 38 municípios atingidos pelo rompimento em Minas Gerais, a população de agricultores e pescadores com residência em até 5 quilômetros das margens do Rio Doce será incluída em um novo programa de transferência de renda. Os novos beneficiários irão receber 1,5 salário-mínimo mensal, por um período de ao menos três anos.
  • Com o Fundo Popular do Rio Doce, mais de R$ 2,5 bilhões serão destinados a projetos definidos de forma participativa pela comunidade atingida de Minas Gerais;
  • Os agricultores, moradores, proprietários rurais e ilheiros nas margens do rio terão investimentos e benefícios especiais. Um novo fundo de recuperação produtiva e resposta a enchentes no valor de R$ 1 bilhão será implementado, destinando assistência técnica agrícola, insumos e projeto de recuperação conduzido pela Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (Emater-MG);
  • Em relação ao meio ambiente, R$ 7 bilhões serão usados para universalizar o saneamento básico em todos os 200 municípios da Bacia do Rio Doce em Minas. Com esses novos aportes, cerca de 1,4 milhão de pessoas terão acesso a abastecimento de água em Minas Gerais e 4,83 milhões passarão a ter o esgoto coletado e tratado;
  • Os valores destinados ao meio ambiente, investimentos em reflorestamento, recuperação de nascentes, renaturalização de rios, revitalização da biota aquática e terrestre, entre outros, serão de cerca de R$ 8 bilhões em território mineiro, realizados pelo Poder Público. Além disso, são estimados outros R$ 9 bilhões de obrigações ambientais a serem realizadas pelas mineradoras;
  • No programa de retomada econômica, os valores devem chegar a cerca de R$ 4 bilhões na região atingida mineira para recuperação produtiva, desenvolvimento rural e ciência e tecnologia;
  • Outros R$ 11 bilhões estão previstos para aplicação em novos projetos de desenvolvimento socioeconômico a serem realizados pelo Governo de Minas, sendo 80% desse recurso destinados exclusivamente para a região atingida.

O MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens) avalia como avanço o acordo, mas apontou críticas ao projeto. A associação vê como insuficiente os R$ 170 bilhões negociados. Segundo o grupo, o valor não é suficiente para recuperação plena da Bacia do Rio Doce e indenizações individuais necessárias.

“Não é o acordo que esperávamos. O valor global está muito abaixo do que poderia ser. Além disso, o prazo de desembolso de 20 anos é excessivo, e o tema do direito individual foi tratado com valores muito aquém das necessidades reais. R$ 35 mil, por exemplo, está muito abaixo do que deveria ser para uma reparação justa,” afirma Thiago Alves, membro da coordenação nacional do MAB.

Pablo Nascimento

Mais lidas do dia

Leia mais

Acompanhe com o BHAZ