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Vítimas denunciam negligência e falta de segurança em ônibus da Buser após acidente em Monlevade

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acidente ônibus br 381
Ônibus saiu de BH com destino a Guarapari, no litoral do Espírito Santo (Corpo de Bombeiros/Divulgação)

O grave acidente de ônibus que vitimou duas pessoas e deixou 34 feridos na BR-381, em João Monlevade, nessa quarta-feira (29), segue causando transtorno às vítimas. Entre elas, dois adolescentes de 19 e 15 anos que viajariam juntos pela primeira vez para passar o Réveillon em Guarapari e tiveram os planos interrompidos pela tragédia. O irmão do rapaz denunciou as más condições da viagem no Instagram e falou sobre experiência traumática das vítimas ao BHAZ.

Na publicação, o jovem denuncia repetidos episódios de negligência por parte da Buser e da Jundiá Transportadora – responsável por fornecer o veículo – durante e após a viagem. Ele cita, entre outros problemas, a superlotação do ônibus e supostos erros do motorista. Procurada, a Buser informou que já entrou em contato com todos os passageiros e a Jundiá disse que também tem colaborado (veja abaixo).

“Foi este o ônibus no qual meu irmão e minha cunhada, de 19 e 15 anos respectivamente, pegaram para fazer a sua primeira viagem juntos. Meu padrasto, em vão, esperava por eles no seu destino”, escreveu ele, ao compartilhar uma foto do acidente.

Os dois passageiros tiveram alguns ferimentos nos braços e já estão em casa. Ao BHAZ, o irmão do jovem, que preferiu não ser identificado, conta que a adolescente conseguiu escapar por uma das janelas e ainda ajudou outras vítimas a saírem do veículo, enquanto o namorado tentava pedir por socorro.

‘Não cobraram nem identidade’

Segundo o irmão, logo no embarque, o casal estranhou a conduta da empresa, que não teria cobrado nenhuma autorização para que a menor de idade viajasse. “Logo que chegaram no ônibus, o motorista não cobrou isso deles, não cobraram nem identidade e eles embarcaram como se fosse uma carona mesmo”, conta.

Conforme relatado pelo casal, essa era a terceira viagem do motorista naquele dia. Eles contam que, após o acidente, o condutor demorou alguns minutos para assimilar o que estava acontecendo. Em nota enviada ao BHAZ nessa quarta-feira (29), Jundiá Transportadora afirmou que o motorista havia cumprido o período de descanso obrigatório entre uma viagem e outra.

Quatro vezes mais passageiros

Em um trecho do relato, o irmão cita um problema que deveria ter sido evitado desde o embarque: excesso de passageiros. “E olha que eu nem falei que o veículo, que tinha autorização para transportar 10 passageiros, levava 46. Triste, né?”, pontua o jovem.

O ônibus, assim como garantiu a Jundiá, estava com todos os documentos em dia. No entanto, conforme apurado pelo BHAZ, o veículo rodava com quatro vezes mais ocupantes do que o permitido pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) no momento do acidente.

Conforme a agência, o ônibus poderia levar apenas 10 pessoas na viagem – com acréscimo de, no máximo, mais duas em situações extraordinárias. Mesmo assim, o veículo saiu de BH com 47 pessoas – duas morreram, 34 ficaram feridas e outras 11 escaparam com ferimentos leves. Entre elas, o casal de adolescentes, além de várias outras pessoas que pretendiam aproveitar o fim de ano na praia.

Irmão de uma das vítimas postou um desabafo nas redes sociais (Reprodução/Instagram)

‘A empresa manda e o cara vai’

Outra questão que agravou a situação, segundo o irmão da vítima, diz respeito à direção. “Meu irmão contou que depois de o ônibus capotar e cair no barranco, o motorista falou que iria engatar a ré para eles saírem dali. Só que o barranco tinha uns 40 metros, ele não tinha dimensão ainda”, relata.

Ele conta ainda que o ônibus capotou cinco vezes. “O trauma de ter que escalar uma vala de 40 metros, no escuro, em meio à lama, aos cacos de vidro das janelas e aos pedidos de socorro, vai acompanhar esses jovens por muito tempo”, lamenta.

“Muita gente reclamou da estrada pra João Monlevade e, realmente, a estrada é muito perigosa. Mas não adianta ter estrada segura se a pessoa dorme no volante. Não é condenando ele, a gente sabe que trabalhador não vai negar viagem. O cara tem família pra sustentar, tem conta pra pagar. A empresa manda e o cara vai”, acrescenta.

Em depoimento, o motorista do ônibus afirmou que sofreu um “mal súbito” pouco antes do capotamento. As causas do acidente ainda estão sob investigação.

Vítima nunca tinha ido à praia

Ainda segundo o irmão, os jovens não conseguiram dormir direto depois do ocorrido. A família recebeu a notícia de madrugada. Outra irmã da vítima de 19 anos viajou às pressas para buscar o casal em João Monlevade e os encontrou na maca do hospital “sujos de lama, descalços e com os pés todos cortados”.

“Minha cunhada hoje à noite dormia e dava uns pulos na cama do nada. Ela não fala, mas tá muito assustada ainda. Ontem minha irmã ficou muito desesperada também, pedindo pra eu colocar o dedo na frente do nariz deles enquanto eles dormiam, pra ver se eles estavam respirando”, conta o rapaz.

“Uma das vitimas fatais era uma senhora de 64 anos que nunca tinha ido pra praia. Ela estava realizando esse sonho e ele foi interrompido. Poderia ser meu irmão ou minha cunhada. Queria que a empresa desse uma resposta verdadeira pra população”, lamenta ele, bastante comovido.

Família deve acionar a Justiça

A família conta ainda que entrou em contato com a Buser de diferentes formas após o acidente e que, somente hoje (30), na parte da tarde, teve retorno da empresa. Caso nenhuma medida seja tomada, a família já está se mobilizando para buscar os seus direitos por meio da Justiça.

“Me pediram o código das passagens pra dar andamento e se prontificaram a ajudar, mas só falaram. Em tese não fizeram nada ainda. Que a gente vai entrar na Justiça, a gente vai. Até conversei com um amigo advogado meu pra ele entrar com a ação. Mas vamos primeiro esperar pra ver o que a Buser vai fazer”, conta ele.

O que diz a Buser?

Procurada pelo BHAZ, a Buser informou que entrou em contato com a família “assim que foi acionada por mensagem nas redes sociais”. “A plataforma reforça que os passageiros do ônibus receberam todo o suporte necessário desde o primeiro momento e que os motoristas das empresas fretadoras parceiras são orientados em relação aos procedimentos que devem ser adotados”, disse, em nota (leia na íntegra abaixo).

Sobre o acidente, a plataforma lamentou o episódio, em nota enviada à reportagem ontem (29), e afirmou que “vem prestando todo o apoio aos envolvidos, além dos esclarecimentos necessários às autoridades policiais”.

“A Buser tem a segurança como um dos pilares de sua atividade. A empresa oferece, gratuitamente, treinamentos regulares aos motoristas parceiros. Além disso, desde o início de sua atuação, implementou o seguro grátis a todos os viajantes”, detalhou a empresa no comunicado enviado ontem.

O que diz a Jundiá?

A transportadora Jundiá também foi procurada pela reportagem a respeito da superlotação do veículo e demais condições da viagem. No posicionamento mais recente, enviado ainda ontem, a empresa argumenta que “o número de passageiros incluídos na listagem é diferente do número real por dificuldades operacionais relacionadas ao site da ANTT”.

“Isso não implica em riscos de segurança, trata-se de uma formalidade. E em nenhum momento a empresa deixou de informar às autoridades sobre a ocorrência da viagem”, diz a Jundiá, que afirma ainda que está “averiguando” a questão da listagem de passageiros.

A empresa também reforçou que a documentação estava em dia e que o motorista “é habilitado há sete anos e está com todas as licenças, exames de saúde e toxicológicos, registros e cursos em dia, assim como tinha cumprido o período de descanso obrigatório entre uma viagem e outra” (leia a nota na íntegra abaixo).

Nota da Buser na íntegra

A Buser informa que entrou em contato com L.C. assim que foi acionada por mensagem nas redes sociais. A plataforma reforça que os passageiros do ônibus receberam todo o suporte necessário desde o primeiro momento. E que os motoristas das empresas fretadoras parceiras são orientados em relação aos procedimentos que devem ser adotados antes de cada viagem.

Nota da Jundiá na íntegra

O ônibus que fazia a viagem Belo Horizonte/Guarapari e se acidentou na madrugada desta quarta-feira (29) estava com toda documentação em dia, assim como as licenças e autorizações dos motoristas escalados para a viagem.

A Jundiá Transportadora Turística é uma empresa tradicional, que preza pela qualidade de sua operação. A idade média dos veículos registrados na ANTT é de 4,67 anos. Todos os veículos, além das revisões obrigatórias dos fabricantes, são inspecionados a cada 5.000 km.

As razões do acidente ainda serão apuradas pelas autoridades, após perícias e depoimentos. Inicialmente, a informação que temos é que o motorista sofreu um mal súbito, o que também será objeto de investigação. O profissional é habilitado há sete anos e está com todas as licenças, exames de saúde e toxicológicos, registros e cursos em dia, assim como tinha cumprido o período de descanso obrigatório entre uma viagem e outra.

O segundo motorista assumiria o ônibus na cidade de Manhuaçu (MG), após um total de cerca de 280 km ou cinco horas de viagem, menos do que exige a legislação.

A licença da ANTT para esta viagem estava regular, ainda que o sistema do órgão gere divergências em relação a horários, questão que é discutida permanentemente pelo setor de fretamento com a agência. O número de passageiros incluídos na listagem é diferente do número real por dificuldades operacionais relacionadas ao site da ANTT e que ainda estamos averiguando a razão. Isso não implica em riscos de segurança, trata-se de uma formalidade. E em nenhum momento a empresa deixou de informar às autoridades sobre a ocorrência da viagem.

Reforçamos que todos os passageiros, constando ou não da licença, estão cobertos pelo seguro e estão sendo atendidos com toda solidariedade, sensibilidade e dedicação por nossa equipe.

Larissa Reis

Graduada em jornalismo pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e repórter do BHAZ desde 2021. Vencedora do 13° Prêmio Jovem Jornalista Fernando Pacheco Jordão, idealizado pelo Instituto Vladimir Herzog. Também participou de reportagem premiada pela CDL/BH em 2022.
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