Após 40 anos de amizade e morte da esposa por Covid, ex-deputado se afasta de Bolsonaro, diz jornal

Alberto Fraga
“Não aceita uma opinião contrária a dele”, disse o antigo aliado (Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

O ex-deputado federal e coronel da reserva da PM Alberto Fraga (DEM-DF) decidiu se afastar do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) após a esposa morrer pela Covid-19. Os dois cultivavam uma amizade de quatro décadas. Segundo o Estadão, o policial aposentado disse que não consegue entender a falta de sensibilidade do presidente com relação à morte das pessoas.

Mirta, esposa do ex-parlamentar, morreu aos 56 anos por complicações causadas pela doença. Viver o mesmo drama que mais de meio milhão de famílias brasileiras fez com que os “Fragas” deixasse o apoio ferrenho a Bolsonaro. “O sentimento mais comum de todos nós que passamos uma situação dessa é que gostaríamos de ter tido a vacina o mais rápido possível. E a gente sabe que a vacina foi politizada”, disse Fraga em entrevista ao Estadão.

“Muita gente na família ficou com raiva dele. Uma culpa que eu acho que ele não tem. Esses dias corrigi meu filho: ‘você não deve fazer isso, você não pode culpá-lo pela morte da sua mãe’. Ele tem 20 anos, faz medicina. Lá em casa todo mundo era ‘Bolsonaro doente’. Hoje, só o mais velho”, revelou. O coronel reformado ainda reclamou do que ele chamou de politização da vacina.

Para o PM aposentado, quando Bolsonaro percebeu que havia a necessidade da vacina, ele não quis dar o braço a torcer, pois os méritos ficariam com o governador de São Paulo João Dória. “Isso fez com que as coisas se complicassem mais”, pontuou. Ele ainda observou que a disputa política fez com que a população ficasse sem vacina. “Evidentemente muitas pessoas vieram a óbito porque não tiveram a oportunidade de se vacinar”.

‘Nunca fui amigo do presidente’

Segundo o parlamentar, ele e a esposa pegaram Covid em casa. Mirta foi a primeira a precisar de internação, seguida dele mesmo. A companheira, no entanto, teve pneumonia viral, ficou 73 dias internada e morreu depois que o pulmão não conseguiu se recuperar dos danos. Ainda de acordo com o ex-deputado, a esposa se decepcionou com Bolsonaro pela falta de interesse na vacina. “Ela se enclausurou em casa esperando a vacina, que não veio”, conta.

Fraga bloqueou Bolsonaro no WhatsApp, segundo ele, para não estragar a amizade entre os dois. “Exatamente para não estragar uma amizade de 40 anos eu preferi me afastar, bloqueei ele no WhatsApp. Em hipótese alguma eu posso culpar o presidente pela morte da minha mulher. Nunca insinuei isso, mas achei por bem me afastar, não romper. Sempre fui amigo do Jair Messias Bolsonaro. Nunca fui amigo do presidente”, alegou.

Bolsonaro não compareceu no enterro de Mirta. “Até porque se ele fosse, ia dar problema. Muita gente na família ficou com raiva dele”, complementou.

Insensibilidade

O ex-deputado conta que percebeu a falta de sensibilidade do presidente já na morte do senador Major Olímpio (PSL-SP) por complicações pela Covid. “Os filhos até se solidarizaram. Mas ele foi incapaz de dizer uma palavra. Ali ele já mostrou insensibilidade. Nessas perdas que tivemos, de entes queridos e amigos, Deus foi tão bondoso com ele [Bolsonaro] que ele não teve nenhuma perda. Os que tiveram têm uma visão diferenciada dessa questão”, disse.

Não gosta de ser contrariado

Na opinião do policial aposentado, o presidente escolheu mal os conselheiros. “Tem um general aí que está mais para puxar saco do que para ser conselheiro de governo”, disse. Para Fraga, Bolsonaro deveria se cercar de pessoas que alertam ele quando uma atitude poderá dar errado, o que não é feito por generais, já que veem presidente como o chefe supremo das Forças Armadas.

“Eu acho que ele não gosta de ser contrariado, e aí é que vem o problema. Ninguém é dono da verdade. E todo mundo sabe que esse [general Luiz Eduardo] Ramos só diz ‘não, senhor’ e ‘sim, senhor'”, disse, em referência ao atual ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, ex-ministro-chefe da Secretaria de Governo e ex-ministro-chefe da Casa Civil.

O ex-deputado acredita que mesmo depois de gastar muito dinheiro, Bolsonaro ainda não tem apoio consolidado no Congresso. Ele ainda vê a possibilidade de impeachment no caso de fragmentação na relação entre o Centrão e a presidência.

Participação dos PMs nos atos pró-governo

Fraga ainda falou sobre os atos de 7 de Setembro a favor de Bolsonaro, com participação do próprio presidente em Brasília e na Avenida Paulista. “O presidente deveria ter usado o poder de mobilização para dizer coisas boas para o País, ele perdeu uma grande oportunidade. Não gostei do discurso do presidente [no 7 de Setembro]. Exagerou na dose”, opinou.

O ex-parlamentar lembrou de pedidos “impossíveis” do presidente nas manifestações. “Pronunciou coisas que era impossível de realizar. Pedir para [Luiz] Fux [presidente do STF] tirar Alexandre de Moraes… isso não existe”, observou.

O coronel da reserva também não vê nenhuma possibilidade de insurgência dos policiais militares. “Quem está na ativa sabe os riscos que corre. Tem família. Se um cara desse for expulso, Bolsonaro não vai conseguir reintegrá-lo”, disse. Para ele, a maior questão seria os inativos, mas que mesmo assim não causariam tumultos.

“Hoje, posso te dizer que 90% das polícias e bombeiros militares votaram em Bolsonaro. O que Bolsonaro fez por eles até agora? Não foi feito absolutamente nada”. 

Edição: Vitor Fernandes

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