Quem não notou está dormindo: De 3 anos pra cá, pipocaram latinhas coloridas nos supermercados. Elas que mal cabiam nas gôndolas agora tem destaque nos panfletos de ofertas e nas prateleiras. Esse boom de marcas e sabores em todo o Brasil, e principalmente em Belo Horizonte, entrega para o cliente uma variedade tão grande que parece acertar o gosto de cada um. Então será que os drinks prontos mataram os coquetéis?
Chamo de coquetéis os drinks clássicos ou autorais, feitos na hora pelas mãos de um bartender competente (ou não). Naturalmente também podem ser chamados de drinks, mas para fins de não confundir a leitura, nesse texto eles serão chamados de coquetéis.
Pra começar a reflexão, precisamos pontuar que drinks prontos não são lá uma novidade. Cresci vendo produtos como Keep Cooler, Caipiroska, Ice, Skol Beats e, por que não, Corote. Esses drinks sempre tiveram lá o seu público, mas não caíam nas graças dos jovens, que são os grandes formadores de opinião da sociedade. Com exceção de dezenas de tentativas milionárias da Skol Beats, essas marcas não conseguiam se comunicar com os jovens. Nem com meu paladar, pra ser bem sincero.
De qualquer forma, a ideia de se ter uma experiência de bebida alcóolica leve, gostosa e prática, já vinha sendo explorada há muito tempo. A pergunta que fica então é: Por que agora?
O primeiro motivo: Os jovens estão bebendo menos. E principalmente, menos cerveja.
O segundo motivo é a forma de se comunicar. As marcas antigas de drinks não se comunicavam de maneira a criar fãs. Além disso, não existia regionalidade na comunicação. Coube às novas marcas a tarefa de educar e conquistar o mercado. Incentivados pelo sucesso da Xeque Mate, empresas locais como Equilibrista, Lambe Lambe, Off e Vanfall conseguiram enfim cair nas graças do público. Através de um marketing sem burocracia, apoio aos principais e mais queridos eventos da cidade (como, principalmente, o carnaval) e uma boa utilização de influenciadores, a comunicação respeitou nossas características regionais e o produto se tornou um sucesso.
O terceiro motivo é a variedade de opções. Além de despertar a curiosidade do consumidor, garante que todo mundo consegue achar um drink para chamar de seu. É curioso porque é o dilema do ovo e da galinha: Foi necessário o boom do mercado para que existisse a variedade de opções. Mas, uma vez que agora existe, acabou retroalimentando o próprio boom do mercado. Em outras palavras, quanto maior a variedade, maior será a variedade.
O quarto é o mais óbvio de todos: Os drinks prontos estão bem melhores! Naturalmente tem muita coisa ruim e pouco criativa por aí. Mas é inegável que alguns produtores criaram sabores singulares que é difícil achar quem não goste. E com isso o público se acostumou com o produto e passou a procurar por ele no cardápio.
Chegamos então ao universo dos bares. Que nem só de cerveja vive o homem, todo mundo já sabia. Nos últimos 10 anos os coquetéis se popularizaram e chegaram à maior parte dos cardápios. O gin virou estrela e fomos apresentados, para o bem ou para o mal, às espumas. Com isso vieram duas questões: Munidos de base de comparação, os clientes ficaram mais exigentes. E a exigência dos clientes, se transformou em necessidade de mão de obra especializada para os bares.
Manter uma bela carta de coquetéis não é tarefa simples! Há de se esmerar na compra de cada insumo, armazenagem, controle de perdas, custos e principalmente mão de obra. Depois do cozinheiro, a vaga com maior escassez no mercado da gastronomia é a do bartender. Seja para criar ou executar uma criação, o funcionário precisa conhecer bastante do ofício.
É incrivelmente mais fácil para um bar trabalhar com drinks prontos. Seja em barril ou em latas. A armazenagem é muito mais simples, a perda é menor e o serviço pode ser executado por qualquer pessoa. Na média, a margem dos drinks prontos é pior que a dos coquetéis, mas a simplicidade em todo o processo acaba fechando melhor a conta para muitos estabelecimentos. Isso tudo também não é novo, mas faltava uma peça nesse quebra cabeça: O cliente não se importar (ou até preferir) de ver no cardápio drinks prontos ao invés de coquetéis. E isso aconteceu.
Com isso tudo, ainda há espaço para eles ou os drinks prontos mataram mesmo os coquetéis?
Acredito que sim. Recentemente fiz uma visita à São Paulo para tentar captar algumas tendências do mercado. Sabemos que o que chega aqui, costuma ter chegado por lá primeiro. Fui em alguns dos bares mais bem posicionados nos rankings especializados e adivinha o que eles tem em comum? Todos se destacam pelos coquetéis.
A diferença está no que é servido, e consequentemente no que é cobrado. Ao invés de alegorias no serviço (como bebida na banheira com pato de borracha), os bares criam combinações únicas, muitas vezes com ingredientes desenvolvidos por eles mesmos. As possibilidades são infinitas e a experiência que o cliente tem é de um drink totalmente exclusivo: Não haverá outro lugar onde ele conseguirá provar um coquetel semelhante. O brilhantismo está nos ingredientes, e não no “instagramável”. Claro que essa experiência tem um preço. O valor dos coquetéis chega a R$ 60,00 nas melhores casas de SP.
Ainda estão vivos, mas de fato os drinks prontos mataram os coquetéis mais commodities. Se a experiência não for incrível, os consumidores vão preferir os drinks prontos. Primeiro por conta da garantia de qualidade: Ao invés de arriscar ter uma espuma extremamente doce boiando no copo até as últimas goladas, é preferível pedir um drink pronto que você já sabe exatamente qual será o sabor. E também por conta do preço: Enquanto os drinks prontos giram entre R$ 15 e R$ 20 nos bares de BH, os coquetéis custam normalmente acima de R$ 30.
Talvez o único coquetel que ainda se garanta – ainda bem – seja a caipirinha. Fora a super artesanal Caipi do Vô, da Tradicional Limonada, não tenho notícia de um drink pronto que seja um bom substituto ao coquetel mais brasileiro do mundo. E pelo custo e facilidade de execução serem mais simples no geral, ainda se mantém vivo nos cardápios da capital.