Em discurso na ONU, Bolsonaro defende pautas conservadoras e ataca gestões petistas

Em discurso na ONU, Bolsonaro defende o seu governo, ataca gestões petistas e aborda pautas conservadoras (Agência Brasil)

O presidente Jair Bolsonaro (PL) discursou nesta terça-feira (20) na abertura da Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), em Nova York (EUA). Em um pronunciamento de cerca de 20 minutos, Bolsonaro fez um balanço das ações de seu governo, atacou as gestões petistas e defendeu pautas conservadoras.

Por tradição, desde 1955, o presidente do Brasil é o primeiro país a discursar na abertura da Assembleia da ONU. Antes de Bolsonaro, discursaram nesta terça o secretário-geral da entidade, Antonio Guterres, e o presidente da assembleia, Csaba Korosi.

Esta é a quarta vez que Bolsonaro discursa na Assembleia Geral da ONU. Em 2020, o evento foi virtual em razão da pandemia, e o presidente enviou um vídeo gravado. 

Ataques ao PT

Em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, atrás de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Bolsonaro atacou gestões petistas e disse que o governo acabou com a “corrupção sistêmica” que, para ele, existia no país, citando as denúncias de corrupção envolvendo a Petrobras, reveladas pelas investigações da operação Lava Jato.

“No meu governo, extirpamos a corrupção sistêmica que existia no país. Somente entre o período de 2003 a 2015, onde a esquerda presidiu o Brasil, o endividamento da Petrobras por má gestão, loteamento político e em desvios chegou à casa dos US$ 170 bilhões. O responsável por isso foi condenado em três instâncias por unanimidade. Delatores deveram US$ 1 bilhão de dólares e pagamos para a Bolsa americana outro bilhão por perdas de acionistas. Este é o Brasil do passado”, afirmou Bolsonaro.

Durante as investigações da Lava Jato, o ex-presidente Lula foi condenado em primeira e em segunda instâncias. No entanto, o STF (Supremo Tribunal Federal) anulou as condenações de Lula e considerou que o então juiz Sérgio Moro atuou com parcialidade.

Pauta conservadora

A uma plateia formada majoritariamente por chefes de Estado e diplomatas, Bolsonaro repetiu o discurso em defesa da pauta conservadora, assim como faz para seus apoiadores em comícios no Brasil.

O presidente afirmou serem “valores fundamentais” para a sociedade brasileira “a defesa da família, do direito à vida desde a concepção, à legítima defesa e o repúdio à ideologia de gênero”.

“Outros valores fundamentais para a sociedade brasileira, com reflexo na pauta dos direitos humanos, são a defesa da família, do direito à vida desde a concepção, à legítima defesa e o repúdio à ideologia de gênero”, afirmou o presidente.

No Brasil, o termo “ideologia de gênero”, sem base científica, é usado por conservadores para se referir aos debates sobre identidade de gênero e sexualidade de forma crítica. O uso do termo se intensificou com a estruturação do Plano Nacional de Educação (PNE) em 2014.

Neste caso, a proposta do MEC (Ministério da Educação) era incluir temas relacionados com identidade de gênero e sexualidade nos planos de educação de todo o país.

Os críticos à proposta, que utilizavam o termo “ideologia de gênero”, acusaram o MEC de tentar promover a doutrinação das crianças, desconstruindo os tradicionais conceitos de família, principalmente aqueles que estão baseados em preceitos religiosos.

No entanto, os defensores da proposta alegavam que o projeto visava reforçar a necessidade de que fossem discutidas nas escolas as diferentes identidades de gênero existentes, ajudando a diminuir o preconceito e a promover uma sociedade com mais igualdade e respeito pelas diferenças.

Economia e combate à fome

Ao fazer o balanço das ações de seu governo, Bolsonaro disse que a economia brasileira voltou a crescer, que a inflação está “em baixa” e que a pobreza no país cai “de forma acentuada”.

Dados do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19, da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, porém, mostram que cerca de 33 milhões de brasileiros se encontram hoje em situação de insegurança alimentar.

Além disso, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o desemprego atinge cerca de 10 milhões no Brasil. E embora o país tenha registrado deflação de 0,68% em julho, a inflação acumulada nos últimos 12 meses ultrapassa 10%.

“Apesar da crise mundial, o Brasil chega ao final de 2022 com uma economia em plena recuperação. Temos emprego em alta e inflação em baixa. A economia voltou a crescer. A pobreza aumentou em todo o mundo sob o impacto da pandemia. No Brasil, ela já começou a cair de forma acentuada”, afirmou Bolsonaro na ONU.

Pandemia

Logo no começo do discurso, Bolsonaro afirmou que o governo “não poupou esforços para salvar vidas” ao longo da pandemia do coronavírus.

Bolsonaro não mencionou contudo que, de cada 100 mortes por Covid-19 no mundo, 11 são de brasileiros. A atuação de Bolsonaro na pandemia foi criticada por especialistas e autoridades em saúde, uma vez que o próprio presidente negligenciou a gravidade da doença – que chegou a chamar de “gripezinha” – e desestimulou o cumprimento de medidas sanitárias. A gestão do governo durante a crise sanitária chegou a ser alvo de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que atribuiu a Bolsonaro uma série de crimes.

Em 2021, o governo federal tentou ingressar no STF (Supremo Tribunal Federal) para impedir estados e municípios de tomarem medidas de restrição de circulação e atividades, medida comprovadamente eficaz de combate à Covid-19. Da mesma forma, o governo atrasou a chegada e a entrega de vacinas contra o novo coronavírus, ao ignorar ofertas de imunizantes da Pfizer e cancelar, em outubro de 2020, um acordo que previa a compra de 46 milhões de doses da CoronaVac.

Segundo cálculos do epidemiologista Pedro Hallal, da Ufpel (Universidade Federal de Pelotas), ao menos 95 mil vidas poderiam ter sido salvas caso as negociações por imunizantes tivessem avançado mais rapidamente. Também há indícios de ineficiência do governo federal na entrega de oxigênio para hospitais em Manaus durante os primeiros meses de 2021, quando o Ministério da Saúde decidiu priorizar a entrega e a prescrição de medicamentos sem eficácia contra a Covid-19 — e o estoque do insumo básico na capital amazonense acabou, levando pacientes à morte.

No discurso em Nova York, Bolsonaro disse também que 80% da população brasileira foi vacinada contra a Covid-19, e que isso ocorreu de “forma voluntária”, respeitando “a liberdade individual” de cada pessoa.

De acordo com o consórcio de veículos de imprensa, 79,37% da população recebeu duas doses ou a dose única de imunização contra a Covid. Entretanto, menos de 50% da população recebeu a dose de reforço, recomendada pelo Ministério da Saúde. O próprio presidente diz não ter se vacinado e, durante a pandemia, levantou dúvidas sobre os imunizantes, comprovadamente seguros e eficazes. Em um dos momentos, Bolsonaro chegou a fazer uma falsa associação entre a vacina e o desenvolvimento da Aids.

Políticas para mulheres

Com alta rejeição entre o eleitorado feminino, Bolsonaro aproveitou o pronunciamento na ONU para fazer acenos às mulheres, destacando medidas da sua gestão e a participação da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, no governo.

“Quero também destacar aqui a prioridade que temos atribuído à proteção das mulheres. Nosso esforço em sancionar mais de 70 normas legais sobre o tema desde o início de meu governo, em 2019, é prova cabal desse compromisso”, disse.

Segundo a agência de checagem “Aos Fatos”, no entanto, Bolsonaro sancionou apenas 41 leis que beneficiam as mulheres.

“Combatemos a violência contra as mulheres com todo o rigor. Isso é parte da nossa prioridade mais ampla de garantir segurança pública a todos os brasileiros”, completou.

O presidente disse ainda que o governo trabalha para o Brasil ter “mulheres fortes e independentes”, que “possam chegar aonde” quiserem.

Perseguição religiosa na Nicarágua

Bolsonaro afirmou também que o governo brasileiro “tem trabalhado para trazer o direito à liberdade de religião para o centro da agenda internacional de direitos humanos”.

“É essencial garantir que todos tenham o direito de professar e praticar livremente sua orientação religiosa, sem discriminação”, declarou.

Bolsonaro disse que o Brasil “repudia a perseguição religiosa em qualquer lugar do mundo” e está de portas abertas para acolher padres e freiras católicos que tem “sofrido cruel perseguição do regime ditatorial da Nicarágua”.

No país da América Central, o governo de Daniel Ortega fechou estações de rádio católicas e proibiu procissões religiosas.

Religiosos foram detidos e freiras da ordem fundada pela Madre Teresa de Calcutá foram expulsas do país.

Ortega acusa bispos do país de “tomar partido” e estarem comprometidos com golpistas, além de terem promovido a criação de “seitas satânicas”. O presidente da Nicarágua conta com apoio de Cuba e Venezuela.

Bolsonaro tem sugerido, em diversas ocasiões, que Lula pode seguir os passos do presidente da Nicarágua e os acontecimentos daquele país se tornaram parte da campanha para a reeleição do atual presidente.

Já no primeiro ato oficial de sua campanha, em Juiz de Fora (MG), Bolsonaro afirmou que Ortega é “aliado” do petista e vem perseguindo cristãos na Nicarágua. A afirmação vem sendo repetida desde então, fazendo com que o ex-presidente se posicionasse publicamente a favor da liberdade religiosa.

Edição: Pedro Munhoz
Pedro Munhoz[email protected]

Editor de Política do BHAZ. Graduado em Direito pela Faculdade Milton Campos e em História pela UFMG, trabalhou como articulista de política no BHAZ entre 2012 e 2013. Atuou como assessor parlamentar desde 2016, com passagens pela Câmara dos Deputados, Câmara Municipal de Belo Horizonte e Assembleia Legislativa de Minas Gerais.

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